Sistema Nacional de Educação segue para o Senado com pontos de atenção sobre financiamento e fiscalização

O SNE, conhecido como "SUS da Educação", busca colaboração entre entes federados, equidade no acesso e definição de prioridades educacionais

Por Mirella Araújo Publicado em 05/09/2025 às 16:03 | Atualizado em 05/09/2025 às 16:50

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Após aprovação na Câmara dos Deputados, na terça-feira (3), o Projeto de Lei Complementar (PLP) 235/19, que institui o Sistema Nacional de Educação (SNE), retorna agora ao Senado para nova análise.

O texto estabelece normas para a cooperação entre União, estados e municípios na implementação de políticas e programas educacionais.

O objetivo do sistema — chamado de "SUS da Educação" — é promover a colaboração entre os entes federados, garantir equidade no acesso à educação e orientar prioridades nas políticas educacionais.

A presidente da Comissão de Educação (CE) do Senado, Teresa Leitão (PT-PE), afirmou que o SNE é uma demanda antiga e que deveria ter se tornado lei desde o primeiro Plano Nacional de Educação (PNE).

Segundo a parlamentar, o sistema chega em boa hora, mas algumas questões precisam ser observadas pelos senadores. Entre os pontos de atenção destacados por Teresa estão o financiamento da educação básica, o Custo Aluno-Qualidade (CAQ) e a relação do SNE com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

Ela também apontou a necessidade de fortalecer a democratização da gestão: atualmente, o sistema prevê apenas o Fórum Nacional de Educação como instância obrigatória. Para a senadora, se o SNE vai integrar União, estados e municípios, a obrigatoriedade dos fóruns também deveria ser estendida às instâncias estaduais e municipais.

Mecanismos previstos

Entre os mecanismos previstos no projeto está a Comissão Intergestores Tripartite da Educação (Cite), coordenada pelo Ministério da Educação (MEC). A comissão terá a função de articular estratégias para o alcance das metas do PNE, com divisão de responsabilidades entre os entes federados.

Devido à autonomia dos estados e municípios, os pactos terão caráter orientativo, exceto na definição do padrão mínimo de qualidade da educação básica e do Custo Aluno-Qualidade, que serão estabelecidos por resoluções da Cite. A comissão terá composição paritária: seis representantes da União, seis dos estados e do Distrito Federal, e seis dos municípios, incluindo representantes do Consed e da Undime.

Os padrões mínimos de qualidade pactuados na Cite deverão considerar as diferentes etapas e modalidades da educação básica, orientando a redistribuição do orçamento da União via Fundeb e dos estados para os municípios. Entre os critérios estão jornada escolar mínima e progressiva ampliação para tempo integral, proporção adequada professor-aluno, formação docente, plano de carreira e piso salarial do magistério.

Também serão avaliados aspectos de infraestrutura, como conforto ambiental, salubridade, acessibilidade, água potável e instalações sanitárias, além de sustentabilidade ambiental. No desempenho escolar, os padrões devem incluir níveis adequados de aprendizagem, redução das desigualdades, trajetória regular dos estudantes, taxa de aprovação e redução de abandono e evasão escolar.

O CAQ será calculado com base em insumos mínimos e seus custos nacionais, ajustados conforme a etapa, modalidade e região, e será progressivamente elevado para contribuir com o financiamento das metas do PNE.

Responsabilização dos gestores

Um dos pontos de fragilidade apontados na discussão do SNE é a responsabilização dos gestores públicos diante do descumprimento das metas e da aplicação dos investimentos. Sobre esse tema, Teresa Leitão afirmou que a questão vem sendo debatida nas 12 audiências públicas realizadas pela Comissão de Educação sobre o novo PNE (2024-2034).

“Uma coisa que tem consenso é que não podemos esperar que os dez anos do PNE se completem para avaliar se as metas foram atingidas. É necessário ter um monitoramento mais periódico”, disse.

Segundo a senadora, é preciso definir claramente a quem responsabilizar quando as metas não forem atingidas e qual concepção de responsabilização deve prevalecer: se será meramente punitiva ou se servirá para reposicionar e direcionar estratégias.

“Se o SNE não der conta disto, a gente vai fazer o contraponto, né, o espelho com o que a gente tá debatendo no plano nacional de educação. Uma coisa é líquida e certa entre nós: não dá pra gente ter um novo plano nacional de educação que não seja efetivado”, afirmou Teresa Leitão.

A senadora concluiu que, com a chegada do projeto ao Senado, terá reuniões com o autor da proposta, senador Flávio Arns, para compatibilizar o SNE com o PNE e garantir que o sistema funcione como instrumento efetivo de políticas educacionais.

Coma  chegada do projeto ao Senado, a presidente da Comissão de Edcuação afirmou que se reunirá com o autor da proposta na Casa, senador Flávio Arns (PSB-PR), para compatibilizar o SNE com o PNE e garantir que o sistema funcione como instrumento efetivo de políticas educacionais.

GABRIEL FERREIRA/JC Imagem
Senadora Teresa Leitão (PT-PE) - GABRIEL FERREIRA/JC Imagem

Controle social e qualidade da educação

A professora Ana Lúcia Félix dos Santos, do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), destacou que o SNE deve assegurar padrões equitativos de acesso, permanência e aprendizagem, tanto na educação básica quanto na superior.

No entanto, também há fragilidades a serem observadas no que diz respeito ao controle social. “O acompanhamento das políticas educacionais é feito por instâncias democráticas, como os fóruns estaduais, municipais e o Fórum Nacional de Educação, que articulam sociedade civil, gestores e poder público. Mas não há previsão orçamentária para garantir o funcionamento efetivo desses espaços, como espaços de controle social", afirmou.

Sobre o Custo Aluno-Qualidade, Ana Lúcia explicou: “É preciso calcular quanto cada aluno precisa para receber uma educação de qualidade em cada etapa. Isso deve ser feito de forma justa, considerando as diferenças entre municípios ricos e pobres, garantindo que os mais pobres tenham recursos suficientes.”

Diante disso, Ana Lúcia defende maior clareza na metodologia do cálculo do CAQ e sobre a participação da sociedade civil nas instâncias de decisão, incluindo o fortalecimento da Conferência Nacional de Educação. “Esses são elementos que precisam ser melhor esclarecidos e estruturados dentro do SNE”, concluiu a professora, em entrevista à coluna Enem e Educação.

Avaliação periódica da educação básica

O projeto do SNE também institui uma avaliação nacional da educação básica, abrangendo escolas públicas e privadas. O objetivo é produzir um diagnóstico integrado de gestão, infraestrutura, recursos e resultados de aprendizagem, gerando subsídios para o planejamento e aprimoramento das políticas educacionais.

Os dados serão divulgados de forma a fortalecer o controle social. A cada dois anos, no máximo, serão produzidos indicadores de rendimento escolar a partir de exames nacionais, com participação mínima de 80% dos alunos de cada escola nas séries avaliadas.

Além do desempenho dos estudantes, a avaliação incluirá indicadores institucionais, como perfil de alunos e profissionais da educação, relação entre número de docentes e discentes, condições de infraestrutura, recursos pedagógicos e processos de gestão.

O presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), deputado estadual Renato Antunes (PL), afirmou ao JC que considera válida toda proposta que trate a educação em nível nacional, mas fez ressalvas ao projeto.

Segundo ele, diferentemente do SUS, que segue protocolos padronizados para a saúde em todo o país, os desafios educacionais variam de região para região. Antunes destacou que um problema enfrentado no Nordeste pode não ser o mesmo no Sudeste, já que cada região apresenta suas próprias peculiaridades.

"Acho que esse é um primeiro passo que está sendo feito para uma unificação nacional da qualidade do ensino, mas ela tem que ser implementada como um projeto de médio e longo prazo, não imposta como política de Estado de imediato, inclusive já sendo incorporada ao novo PNE. Entendo que a proposta é boa, mas deve ser vista com ressalvas", destacou.

 

Janaína Pepeu/Secom
Imagem de estudantes entrando em uma escola pública da rede estadual de ensino de Pernambuco - Janaína Pepeu/Secom

*Com informações da Agência Câmara de Notícias

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