Conversas de 1/2 minuto (42) Cantadores (I de II)
Mais conversas, nas vésperas do São João, hoje só com cantadores e afins, em livro que estou escrevendo (título da coluna).........

Parte, apenas, o restante ficou para a próxima semana, vésperas de São Pedro.
CÂMARA CASCUDO, escritor. É dele essa bela definição, "o melhor do Brasil é o brasileiro" (dita em conversa com Diógenes da Cunha Lima, que a registrou em Um brasileiro feliz). No terraço de sua casa na Rua Junqueira Aires (bairro da Ribeira, Natal), próxima da Praça das Mães, dois cantadores esperavam para se apresentar. Foi quando um deles viu besouro cascudo pousar nos ombros do mestre e pegou na viola
- Estou vendo dois cascudos
Um do outro é diferente
Um não tem raciocínio
O outro é inteligente
No mato cascudo é bicho
Na praça Cascudo é gente
GERALDO AMÂNCIO PEREIRA, cantador (de Cedro, Ceará). Numa cantoria disse
A viola que desafina agora
É com ela que luto com os poetas
Com viola eu sustento duas netas
Meus três filhos, meu genro e minha nora.
A mulher que me ama e me adora
Se alimenta também de cantoria
O meu pai, minha mãe, e minha tia
Tudo isso a viola é quem sustenta
Que viola é a minha ferramenta
E repente é o meu pão de cada dia
* * *
No Restaurante as Velhas (Lisboa), o professor António de Abreu Freire (de Aveiro) queria enviar mensagem para ele. Filmei no celular e mandamos. Resposta
Nosso poliglota Freire
Muitos favores me fez
Nessas questões de idiomas
Fala em oito, escreve em seis
E eu semi-analfabeto
Mal arranho o português.
Dá boca pra fora. Que é membro da Academia Cearense de Letras, a mais antiga do Brasil (criada em 15/08/1894). Antes mesmo da Brasileira (20/07/1887); e terceira, só para lembrar, é a de Pernambuco (26/01/1901).
* * *
Numa conversa, o chamei de gênio. E ele respondeu
Tem G em Geraldo e gênio
Tudo começa com G
Escolho o G de Geraldo
G de gênio é prá você.
IVANILDO VILANOVA, cantador (de Caruaru, Pernambuco). Com muita honra, para mim, sou padrinho de uma de suas duas filhas, Indira Essênia. Decidiram gravar um disco, Violas de ouro, ele e Geraldo Amâncio Pereira. Duas lendas, na cantoria. E pediram que escrevesse a contra-capa, uma honra. Como estavam brigados por muitos anos, dei os parabéns
Ainda bem que fizeram as pazes.
E Ivanildo
É que já estava na hora, doutor, de desatar o nó dessa desunião.
* * *
É dele essa Cantiga de Conselho
Você pode no muque arrebentar
Seja a porta da frente, ou da dispensa
Mas apenas pedindo com licença
Ela pode se abrir, você passar.
Me perdoe diga sempre quando errar
Não é feio ninguém ser educado
Nem humilde, gentil ou delicado
O contrário é que é constrangedor
Por favor diga sempre por favor
E obrigado por dar muito obrigado
JOÃO FURIBA (João Batista Bernardo), cantador (de Taquaritinga do Norte, Pernambuco). Cantando com Lourival Batista, Furiba começou
Meu colega Lourival
Acho que já vou embora
Já é quase meia noite
Breve vai dar zero hora
E eu não quero dar maçada
Na mulher que me adora.
Louro foi em cima
Furiba não vai agora
Com essa garota sua
Pois lá fora tem malandro
Que mexe até com a lua
Carrega ela e lhe deixa
Vagando só pela rua.
Para ver, desalentado, Furiba completar
Mais perigoso é a sua
Ficar em casa sozinha
Você entra pela sala
Outro sai pela cozinha
Eu pra não correr perigo
Pra onde vou levo a minha.
JOÃO PARAIBANO, cantador (do Sítio Pinica-Pau em Princesa Isabel, Paraíba). Fazia cantoria com Rogério Menezes (de Imaculada, Paraíba, embora tenha desde menino vivido em Caruaru) quando um cidadão botou dinheiro na bandeja e pediu que falassem mal das esposas, um do outro. Com as próprias presentes! João não se fez de rogado e acabou sextilha dizendo
Não sei como tu aguentas
Uma mulher braba e feia.
Rogério respondeu
A minha mulher é feia
Porém digna e singela
Sua mulher é bonita
Entre todas a mais bela
Por isso que muitos ursos
Estão pulando a janela.
E João
A minha mulher é bela
Estando vestida ou nua
Mais parece uma sereia
Quando desfila na rua
Melhor ser corno da minha
Do que marido da tua.
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