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Deus não é revelação

O apóstolo Paulo em Rm 1-20, reforça que os atributos invisíveis de Deus são revelados por meio da criação e não nasce da fantasia

Por JC Publicado em 28/09/2025 às 0:00

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Pastor Esdras Cabral de Melo


Nas páginas da história das ideias, não faltaram vozes que tentaram reduzir Deus a uma criação da mente humana, um mero reflexo das carências psicológicas ou sociais do homem. Ludwig Feuerbach (1804–1872) declarou que “Deus nada mais é do que a projeção da essência humana”; Sigmund Freud (1856–1939), por sua vez, descreveu a fé como “ilusão”, produto de desejos reprimidos; já Richard Dawkins, em tempos mais recentes, popularizou a tese de que Deus seria um “delírio coletivo”. Essas afirmações ecoam com força nos corredores acadêmicos, mas esquecem um ponto central: o Deus das Escrituras não é invenção, mas revelação.


A Bíblia, fundamento da fé cristã, é categórica: “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia a obra das suas mãos” (Salmo 19.1). O apóstolo Paulo, em Romanos 1.20, reforça que os atributos invisíveis de Deus — Seu eterno poder e divindade — são claramente vistos por meio da criação, de modo que o ser humano é indesculpável. Ou seja, a revelação divina não nasce da fantasia, mas se impõe à razão pela ordem e beleza do cosmos.


No entanto, a revelação de Deus não se limita à criação. Ela se manifesta de modo pleno e definitivo em Jesus Cristo. O autor da carta aos Hebreus declara: “Havendo Deus outrora falado... a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho... o qual, sendo o resplendor da sua glória e a expressa imagem da sua pessoa” (Hebreus 1.1–3). Cristo é a revelação exata de Deus, não um mito cultural, mas a encarnação histórica e redentora do Verbo eterno (João 1.14).


Grandes teólogos reafirmaram esta convicção. Karl Barth, no século XX, insistiu que só podemos conhecer a Deus porque Ele mesmo se revelou em Cristo. Emil Brunner destacou que a revelação não é apenas proposicional, mas pessoal — Deus se comunica em relacionamento. Já C. S. Lewis, outrora ateu, afirmou com vigor que os anseios humanos por transcendência não provam a ilusão da fé, mas a existência de uma realidade que corresponde a tais anseios.


A crítica de Feuerbach, Freud e outros parte de um reducionismo. Ao psicologizar ou sociologizar Deus, ignoram a alteridade divina: o fato de que Ele não depende da mente humana para existir. A projeção, por definição, depende de quem projeta; mas o Deus revelado é aquele que chama Abraão, liberta Israel, fala pelos profetas e se faz carne em Belém. Não é o homem que cria Deus; é Deus quem cria, sustenta e salva o homem.


Portanto, diante de tantas vozes que tentam transformar Deus em ideia, mito ou delírio, cabe reafirmar com clareza: a fé cristã não é produto de projeções humanas, mas resposta ao Deus vivo que se revela. Negar essa revelação é reduzir a história, a experiência e a própria Palavra a meros reflexos de uma mente enganada. Aceitá-la, porém, é reconhecer que o Eterno entrou no tempo, que a Palavra se fez carne, e que, em Cristo, Deus não apenas se mostrou, mas se deu a nós.
Essa não é a narrativa de uma projeção, mas a certeza de uma revelação.


Esdras Cabral de Melo é pastor da Convenção em Abreu e Lima PE, é teólogo e Doutor em Educação e Psicanálise. Mestre em Teologia. Pós-Graduado em Ciências da Religião. Antropologia UFPE. Metodologia do Ensino Superior, Ciências da Religião, História das Artes e das Religiões e Ensino de História pela UFRPE, além de escritor. Membro da Academia Pernambucana

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