Papa Francisco: médicos explicam em que casos AVC pode levar à morte súbita
Pneumonia grave, como a sofrida pelo papa, pode levar a complicações respiratórias e sistêmicas que impactam diretamente a saúde do cérebro
Acidente vascular cerebral (AVC), popularmente conhecido como derrame cerebral, coma e parada cardiorrespiratória foram as causas da morte do papa Francisco, segundo confirmou, nesta segunda-feira (21), o Vaticano. O laudo foi assinado pelo diretor do Departamento de Saúde e Higiene do Estado da Cidade do Vaticano, Andrea Arcangeli.
O AVC ocorre quando o suprimento sanguíneo é reduzido ou bloqueado, o que pode levar à perda súbita da função neurológica e ocasionar lesões cerebrais pequenas, severas, temporárias ou permanentes.
O AVC pode ocorrer a qualquer hora, durante qualquer atividade e até durante o sono.
No caso do papa Francisco, o AVC foi fatal (levou à morte súbita) devido ao histórico de saúde e às condições preexistentes. "A pneumonia, especialmente em sua forma grave que o papa sofreu, pode levar a complicações respiratórias e sistêmicas que impactam diretamente a saúde cerebral", explicou, ao JC, o neurocirurgião Luiz Severo, PhD em neurociências pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
O médico Luiz Severo ressaltou que o pontífice apresentava um quadro clínico complexo, o que inclui a pneumonia bilateral e comorbidades como hipertensão, obesidade e diabetes tipo 2. "Tais condições são conhecidas por aumentar o risco de eventos cerebrovasculares. A pneumonia grave pode provocar hipoxemia (redução de oxigênio no sangue) - que, por sua vez, pode comprometer a perfusão cerebral e resultar em lesões isquêmicas."
De acordo com Luiz Severo, em casos como o do papa Francisco, ocorrem bronquiectasias - dilatações anormais e irreversíveis dos brônquios, causadas por infecções ou inflamações crônicas que lesionam a parede dos brônquios.
"As bronquiectasias dificultam as trocas gasosas e, portanto, deixam organismo e cérebro em hipóxia persistente. Por isso, o papa estava usando oxigênio contínuo. Isso leva a ainda mais sobrecarga do sistema cardiovascular devido à pneumonia, o que pode causar um aumento da pressão arterial, contribuindo para a fragilidade vascular. Essa fragilidade pode facilitar a ocorrência de um AVC, especialmente em um paciente já vulnerável devido a comorbidades como diabetes e hipertensão", salientou o neurocirurgião.
Idoso frágil
O neurologista Fernando Travassos também comentou, em entrevista ao JC, sobre a fragilidade do papa e reiterou que Francisco tinha idade avançada, pressão alta e diabetes - que são fatores risco para o AVC hemorrágico e isquêmico - aquele onde há um coágulo dentro do vaso sanguíneo com interrupção do sangue.
"Não temos informações sobre o tamanho do derrame ou a localização na cabeça para falar sobre a gravidade do caso. Mas os fatores de risco anteriormente citados, a fragilidade da saúde por pneumonia recente, a doença prévia no pulmão e problemas cardíacos foram determinantes para o falecimento do líder da igreja católica", afirmou Fernando Travassos, que é coordenador da Neurologia do Hospital Pelópidas Silveira (HPS), localizado no Curado, Zona Oeste do Recife.
Assista ao episódio #23 do videocast Saúde e Bem-Estar sobre AVC:
Que tipo de AVC leva à morte súbita?
Sobre o fato de o AVC levar à morte súbita em alguns casos, Luiz Severo sublinha que essa possibilidade existe principalmente quando se trata de um AVC tronco encefálico, que atinge áreas muito importantes do cérebro.
É um tipo de AVC que ocorre quando há interrupção do fluxo sanguíneo ou sangramento no tronco encefálico, uma região do cérebro que controla funções vitais como respiração e batimentos cardíacos. Trata-se de uma espécie de "centro de comando" básico para a sobrevivência. Se ele for afetado por um AVC, a respiração pode parar, o coração pode descompensar, e a pessoa pode perder a consciência quase instantaneamente.
Para Luiz Severo, o caso do papa leva a refletir como a relação entre pneumonia grave e AVC tardio é um campo de relevância médica, pois a inflamação e a infecção associadas à pneumonia podem agravar o estado neurológico do paciente. "Esse cenário tende a levar a desfechos clínicos desfavoráveis, como o coma e, eventualmente, o colapso cardiocirculatório", acrescentou o neurocirurgião.