Editorial JC: Improviso para gastar mais
Fazendo de conta que respeita o arcabouço fiscal, governo Lula amplia exceções à regra e transforma o próprio arcabouço em faz de conta
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No início de 2023, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, anunciaram o aguardado instrumento de gestão criado com o objetivo de substituir o teto de gastos públicos, criado por Michel Temer e vigente até o governo anterior, de Jair Bolsonaro.
Vale recordar que nem Bolsonaro, nem a maioria do Congresso, oposição ou governo, gostavam da limitação orçamentária. Assim como as gestões petistas em geral, por defenderem, como o próprio Lula já deu a entender – e precisou ser minimizado por Haddad – que governo bom é governo que gasta. E não precisava nem dizer, porque mesmo no terceiro mandato, Lula acomoda aliados em quase 40 ministérios, e nunca sequer cogitou cortar despesas, sob qualquer propósito, a fim de gastar melhor os recursos do povo brasileiro.
O intuito do arcabouço era controlar despesas e frear o crescimento da dívida pública, historicamente fora de controle, inclusive nos governos de Lula de Dilma Rousseff. Como efeitos subsequentes, esperava-se que o arcabouço, cumpridas suas missões básicas, pudesse ainda fazer os juros recuarem, e a inflação não ameaçar voltar a patamares preocupantes para a economia. Uma palavra repetida pelas equipes de Haddad e Tebet resumia a expectativa da nova ferramenta fiscal: previsibilidade.
Três anos depois, a única coisa previsível que se tornou realidade foi o ímpeto do improviso para gastar mais do que o orçamento dispõe, acumular déficit sobre déficit, e arrumar jeitinhos para não desmoralizar a criação da equipe econômica, lá atrás, em animada pulsão de começo de mandato.
Se o teto de gastos engessava o orçamento, o arcabouço fiscal, além de retirar o teto, expande o orçamento em todas as direções desejáveis, permitindo exceções aos limites estipulados pela necessidade de controle fiscal. Mas se o presidente da República não compreende a necessidade do controle de gastos, a improvisação vira a principal regra.
A conta das exceções deve chegar ao final do atual mandato em R$ 170 bilhões. A responsabilidade é compartilhada com deputados e senadores, cada vez menos dispostos a ratificar controles de despesas, e mais interessados em satisfazer suas bases eleitorais e seus acordos setoriais.
E com o Judiciário, que tem no seu próprio teto uma exceção bilionária, como se estivesse fora do orçamento oficial. Os gastos com as Forças Armadas estiveram à margem do arcabouço em R$ 5 bilhões, assim como a Medida Provisória de ajuda a empresas vitimadas pelo tarifaço dos Estados Unidos – mais R$ 9,5 bi fora do limite. São apenas alguns exemplos de improvisos que turbinam o descontrole.
Dessa forma, os resultados fiscais tendem a ser mascarados pelos gastos que ficam fora do controle. Até um superávit fictício pode vir por aí, em pleno ano eleitoral. Fazendo de conta que respeita o arcabouço fiscal, o governo Lula amplia exceções à regra e transforma o próprio arcabouço – e com ele, o governo inteiro – em faz de conta.