O empate entre petistas e bolsonaristas é sintoma e não diagnóstico
É sintoma das decepções que o eleitor tem sofrido com o atual governo e quanto mais o governo decepciona, mais magoado o brasileiro fica

O Brasil não tem 70% de sua população mergulhada na militância política, vivendo o dia-a-dia partidário e saindo às ruas com bandeiras do PT ou fotos de Bolsonaro e Lula como se suas vidas em comunidade dependessem daquilo. Por isso o resultado da pesquisa Datafolha apontando que entrevistados declarados petistas empataram com os que se declaram bolsonaristas em 35% (somando 70%) precisa ser analisado mais como sintoma do que como diagnóstico.
Olho no ex
É sintoma das decepções que o eleitor tem sofrido com o atual governo e quanto mais o governo decepciona, mais magoado o brasileiro fica, ao ponto de dizer que ama o ex. Sim, o ex é Jair Bolsonaro, hoje inelegível. Na verdade, nem há 35% da população “bolsonarista” e nem 35% de militantes petistas apaixonados. O que existe é uma relação conturbada nesse triângulo amoroso e quem melhor aproveita o drama é o dono do bar, que ajuda a afogar todas as mágoas e as inseguranças dos envolvidos. O dono do bar é o centrão.
Momento
E as bebidas estão ficando mais caras a cada dia que passa. Não tem Banco Central que segure essa inflação. Lula, nesse caso, é o cliente mais rico porque controla o cofre público mais gordo. E o dono do bar é um aproveitador. Quanto mais dinheiro tiver o sujeito do outro lado do balcão e quanto mais desesperado ele estiver, mais caro é o alívio. O centrão está vendo o crescimento dos bolsonaristas e a queda na popularidade lulista. Quanto mais afastado estiver dos dois nos próximos meses, mais vai lucrar com uma decisão futura.
Boletos
O centrão já constatou também que, ao contrário da direita com seus variados substitutos para Bolsonaro (PL), a esquerda não tem a mínima ideia de quem poderá substituir o atual presidente, caso Lula não dispute a eleição. O empate em 35%×35% entre bolsonaristas e lulistas é mais importante pelos 30% que sobram do que por qualquer outra coisa. É com esses 30% que o centrão trabalha. E é por ele que os boletos chegam para o governo petista. Boletos pagos pelo contribuinte, lógico.
Sobre perspectiva…
Lula é o principal culpado por não haver substituto dentro de seu próprio campo. Há um misto de vaidade e soberba na maneira como o presidente conduziu a esquerda nas últimas décadas e a tornou refém de alguém que, por maior que seja seu nome na história, também envelhece e, em algum momento, cansa. O PT nunca teve coragem de discutir a sucessão de Lula pois era preciso fazer isso com o próprio Lula, que não dava abertura para isso. Agora que está cansado e não tem mais paciência para os pormenores do poder, ficou encurralado.
…e a falta dela
A esquerda está tão enfraquecida pela falta de perspectiva que conseguiu produzir um milagre. Está dividindo espaço de igual para igual, com uma direita cujo principal líder está inelegível, prestes a ser preso junto com o grupo que era sua base na presidência. Era para estar esquecido, enfraquecido em sua ausência de futuro e condenado a uma trajetória parecida com a de Fernando Collor após o impeachment, de coadjuvância nobre mas distante dos holofotes. Ao invés disso, segue cheio de luz, graças a Lula e seu governo.