Capitalismo do crime
Dimensão dos esquemas bilionários investigados revela a contaminação do sistema financeiro nacional por imensas redes de lavagem de dinheiro
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Quando imaginava a ramificação do crime organizado no Brasil, até dias atrás, a maior parte da população não fazia ideia do tamanho dessa rede criminosa. O resultado de investigações da Polícia Federal indica que, apenas no setor de combustíveis, a lavagem de dinheiro se apresenta como prática comum, por onde escoaram dezenas de bilhões de reais em cinco anos – período relativamente curto, sinalizando que o montante pode ser muito maior. Por outro lado, a existência das Fintechs, uma espécie de bolsões mágicos nos quais era possível depositar dinheiro de várias fontes sem a necessidade de identificação, fez com que a lavagem dos recursos oriundos de atividades criminosas fosse uma alternativa tão fácil, que era quase estimulada pelo mecanismo legal.
O capitalismo do crime se instalou no Brasil sem hesitação, aproximando o país de realidades abjetas como as encontradas no México ou na Colômbia. Apesar das dimensões continentais – ou exatamente por isso – os lucros colossais recolhidos pelo crime organizado deixaram os brasileiros boquiabertos. O que é preciso avançar, além de ir atrás dos responsáveis já anotados, diz respeito a supostos envolvidos infiltrados nas instituições, em qualquer governo, parlamento ou instância judicial, como também se viu em redes semelhantes fora do país.
Estima-se, com base na experiência de investigações na América Latina, que outros setores da economia brasileira – como cigarro e bebidas – recebem a dinheirama do tráfico de drogas e sirvam de fachada para mais de R$ 300 bilhões de faturamento para a criminalidade. O desvelamento da ponta do iceberg bilionário deve ser o início de uma cruzada institucional contra o crime no país, incluindo o uso de lupa no sistema financeiro e em toda ponta de suspeita de relações espúrias de integrantes de instituições com a rede tecida pelo tráfico e seus donos, como o PCC.
A cumplicidade de personagens corruptos e a facilidade de escoadouros legítimos – como eram as fintechs – integram as redes criminosas em todo o mundo, numa filtragem às avessas da venda de cocaína, maconha e outras drogas. Esse tipo de mecanismo não é novidade para a segurança pública nem para as instituições no Brasil. O importante, neste momento em que tanto vem à tona para o público, é desnaturalizar a vergonhosa rede da economia subterrânea na economia formal, tornando os esquemas menos fáceis, e levando efetivas punições aos participantes.
Até mesmo as estruturas portuárias podem estar sujeitas à contaminação da máfia do PCC. Uma operação da Polícia Federal é pouco para o que se vislumbra no país, se não se impedir, com rigor e justiça, que o Brasil siga como um paraíso fiscal das drogas e do crime organizado. Em qualquer atividade sobre a qual pairar uma suspeita, a vigilância institucional deve prevalecer, atuar e garantir que os criminosos não se sintam à vontade, como estavam – muitos ainda estão – até agora.