Cena Política | Análise

Igor Maciel: O aviso que precede o prejuízo e não foi ouvido nos últimos anos

Depois dos números do próprio governo com previsão de rombo em 2027, a expressão "eu avisei" já pode ser tema de escola de samba no carnaval de 2026.

Por Igor Maciel Publicado em 16/04/2025 às 21:00 | Atualizado em 17/04/2025 às 6:37

O governo Lula admitiu no Projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias que pode faltar dinheiro em 2027 para pagar as contas e fazer investimentos. A previsão é que haverá apenas R$ 122 bilhões para despesas não obrigatórias. E a própria equipe econômica diz que isso não será suficiente.

O ano em questão será o primeiro do próximo governo. Pode ser Lula (PT) novamente, se reeleito, ou pode ser outro presidente, mas as contas serão apertadas. Se for alguém da oposição, teremos quatro anos de justificativas no estilo “herança maldita”. Se for um aliado do atual governo, terão que arranjar algum inimigo, como foi o Banco Central nos últimos anos.

BC

O Banco Central, aliás, foi um dos que avisou que ia faltar dinheiro desde o início. Mas os lulistas decidiram não dar atenção e até elegeram o então presidente do BC como o bode expiatório de tudo o que deu errado nos últimos anos.

Se as coisas iam mal, era culpa de Roberto Campos Neto que subia a taxa de juros. Não fosse pelo zelo do Banco Central com a Selic, é difícil dizer o quanto pior poderíamos estar. Foi nessa época, inclusive, que aliados do governo se esforçaram mais para repetir que o governo não estava gastando, mas investindo no país. Uma falácia disfarçada como axioma.

Cortes

Não foi só isso. No episódio do corte de gastos, quando o governo se rendeu à necessidade de reduzir a despesa mas, na prática, conseguiu frustrar todo o mercado, outra vez surgiu com força a ideia de que seria difícil fechar as contas nos anos seguintes.

Isso gerou uma briga entre petistas acostumados à noção de “meu gasto, minha vida” dos governos anteriores contra a equipe econômica do ministro Fernando Haddad (PT).

O chefe da pasta da Fazenda virou alvo por defender que houvesse contenção maior nos gastos. Ele defendia até certo ponto o comportamento do Banco Central e queria dar motivos para que o comportamento mudasse. Perdeu o embate. Foi um dos fatores para fazer o dólar pipocar na época.

Gasta mais

Não faltaram avisos através da imprensa também. Não foram poucas as reportagens apontando problemas nas contas, entrevistas cobrando gestores do governo por causa das despesas. A tudo isso o governo Lula respondeu com mais programas sociais e mais gastos.

Há, dentro da gestão, uma ideia equivocada sobre a economia, de que injetar dinheiro aquece a economia e que a melhor forma de fazer isso é incentivando o consumo. Na teoria ninguém pode negar, mas o resultado prático hoje é diferente do que era vinte anos atrás. A prova, para quem não aceitou nenhum dos avisos, conselhos e apelos dos últimos anos, chegou com o projeto da LDO, confirmando o rombo previsto para 2027.

Populismo

Não é algo gravado em pedra que os números serão esses, já que um dos paradoxos sobre antecipar o futuro é que conhecê-lo já modifica o presente e altera o porvir. Basta economizar e podemos chegar em melhores condições daqui a dois anos.

Não foi o ministério da Fazenda da Argentina, nem o Banco Central, nem a “mídia liberal malvada” quem anunciou o buraco para 2027, mas o próprio governo. É só começar a tentar consertar agora. Mas para isso é necessário esquecer um pouco a próxima eleição no ano que vem e evitar populismos. Será possível?

Samba

A expressão “eu avisei” já pode ser tema de escola de samba no carnaval de 2026. O samba enredo teria um refrão bem batucado mais ou menos assim: “Ano que vem não tem dinheiro para as contas, pois no passado presidente quis ser rei. Gastaram tudo reclamando que era pouco. Banco Central agora diz: eu avisei”.

Confira a vídeocast Cena Política

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