Os poetas repentistas do Teixeira
Os irmãos Batista de Itapetim, a partir de meados do século 20, surgiram para o mundo como os três maiores cantadores de viola de todos os tempos

Foi na cidade do Teixeira, no alto sertão da Paraíba, encravada em plena Serra da Borborema, a cerca de 350 km de Recife, segundo os grandes historiadores de ontem e de hoje que cultivam a cantoria de viola e o improviso do repente, entre eles Orlando Tejo, que veio ao mundo o primeiro poeta repentista de todos os tempos: Agostinho Nunes da Costa, filho de João Nunes da Costa, de origem judia, que chegou ao Brasil, vindo de Portugal, em meados do século 18, fugindo da perseguição católica executada pelo Tribunal do Santo Ofício. Agostinho se instalou em Teixeira, e aos 18 anos de idade deu os primeiros passos como poeta repentista, cantando versos improvisados pelas feiras do lugar, acompanhado de uma rebeca, um instrumento musical que ainda hoje existe em alguns recantos do sertão. Agostinho, de logo, alcançou a notoriedade e um enorme sucesso na região, principalmente pela sua inspiração poética, inovadora e atraente, na época um modelo de poesia por quase todos desconhecidos. Seus filhos, Ugolino Nunes da Costa, Nicodemos e Nicandro seguiram o caminho do pioneiro cantador.
No final do século 18, outros notáveis poetas improvisadores apareceram no sertão da Paraíba, com destaque para Romano de Mãe D'agua e Germano da Lagoa, que passaram a jorrar os seus versos, agora com o acompanhamento de violas por eles confeccionadas, quase sempre desafinadas, mas com ritmos frenéticos e compassados. Já no século 19, com a ascensão dos versos escritos, os folhetos de cordel impulsionaram a poesia popular, quando os cantadores de viola e os folhetistas se espalharam por todos os recantos do sertão da Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte, hoje uma relíquia nacional. É pena que de todo o esplendor, da inovação, da envergadura e da pujança despertadas por Agostinho, Ugolino, Nicandro e Nicodemos, muito pouco ficou dos farrábios da época, afora a importância da criação humana, da arte e do seu lado histórico que despertaram tanta curiosidade para os que viveram naqueles tempos.
A família Nunes não parou naqueles seus primeiros cantadores populares que criaram a cantoria, até porque, já no século 20, surge Teodoro Nunes da Costa, outro filho de Teixeira, um poeta que deixou a sua marca na história poética do Nordeste e do Brasil, ainda hoje lido com entusiasmo pelos abnegados pela poesia popular e erudita, desde quando enveredou pelos caminhos dos seus memoráveis sonetos, decassílabos, quadras e sextilhas, levando suas rimas imortais para o resto do mundo.
Em 1946, no Teatro Santa Isabel, em Recife, no mesmo palco onde antes já haviam declamados versos imortais e improvisados os estudantes de Direito Castro Alves, Olavo Bilac e Tobias Barreto, o teatrólogo paraibano Ariano Suassuna e o poeta Rogaciano Leite, de Itapetim, organizaram um Congresso de Cantadores de Viola, com a participação de notáveis repentistas nordestinos, proporcionando um dos maiores espetáculos poéticos que o Nordeste já assistiu. Dimas Batista foi o grande vencedor do festival, dentre todos os concorrentes. Aplaudido de pé pelos aficionados da viola, Dimas encantou a plateia que o reverenciou de pé, num dos momentos mais sublimes e marcantes de todos os tempos.
Descoberto por Orlando Tejo, Zé Limeira, o poeta do absurdo, outro Teixeirense nascido no sítio Tauá, desabrochou para o mundo com os seus versos malamanhados, mas ricos de rimas perfeitas e de métrica inconfundível, cujas características poéticas e folclóricas ainda hoje são estudadas nos centros de estudos e de pesquisas do resto do mundo.
Os irmãos Batista de Itapetim (Lourival, Dimas e Otacílio), a partir de meados do século 20, surgiram para o mundo como os três maiores cantadores de viola de todos os tempos, ao lado de Antonio Marinho, Pinto do Monteiro, Canhotinho, Manoel Chudú, Job Patriota e de tantos outros que se destacaram na região do Pajeú, em Pernambuco, e que ainda hoje são lembrados pelo poder e pela beleza dos seus versos.
Ugolino, Teodoro e Zé limeira, certamente mereceram os versos que fiz:
Eu nasci e me criei
Na terra dos cantadores
Onde os grandes trovadores
Na meninice escutei
No Riacho Verde sonhei
Brechando a luz da ribeira
Foi na serra do Teixeira
Que me senti peregrino
Sou da terra de Ugolino
De Teodoro e Zé Limeira
Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, doutor e mestre em Direito de Execução Penal, professor da pós-graduação em Ciências Criminais do Instituto dos Magistrados do Nordeste (IMN), membro efetivo do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP), autor de livros jurídicos.