Cerca de 23% das brasileiras sentem dor durante a relação sexual
Desconforto pode ter causas físicas, emocionais ou sociais e impacta autoestima, relacionamentos e saúde mental das mulheres

Sentir dor durante o sexo ainda é uma realidade para muitas mulheres, mas continua sendo um tema cercado de silêncio e desinformação. A dor genitopélvica à penetração, que pode surgir durante relações sexuais, exames ginecológicos ou até ao usar absorventes internos, afeta entre 8% e 21% das mulheres no mundo — o que representa cerca de 23% das brasileiras.
“A dor genitopélvica à penetração é uma queixa comum entre mulheres, mas ainda cercada de silêncio, estigma e desinformação. Essa condição pode afetar profundamente a qualidade de vida, a autoestima e os relacionamentos afetivo-sexuais delas”, explica a ginecologista Jussimara Souza Steglich, da Comissão Nacional Especializada em Sexologia da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Tipos mais comuns de dor à penetração
A dor pode aparecer em qualquer idade e se manifesta de formas diferentes. Os principais tipos são:
- Dispareunia: dor genital associada especificamente à penetração, podendo ser superficial (na entrada da vagina) ou profunda (durante a penetração total ou em determinadas posições);
- Vaginismo: contração involuntária dos músculos do assoalho pélvico, que dificulta ou impossibilita a penetração;
- Vulvodínia: dor crônica na região da vulva, sem causa identificável, frequentemente associada à hipersensibilidade ao toque ou pressão.
“A dor pode ter causas físicas como infecções, atrofia vaginal, endometriose, cicatrizes pós-parto ou alterações hormonais e/ou causas psicossociais, como ansiedade, histórico de abuso sexual, educação sexual repressora ou experiências sexuais negativas. Muitas vezes, é uma condição multifatorial e exige avaliação cuidadosa”, afirma a ginecologista.
Impacto vai além do físico
Segundo a médica, o problema também afeta a vida emocional, sexual e social das pacientes. “O sofrimento não é apenas físico: muitas mulheres relatam sentir-se ‘quebradas’ ou ‘inadequadas’, o que pode comprometer gravemente sua saúde mental”, alerta Jussimara.
Ela destaca que os impactos atingem os relacionamentos, o desejo sexual, o prazer e a autopercepção. Entre os efeitos emocionais mais comuns estão conflitos conjugais, vergonha, afastamento da intimidade, ansiedade, depressão e queda da autoestima.
Como é feito o tratamento?
A ginecologista ressalta que o tratamento deve ser individualizado, respeitando a vivência e o ritmo de cada mulher. A abordagem pode incluir:
- Psicoeducação e aconselhamento sexual: para desfazer mitos e melhorar o autoconhecimento;
- Fisioterapia do assoalho pélvico: para reeducação muscular e alívio da dor;
- Terapia psicológica: como a terapia cognitivo-comportamental ou focada em sexualidade;
- Tratamento médico: com uso de lubrificantes, estrogênio vaginal, anticonvulsivantes ou antidepressivos para dor crônica e, em alguns casos, bloqueios anestésicos;
- Dilatação vaginal graduada: indicada especialmente nos casos de vaginismo.
“A escolha do tratamento depende da causa e da intensidade dos sintomas, mas o pilar central é sempre o respeito à vivência e ao ritmo da mulher”, explica a especialista.
Apesar de ser comum, a dor à penetração ainda é pouco discutida. “Falar sobre dor à penetração é um passo essencial para combater o tabu e garantir que mais mulheres recebam diagnóstico e tratamento adequados. O reconhecimento dessa dor como legítima e tratável pode mudar vidas e relacionamentos”, finaliza.