Treze anos depois, mais de 80% das cidades de Pernambuco ainda não têm Plano Municipal de Mobilidade Urbana. No Brasil são 32 grandes cidades
Levantamentos do Centro de Atitudes e do Ministério das Cidades mostra que o cenário é desolador 13 anos após a Política Nacional de Mobilidade Urbana

O Brasil segue ‘brincando’ de que se importa com a mobilidade urbana de suas cidades. Tanto as grandes quanto as pequenas. Já se vão mais de 13 anos desde que a Política Nacional de Mobilidade Urbana - PNMU (Lei Federal 12.587/2012) entrou em vigor e determinava, naquele distante 13 de abril de 2012, que em três anos o País deveria apresentar seus Planos Municipais de Mobilidade Urbana (PMUs), conjunto de normas e regras de circulação, operação e integração dos sistemas de trânsito e transporte públicos de cada cidade. Mas até hoje a grande maioria das cidades não elaborou seus PMUs ou, quando o fez, com poucas exceções os colocou efetivamente em prática.
A omissão é nacional e, por sorte, menos dominante nas grandes cidades, aquelas que têm mais de 250 mil habitantes e que, por suas densidades demográficas e viárias, precisam ter regras de mobilidade urbana mais efetivas. Atualmente, segundo dados oficiais do site do Ministério das Cidades - atualizados até o dia 16/4/25 -, o Brasil tinha 84 dos 116 municípios obrigados a elaborar os PMUs com o estudo pronto, o que representa 72,41% do total. E 32 grandes cidades (28% do total) descumprindo a regra.
Quando o recorte é feito sobre as cidades entre 20 mil habitantes e até 250 mil habitantes - ou seja, a maioria do País -, o cenário é desestimulante. O mesmo monitoramento do Ministério das Cidades aponta que apenas 254 dos 1.795 municípios obrigados a elaborar os PMUs o fizeram até agora. O que significa dizer que 14,15% do total de cidades possuem o plano aprovado, enquanto 86% não o elaboraram ainda. E vale ressaltar que o fato de ter o PMU elaborado não significa que as políticas de mobilidade urbana foram efetivadas na prática. Isso é o mais angustiante, aliás.
RADIOGRAFIA DA EXECUÇÃO DOS PMUS NO BRASIL
Municípios com mais de 250 mil habitantes


116 municípios obrigados a elaborar os PMUs
84 possuem plano aprovado (mas não se sabe se aplicados efetivamente)
32 não elaboraram ainda
72,41% do total possuem o plano aprovado
28% do total não elaboraram ainda
Municípios com mais de 20 mil habitantes e menos de 250 mil habitantes


1.795 municípios obrigados a elaborar os PMUs
254 possuem plano aprovado (mas não se sabe se aplicados efetivamente)
14,15% do total possuem o plano aprovado
86% do total não elaboraram ainda
CENÁRIO EM PERNAMBUCO É DESOLADOR
Em Pernambuco, a situação também é crítica. Chega a ser desoladora. Levantamento realizado com base nos dados oficiais do MCidades pelo Centro de Atitudes, mostra que 84% dos municípios do Estado, dentre aqueles obrigados a entregar o PMU, desde 2012, ainda não fizeram seu dever de casa.
“É lamentável que, depois de tantos anos e alguns adiamentos, a maioria das cidades brasileiras ainda não tenha se dedicado à elaboração de seus planos de mobilidade urbana. Além de ser uma diretriz legal para o recebimento de dinheiro público federal, os PMUs são extremamentes importantes para as grandes cidades devido à quantidade de pólos geradores de tráfego que elas possuem, mas também para os pequenos municípios, que não contam com recursos para executar projetos de mobilidade urbana e precisam da ajuda do governo federal”, alerta Jason Torres, diretor-presidente executivo do Centro de Atitudes.
O Centro de Atitudes é uma organização da sociedade civil, com sede em Pernambuco, que fomenta, entre outras áreas, políticas de mobilidade urbana e meio ambiente, inclusive elabora os PMUs. “Às vezes, a prefeitura não tem recursos para calçar uma rua ou implantar uma calçada e precisa da ajuda federal. Sem o PMU isso fica mais difícil. E na maioria dessas pequenas cidades, que têm sistemas de mobilidade urbana simples, com poucos modais de transporte e atores, a elaboração desses estudos é mais fácil e barata do que se pensa”, volta a alertar o especialista.
RECIFE FEZ O PMU, MAS A CIDADE NÃO PERCEBE A SUA EXECUÇÃO NA PRÁTICA
A cidade do Recife é um exemplo do tamanho do desafio quando se fala dos planos municipais de mobilidade urbana: concluiu o PMU, mas não o executa na prática. Pelo que se conhece das diretrizes, o uso do automóvel seria desestimulado com o PMU recifense, pelo menos na teoria.
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Mas na prática não é o que se vê nas ruas da cidade, que abandonou há mais de três anos a implantação de Faixas Azuis para os ônibus e pouco avança na expansão e segurança da infraestrutura para bicicletas. A exceção é o uso do urbanismo tático para priorizar os pedestres, que tem ganhado destaque nas ações da gestão municipal.
A reportagem, inclusive, tentou saber da gestão municipal como está o andamento da efetiva aplicação do PMU, mas não teve retorno da prefeitura até o fechamento desta reportagem.
MAS POR QUE OS PMUs SÃO IMPORTANTES PARA AS CIDADES?
Os Planos de Mobilidade Urbana são o principal instrumento de planejamento das ações voltadas à melhoria das condições de mobilidade urbana. São eles que democratizam o acesso da população nas cidades, principalmente dos mais pobres, que vivem em territórios carentes de serviços públicos de educação, saúde, lazer, oportunidades de emprego, entre outros.
A importância para as cidades é tanta que a própria Confederação Nacional dos Municípios (CFM) destaca esse papel. “Os PMUs devem contemplar os serviços de transporte coletivo, áreas de estacionamentos, acessibilidade para pessoas com deficiência, áreas de circulação restrita ou controlada. Também como estratégias de sustentabilidade e redução das emissões de carbono, os planos devem privilegiar a mobilidade ativa e a integração entre os diferentes modos de transporte”.
A Lei 12.587, que instituiu a PNMU, com vigência a partir de 2012, deu inicialmente prazo de três anos (2015) para a elaboração dos planos. Em 2016, o período foi estendido para 2018. Em seguida, concedeu-se mais um ano. Em 2019, com a MP 906/19, o prazo foi para abril de 2021 durante sua vigência. Mas com a conversão da medida na Lei 14.000/2020, o Congresso Nacional estabeleceu novas prorrogações: abril de 2022 ou abril de 2023, conforme a população. Depois, o Ministério das Cidades ampliou de novo, limitando abril de 2024 para as cidades com mais de 250 mil habitantes e abril de 2025 para os municípios entre 20 mil habitantes e menos de 250 mil habitantes.
O alerta sobre a baixa adesão das cidades brasileiras à obrigação de elaborar os PMUs é uma forma de motivar os municípios a fazerem seus planos. Ainda mais em tempos em que, devido à política, o governo federal termina por usar a liberação de recursos federais para projetos de mobilidade urbana como moeda de troca para acordos e apoios políticos. Se as prefeituras, principalmente as pequenas, estiverem com as obrigações legais em dia, não precisam se sujeitar a isso.