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O mapa do atalho

A frustração da comunidade internacional com a COP 30 é o resultado de uma expectativa exagerada que foi criada...................

Por SÉRGIO C. BUARQUE Publicado em 26/11/2025 às 0:00 | Atualizado em 26/11/2025 às 11:45

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A Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP 30) deixou ambientalistas e especialistas frustrados porque o relatório final não incluiu um roteiro para acabar com a dependência da economia mundial dos combustíveis fósseis, faltou consenso para aprovar o chamado mapa do caminho. Houve avanços modestos e, em grande parte, voltados para a proteção diante dos impactos das mudanças climáticas, sem passos decisivos para a redução das emissões de gases de efeito estufa responsáveis pela elevação da temperatura média do planeta. O governo comemorou a criação do fundo das florestas tropicais (Tropical Forests Forever Fund) que visa compensar financeiramente países que mantenham florestas tropicais em pé como pagamento pelos serviços ambientais que oferecem ao clima mundial. Além deste fundo, a COP 30 conseguiu aumentar um pouco os recursos - nada próximo dos 1,3 trilhões de dólares desejados - para financiar projetos de adaptação aos impactos das mudanças climáticas em países em desenvolvimento e mais vulneráveis. Que, como é sabido, têm uma participação muito pequena no total de gases jogados na atmosfera. Nada concreto foi, contudo, aprovado na cúpula para afastar o planeta da civilização do combustível fóssil. Quase como se o mundo estivesse disposto a aceitar o rompimento do limite de 1,5º de elevação da temperatura acima da era industrial e se dedicasse agora a moderar os impactos do desastre climático. Conformada com a perda da guerra, restaria à humanidade se proteger das suas consequências.

A frustração da comunidade internacional com a COP 30 é o resultado de uma expectativa exagerada que foi criada em torno da construção de um consenso dos 195 países que participaram das negociações no evento, a aprovação do chamado mapa do caminho. A análise destes resultados permite tirar duas conclusões para o futuro: 1. os interesses dos países produtores de petróleo tornam inviável a construção de um consenso em relação às medidas que levem a uma intensa transição energética capaz de reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito estufa; 2. não é absolutamente necessário alcançar consenso mundial em torno da redução das emissões que, em última instância, depende da decisão dos países que utilizam combustível fóssil como fonte básica de energia na substituição por outras fontes. Em outras palavras, do compromisso dos grandes consumidores de energias fósseis, independente dos interesses e posições dos produtores.

Por isto, parece uma grande ingenuidade pretender um acordo entre os produtores e os consumidores, esperando que países que vivem da produção e exportação de petróleo, como a Arábia Saudita, apoiem uma estratégia arrojada para a eliminação dos combustíveis fósseis. As Nações Unidas deveriam esquecer os produtores de petróleo e concentrar os esforços políticos e diplomáticos para convencer os grandes consumidores de petróleo a assumirem metas significativas de diminuição das suas emissões (sem esquecer que alguns grandes consumidores são também produtores de petróleo). E a atenção especial deve ser dada a um pequeno grupo de países que, de fato, fazem a diferença, os dez maiores emissores de gases de efeito estufa, principalmente os quatro que são responsáveis por mais 47,7% do total das emissões: China, Estados Unidos, Índia e Rússia (dados do Climate Watch).

Na ausência de um consenso, de resto impossível, o Brasil, que preside a COP 30, decidiu avançar nas negociações para a definição de metas de redução das emissões e, principalmente de transição energética. Já que não conseguiram construir um consenso em torno do tal mapa do caminho, negociam "mapas do caminho em separado", uma espécie de atalho em base a negociações diretas com os 80 países que estavam dispostos a aprovar o caminho. Ocorre que China, Índia e Rússia, maiores emissores de gases de efeito estufa junto com os Estados Unidos, não estão entre os 80 países que aprovavam o plano, na verdade, se mobilizaram contra o mapa do caminho. Diante da posição destes grandes emissores contra o plano que levaria ao fim da civilização do combustível fóssil, o atalho desenhado pela presidência da COP 30 não terá sucesso relevante na redução das emissões globais. No final das contas, se estes países não se comprometeram com metas ousadas de redução das suas emissões, todo o esforço realizado pelo resto do mundo será insuficiente para deter a elevação da temperatura média do planeta. E o mundo vai continuar marchando a passos largos para um provável desastre ambiental.

Sérgio C. Buarque, economista

 

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