Editorial | Notícia

A gula arrecadatória

Polêmica do IOF traz de volta o debate sobre a carga tributária no país da desigualdade – que começa pela ineficiência do poder público

Por JC Publicado em 06/07/2025 às 0:00

O paradoxo da elevada carga tributária com a contrapartida insuficiente de serviços para os cidadãos pode ser evidenciado, no Brasil, pela permanência histórica da desigualdade. A mesma desigualdade utilizada para justificar o aumento dos impostos, embora a realidade mostre que o peso dos tributos só fez elevar o peso do Estado, sem aliviar a carga cotidiana da baixa qualidade de vida da maioria da população. Enquanto segue o embate político a respeito do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), agora com a mediação do Supremo Tribunal Federal (STF), vale ampliar a perspectiva embotada pelos discursos antecipados da campanha eleitoral do ano que vem, em mais um pleito para a presidência da República que tem tudo para repetir a polarização da última eleição.
Em matéria especial para o JC, Adriana Guarda aborda o tema central: por que, no Brasil, se paga tanto imposto, e se recebe tão pouco de volta, na contrapartida clássica da redistribuição de riquezas, do indivíduo para a coletividade. A arrecadação bate recordes e cresce, mas além de não haver proporcional melhoria dos serviços prestados à população, especialmente àquela parcela mais vulnerável, o setor público gasta muito e gasta mal, fazendo a arrecadação desaparecer no ralo das dívidas que crescem ainda mais rápido. E ao invés de gastar menos, por exemplo, enxugando a máquina e reduzindo a burocracia, o governo federal – e os demais níveis de governo, por imitação e escolha, na maioria dos casos – prefere dobrar a aposta sobre o que não lhe pertence: o dinheiro do povo e das empresas, submetidos a uma das mais altas cargas tributárias do mundo.
Somente em 2025, já os brasileiros transferiram para o Estado mais de R$ 2 trilhões em tributos, maior valor desde 2015, 11% acima do arrecadado no mesmo período no ano passado. Apesar disso, acuado por uma crise fiscal sem controle e com a perspectiva de ver comprometida a gestão a partir do ano que vem, o governo federal recorre à solução mágica – falaciosa – da elevação da carga tributária, para tentar compensar as perdas e a má gestão. O ralo, contudo, continua aberto, pois a estrutura da máquina se mantém, inclusive propícia a assaltos corruptos que desafiam a credibilidade nos governos e na política, e agravam a ineficiência da gestão pública.
O recurso retórico de massificação da mensagem divisionista do tipo “nós versus eles” em versão “pobres versus ricos”, abraça o oportunismo para empurrar o aumento da alíquota do IOF, sem cogitar qualquer corte de gastos e revisão de privilégios. Uma carga tributária que chegou a um terço do Produto Interno Bruto (PIB) deveria render mais e melhores benefícios para a população, e garantir níveis menores de desigualdade, revertendo a contribuição de cada um em desenvolvimento humano coletivo. Infelizmente não é o que acontece, e a sociedade desigual se vê ludibriada duplamente, quando paga muito, recebe pouco e acredita que tudo vai mudar, se pagar mais – pois todo aumento de impostos termina sendo repassado aos que menos podem arcar com a gula arrecadatória.

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