SECA | Notícia

Programa irriga ONG do PT

Governo federal nega influência política: 85% dos recursos para cisternas foram destinados a apenas uma entidade – formada por petistas

Por JC Publicado em 15/05/2025 às 0:00 | Atualizado em 15/05/2025 às 13:54

Um montante superior a R$ 640 milhões foi repassado a apenas uma Organização Não-Governamental (ONG) em dois anos. É o maior valor destinado a uma única entidade desde a criação do programa de construção de cisternas contra a seca, há mais de duas décadas. E outra parte do dinheiro foi parar nas mãos de ex-integrantes do governo do Piauí, na administração de Wellington Dias – por coincidência, atual ministro do Desenvolvimento Social, responsável pelo programa. Em resposta oficial à reportagem do jornal O Globo que apurou as informações, o ministério nega que tenha havido qualquer tipo de preferência político-partidária na distribuição dos quase R$ 756 milhões aprovados por Lula para a iniciativa.
Cansados de histórias que se repetem, os brasileiros nem querem imaginar se o critério de definição da dinheirama fosse político... se assim não é, como garante o governo petista. Certamente não teria sequer uma fatia para dividir. O que não impressiona mais, e ainda assim merece destaque e cobrança – porque afinal existem outros poderes na República para isso, fiscalizar a execução do orçamento público – é a desfaçatez com que o dinheiro do povo, em nacos de bilhões ou centenas de milhões de reais, é tratado. E a politização explícita, escancarada para qualquer órgão de controle ver, de um programa que deveria atender a uma demanda emergencial, torna risível a alegação oficial de que inexiste indício de politização.
Em nota, a entidade petista beneficiada afirma que nem a legalidade, nem a legitimidade do trabalho desenvolvido são afetadas pela presença de lideranças com histórico político ou comunitário. De fato, e não é disso que se trata o estranhamento com a generosidade do ministro Dias e do presidente Lula. O que se estranha, legitimamente, é a destinação exclusiva de um montante maciço de recursos para a construção de cisternas para uma entidade que não constrói absolutamente nada – subcontrata construtoras para fazer os serviços. Pode ser uma atividade legal. Pode ser uma destinação legítima. Mas também é claramente favorecimento político partidário. E o governo, assim como a entidade, prestariam um favor de transparência à população se admitissem o que todos enxergam.
São quase 40 entidades ligadas ao PT com expertise em gerir a construção de cisternas. Pelo visto, o partido investiu na especialização de seus integrantes. Ou não, sendo a especialidade somente a entrega de milhões para o comando de filiados. E nenhum outro partido no Brasil consegue exibir o mesmo pendor para a administração de obras contra a seca – nem da base aliada. Em diversos estados. Em Pernambuco, o Centro de Educação Comunitária Rural (Cecor) recebeu R$ 6,4 milhões, tendo como responsável, por acaso, uma ex-assessora de deputado petista. A subcontratação – do dinheiro que sai do governo para entidades do partido do governo, e daí para empresas de obras – dificulta a fiscalização. Mas não esconde o caminho tortuoso da escolha que vai da mesa do presidente da República, passa pela Esplanada dos Ministérios e chega a intermediários de políticos do PT. Um programa de irrigação monetária no qual os beneficiários, sem surpresa, são filiados ao partido governista.
E as cisternas? E a seca? Pouco importam. O que importa é a água corrente em que se transforma um orçamento.

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