Adriano Oliveira: A inocência da centro-direita
Se a centro-direita já estiver com a narrativa posta, nem Lula e nem Bolsonaro, o seu candidato poderá ser competitivo

A cada pesquisa parece que o mundo mudou há 100 anos. Mas, se você verificar bem, com atenção, nada mudou. Não é de hoje que aconselho os apaixonados por política, os analistas de pesquisas e os estrategistas, que a intenção de voto, tão amada pelos políticos, não prediz o futuro, apesar de tumultuar o presente. Faz um bom tempo que alerto que a conjuntura de 2026 poderá ser diferente da de 2022 se os atores assim desejarem.
Pesquisas qualitativas da Cenário Inteligência têm mostrado desde o ano passado que a configuração emocional de parte do eleitorado é de rejeição ao presidente Lula e o ex-presidente Jair Bolsonaro. Pesquisa Quaest divulgada (06/06/2025) revela que 45% têm medo da volta do ex-presidente Jair Bolsonaro e 40% do presidente Lula continuar.
Numa disputa entre o presidente Lula e um candidato bolsonarizado, o líder do PT é favorito para vencer a eleição em razão da alta rejeição do bolsonarismo.
Pesquisa da Quaest (05/06/2025) revela que 66% dos eleitores não querem que o presidente Lula seja candidato à reeleição e 65% não desejam que o ex-presidente Bolsonaro seja candidato novamente. Estes dados corroboram com as pesquisas qualitativas da Cenário Inteligência que revelam que os dois principais líderes populares são fortemente rejeitados.
Se os grandes líderes despertam emoções negativas e polarizam o ambiente eleitoral, vislumbro, ao contrário de 2022, que a conjuntura eleitoral de 2026, a depender das ações dos atores, pode ser marcada pelo pós-Lula e pós-Bolsonaro. Deste modo, existe espaço para um competidor da terceira via, caso este vem a se apresentar como um candidato além de Bolsonaro e Lula.
Mas a simples presença de Lula e de um candidato bolsonarizado, já não polariza obrigatoriamente a eleição? Não. Se o candidato da centro-direita optar por se afastar de Bolsonaro sem falar mal dele, o resultado pode ser outro, isto é: o candidato nem Lula e nem Bolsonaro crescer nas pesquisas. O problema é que grandes partidos e lideranças da centro-direita insistem no bolsonarismo e estão à espera da benção de Jair Bolsonaro.
Por que o ex-presidente Bolsonaro escolheria Tarcísio de Freitas? Não existe razão. Pois o governador de São Paulo na presidência da República não será garantia do retorno do bolsonarismo ao poder através da anistia ou da desistência de concorrer à reeleição em 2030. Michele Bolsonaro ou um dos filhos de Bolsonaro, aparentemente, são garantias para o ex-presidente.
Enquanto a centro-direita espera por Bolsonaro, o qual esticará a corda até o prazo eleitoral limite de 2026, o presidente Lula poderá recuperar popularidade, não necessariamente de maneira intensa, e arregimentar grandes partidos do centro, como o MDB e PSD. Ressalto que o escândalo do INSS ameaça a reeleição do Lula já que associa o lulismo à corrupção.
Se a centro-direita tivesse sabedoria, se afastaria do lulismo e do bolsonarismo, e tentaria, o quanto antes, narrar para a opinião pública que o Brasil merece futuro sem Lula e Bolsonaro. Mas ela insiste em não trazer esta narrativa estratégica por acreditar, equivocadamente, que sem o bolsonarismo, ela não tem vida. A polarização política, desconsiderem o ambiente eleitoral, é por consequência da escolha dos atores.
Lembro ainda que o aparente cisne negro poderá surgir: Lula desiste de disputar a reeleição. Se isto acontecer, e a centro-direita ainda estiver à espera de Bolsonaro, Michele Bolsonaro ou um dos seus filhos, terá todas as condições de vencer a eleição de 2026.
Por outro lado, se a centro-direita já estiver com a narrativa posta, nem Lula e nem Bolsonaro, o seu candidato poderá ser competitivo. Reafirmo: com Lula ou sem Lula, o lulismo estará no segundo turno. Quanto ao bolsonarismo, isto vai depender, em parte, da escolha dos atores da centro-direita.
Por Adriano Oliveira – Cientista político. Professor da UFPE. Fundador da Cenário Inteligência.