Prisão domiciliar: uma das maiores criações de todos os tempos
Com o surgimento da prisão domiciliar, restou comprovada uma redução significativa na nossa população carcerária e nos custos financeiros....

O instituto da prisão em domicílio pode ser autorizado pelo juiz ou tribunal, tanto em relação aos considerados inocentes (provisórios), como, também, aqueles já condenados à pena privativa de liberdade, por sentença judicial transitada em julgado (quando não cabe mais recursos).
Quem primeiro disciplinou a transferência do condenado em privação da liberdade, no Brasil, para o regime domiciliar, ainda hoje em vigor, foi a Lei Federal nº 7.210/1984, a Lei de Execução Penal (art. 117), nos casos em que o apenado esteja cumprindo a sanção penal em regime aberto; seja ele maior de 70 (setenta) anos de idade; àqueles acometidos de doença grave ou pessoas do sexo feminino gestantes, que tenham filhos menores ou comprovadamente deficientes físicos ou mentais. Com o tempo, a jurisprudência firme dos nossos tribunais estendeu a transferência para os quem estejam cumprindo a pena em regime semiaberto ou fechado, situação que ainda hoje predomina nas Varas de Execução Penal e nos nossos tribunais, de forma pacífica.
No que tange aos presos provisórios, a prisão domiciliar passou a vigorar com a aprovação das Lei Federal nº 12.403, de 04.05.2011, quando o legislador veio a autorizar a substituição da prisão cautelar (preventiva) para o regime residencial, quando: a) o condenado for maior de 80 (oitenta) anos de idade; seja ele o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; quando estiver extremamente debilitado por motivo de doença grave; seja o acusado imprescindível aos cuidados especiais de menor de 6 (seis) anos ou com deficiência; esteja a mulher em fase de gestação ou tenha filhos menores de 12 (doze) anos incompletos. Em relação às mulheres gestantes, o regime domiciliar não poderá ser concedido quando ela seja acusada da prática de crimes com o uso de violência ou grave ameaça a pessoa, nem aqueles contra seu próprio filho ou dependente.
Com a vigência da Lei nº 12.403/2011 (art. 119, Código de Processo Penal), restou autorizado ao magistrado a aplicação de medidas substitutivas da prisão preventiva, com o recolhimento domiciliar dos acusados(as), durante o período noturno ou nos dias de folga, comprovada a residência e o exercício do trabalho fixos. Quando o magistrado transfere o condenado ou o acusado para o regime domiciliar, o faz estabelecendo determinadas condições que devem ser rigorosamente cumpridas, sob pena da sua revogação e o correspondente retorno à prisão. É comum a fixação do monitoramento eletrônico, pelo juiz ou tribunal, com a finalidade de fiscalizar a movimentação física do beneficiário, evitando a sua saída da residência, sem ordem judicial.
Com a edição da Súmula Vinculante nº 56, o Supremo Tribunal Federal, praticamente a Corte obrigou que o preso condenado cumpra a pena em prisão domiciliar, quando não houver vagas no sistema penitenciário, outra triste realidade brasileira. Lado outro, como não existem vagas no regime semiaberto e nem as casas de albergados jamais foram construídas para o regime aberto, os juízes de Execução Penal, em sua grande maioria, têm autorizado o cumprimento da pena em regime domiciliar, evitando, assim, o recolhimento de presos em estabelecimentos prisionais, que tanto estimulam a reincidência criminal e afetam a paz social.
Com mais de 950 mil presos detidos em estabelecimentos prisionais administrados pela União e pelos Estados, além dos muitos que estão recolhidos em delegacias de polícia, o Brasil ostenta a posição de terceiro país do mundo em população carcerária, ambientes carcerários que costumam violar a dignidade do preso, unidades prisionais que comumente comprometem a sua integridade física e mental, sem contar que praticamente todos os seus direitos consagrados na Constituição e nas Leis são vilipendiados corriqueiramente.
Bem por isso, com o surgimento da prisão domiciliar, restou comprovada uma redução significativa na nossa população carcerária e nos custos financeiros para o Estado, sem prejuízo da contribuição visível para a recuperação do acusado/condenado, uma das finalidades da pena e da sua execução. Em convivência e com o apoio familiar, o infrator da lei penal, com a custódia domiciliar, tem alcançado extremos contributos, também, para a humanização da pena e para a diminuição da criminalidade. Pode-se afirmar, pelo exposto, que a prisão domiciliar foi e é uma das maiores conquistas adotadas pelo legislador brasileiro e uma forte aliada da dignidade humana.
Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, mestre e doutor em Direito, professor da pós-graduação do Instituto dos Magistrados do Nordeste (IMN), coordenador do Núcleo Literário, Arte e Movimentos Culturais da Editora da OAB/PE, membro do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP)