
Muito se fala em como as sonoridades da América, em seu leque de países e expressões, consegue encontrar diversas sintonias e conexões que ultrapassam as barreiras geográficas. Às vezes trata-se do compartilhamento de uma raiz comum ou até do nascimento em um contexto histórico semelhante. Quando são misturadas nasce algo que parece ser tão novo, ao mesmo tempo tão conhecido.
É o que vem fazendo o grupo Ladama, formado por uma brasileira, uma colombiana, uma venezuelana e uma estadunidense, lançando seu segundo disco nesta sexta-feira, batizado de Oye Mujer, dando seguimento ao caminhar de um projeto propondo música e engajamento.
A história do Ladama começou em 2014, durante uma residência artística chamada One Beat, promovida pelo Governo dos Estados Unidos e voltada para a música enquanto ferramenta de transformação social. Por lá, a musicista pernambucana Lara Klaus conheceu Mafer Bandola, da Venezuela, e a colombiana Daniela Serna, assim como também conheceu as bagagens artística e de vivências das amigas sul-americanas, começando a brotar o que seria o Ladama. Pouco depois, entrou a nova-iorquina Sara Lucas. Em 2015 o projeto começou a trilhar um caminho de shows, workshops e palestras ao redor do mundo, vindo ainda com um primeiro disco em 2017.
A estreia do Ladama foi no palco do festival Rec-Beat no Carnaval de 2015, acompanhada de uma residência e workshops em espaços como o Paço do Frevo e o Alto do Pascoal. O grupo começou a circular pelos países das outras integrantes realizando as mesmas iniciativas. "Sempre fomos muito envolvidas com educação e sabíamos que não seríamos só uma banda que ia tocar por aí, mas queríamos ter um trabalho social. A Mafer desde sempre falava sobre como queria ir para a Venezuela e dar oficinas para as meninas do bairro dela mostrando outras alternativas do que é ser mulher", relata Lara.
Ela conta que os workshops não eram sobre ensinar os instrumentos, mas em fazê-las reconhecer o que podem fazer de novo a partir deles. Seguiram assim pela Venezuela, Colômbia e Estados Unidos.
Foi por lá que começaram a trabalhar no primeiro EP, que logo se transformaria no primeiro disco, após entrarem em contato com o pessoal que formaria a equipe por trás do grupo, incluindo o contrato com o selo Six Degrees Records, que já abraçou nomes de vários países, incluindo brasileiros como Lenine, Bebel Gilberto e Céu. Pouco menos de três anos separam o álbum de estreia homônimo do Oye Mujer.
Se o primeiro é muito pautado pela experiência de trocas entre as diferente bagagens sonoras e culturais das integrantes do Ladama, o novo trabalho já apresenta uma maturidade em relação ao conhecimento mútuo e um terreno mais fértil para experimentarem juntas.
"O primeiro disco foi muito baseado nessas semelhanças rítmicas da gente. Eu mostrava um maracatu, aí Dani me mostrava uma percussão muito parecida lá do Pacífico colombiano, então foi muito marcado por uma curiosidade. São músicas que remetem muito a esse encontro. Já em Oye Mujer é mais o testemunho do que vimos até aqui, as culturas que conhecemos com as turnês, uma ampliação das nossas influências sonoras e da nossa própria visão política de mundo", explica Klaus.
Há uma continuidade da intensa cozinha percussiva e do encontro das cordas da guitarra elétrica com a bandola llanera, instrumento típico da Venezuela, dando vazão a reggaes, samba-reggaes, merengues, cumbias, rocks e outras sonoridades, latinas ou não.
Para fazer o intermédio das experimentações que queriam com a identidade musical que já tinham, elas convidaram Alexandre Kassin para a produção, que traz no currículo parcerias com nomes como Jorge Ben Jor, Los Hermanos, Bebel Gilberto, Jorge Mautner e Caetano Veloso. Klaus acredita que as conexões entre o grupo já estão muito orgânicas, com o produtor auxiliando na inserção das novas ideias que cada uma trazia.

A partir desses novos encontros para o segundo disco, nasceram também gritos de liberdades e olhares para os problemas do mundo que parecem estar tão próximos, se conectando além das fronteiras nacionais.
Desastres ambientais, como o rompimento da barragem de Brumadinho, ou a tragédia de uma mãe na Venezuela em meio aos blecautes, acabam marcando a atmosfera de canções e pontuam os tons engajados do discurso. "Acabou que o disco vem carregar muito a ideia da empatia, algo que acabou ainda em uma outra dimensão no contexto em que estamos vivendo. Falamos no disco que cada um de nós somos a expressão de um todo e, a partir disso, se colocar nesse lugar do outro a partir da música", conclui Lara.

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