Editorial JC: Tarifaço de Trump e o populismo financeiro
Estratégia da reciprocidade tarifária em narrativa nacionalista de "libertação" pode ter consequências globais – e ser um risco alto para os EUA

A expectativa é de um tsunami atingindo as bolsas de valores e as contas nacionais, desestabilizando o mundo financeiro e comprometendo o planejamento de gastos e investimentos públicos e privados.
Nesta quarta (2) é a data anunciada para entrada em vigor da nova política de reciprocidade dos Estados Unidos em relação às tarifas de diversos produtos de todos os países.
Para o discurso populista do ocupante da Casa Branca, a propaganda é a de um “dia de libertação”, na retórica nacionalista que tem caracterizado, mais uma vez, o mandato do republicano como presidente.
O uso do conceito de liberdade para se referir a uma nova era de taxações no comércio internacional, como de praxe nas falas de Donald Trump, atende à lógica de chamar a realidade por seu oposto – a exemplo dos ataques à imprensa, que ele qualifica de fake news quando a informação contraria seu interesse.
Quedas nas bolsas mundo agora
Desde a sexta-feira, as principais bolsas de valores mundiais tiveram quedas expressivas, à espera do que poderá ocorrer a partir do dia 2 de abril.
A posição geral de agentes do mercado é de apreensão sobre os efeitos da guerra tarifária no crescimento econômico, com retração e disseminação de instabilidade na economia e nos cenários políticos nacionais, bem como na geopolítica global, a partir da taxação norte-americana.
O objetivo declarado do presidente dos EUA é mesmo promover um ataque à economia mundial, já que pro mete, com entusiasmo, que mesmo os países que não tiverem em desequilíbrio tarifário com os norte-americanos serão afetados.
Ao se direcionar aos parceiros comerciais como perpetradores de assaltos ao seu país, Trump envereda pelo caminho da descortesia e da falta de traquejo diplomático, semeando a discórdia antes de buscar o consenso com os países parceiros. “Eles nos roubaram como nenhum país jamais foi roubado na história”, declarou, sem cerimônia.
De tal premissa, qual a resposta que os EUA aguardam, diante da consolidação do tarifaço cujos primeiros movimentos terão início esta semana?
Jogo de compensações sim fim
É possível que a reciprocidade alegada se torne um jogo sem fim de compensações e retaliações, prejudicando as relações entre as nações e os negócios em todo o planeta.
O que pode ter custos econômicos mais sérios do que se prevê em Washington – e também custos políticos que inviabilizem os planos prematuros e inconstitucionais de Trump atrás de um terceiro mandato, mal tendo começado o segundo.
O cálculo de ganho financeiro estima que, somente com automóveis importados, os EUA obteriam uma receita extra de 100 bilhões de dólares por ano.
Cabe indagar a reação dos países taxados, e quanto isso poderia custar à população norte-americana. Além disso, no caso dos automóveis produzidos pela China, por exemplo, o mercado é muito maior do que as fronteiras do maior país da América do Norte.
Ao deflagrar uma guerra comercial por tarifas, o governo dos EUA sob Donald Trump talvez não imagine a consequência de outra libertação - a diversificação da economia global para além dos Estados Unidos.