A resposta pronta
"O sábio não é o homem que fornece as verdadeiras respostas; é quem faz as verdadeiras perguntas."...........................................

No seu estúdio da rua de Fleurus, na Paris dos anos 20, Gertrude Stein - ela cunhou a famosa expressão "une génération perdue" - diante de seu retrato feito por Picasso, reclama de não ser parecido com ela mesma. "Acabará sendo", disse-lhe o pintor espanhol.
Essa resposta pronta, em ato instante, na sagacidade de réplica do interlocutor, denominamos de retórica do espírito. Retórica, arte do uso da linguagem pelo discurso persuasivo com técnicas de argumentação pela forma de capacidade de superar ciladas verbais, em reação de aguda inteligência de um espírito posto em esgrima. Ciência de bem retrucar, com a eficácia da comunicação reconvinte.
De fato. Indagado porque respondia a uma pergunta sempre com outra pergunta, limitou-se o sábio a responder: "E por que não?".
Conta-se que o jornalista Silvino Lopes fora procurado na redação do "Jornal do Commercio" por uma jovem muito desejosa por conhecê-lo e ao encontrá-lo essa se afirmou surpresa. Ela o imaginava bem mais jovem. O jornalista, irônico, replicou que ela chegara atrasada.
Certa vez, um fã abordou a cantora Maria Callas e ela o tratou friamente, negando-lhe o autógrafo, ao dizer que não queria ser interrompida. Este reagiu afirmando que pretendia obter um autógrafo, mas o de sua filha. Referiu-se à secretária que a acompanhava, uma senhora de idade avançada.
Quando determinada autoridade republicana, em balcão de empresa aérea, reclamando imediata solução face um voo cancelado, interpelou: "sabe quem sou eu?"; a funcionária, de megafone, anunciou: - "temos aqui um passageiro que não sabe quem é; algum parente ou responsável por ele que possa ajudá lo a descobrir sua identidade?".
Em tempo de notórias perplexidades, a resposta haverá de ser sempre pronta, eficaz e definitiva. Estamos perante um tempo agônico que indaga a própria história, no sentido de suas lições intemporais melhor responderem, com resiliências, as inquietudes de época.
O filósofo existencialista Jean Paul Sartre teve a sua resposta pronta, quando afirmou: "o importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós".
Existirão perguntas impossíveis sobre as quais não haverá respostas prontas. Perguntas feitas ao "desconhecido" podem obter supostas respostas, sem devida prontitude. Respostas impossíveis que estão além de qualquer suposição. Embora Sir Thomas Browne (Sec. XVII) ao questionar que canção entoavam as sereias ou que nome adotou Aquiles quando oculto entre as mulheres, tenha as admitido como perguntas viáveis.
Viável será, v.g., perguntar o tempo que durou o incêndio de Roma (19.07.0064), quando a cidade de catorze bairros, ardeu em chamas por cerca de cento e cinquenta horas, restando indene em apenas três deles.
Conta a lenda que o lobo mau sempre perseguiu os três porquinhos para comê los. E quando conseguiu alcançá-los, estando prestes a efetivar o intento, um deles perguntou-lhe o que faria no dia seguinte. Esse tinha uma pergunta pronta. O lobo mau logo entendeu que seu projeto era o de ensaiar a perseguição permanente aos três porquinhos e terminou por libertá-los. Ele descobriu, a tempo e modo, que ficaria sem um propósito de vida.
A ideia de "respostas prontas" pode ser vista como algo que vem da mente racional (ou da linguística cognitiva), podendo representar uma capacidade de posição replicante.
O humorista Groucho Marx convidado a integrar o quadro de sócios de destacado clube, retrucou, de pronto: "Jamais me tornaria socio de um clube que me aceitasse como tal".
Existem também respostas prontas, que antes da prontidão de espírito, constituem réplicas que sufragam intolerâncias. As acusações impostas a Maria Madalena e o amor impossível de Romeu e Julieta são exemplos clássicos de intolerância.
A pergunta ácida e entediada que Caim faz a Deus, após ter matado Abel: "num custos fratis mei sum ego?" ("Sou eu o guardião do meu irmão?"), é a réplica intolerante e dramática que Gênesis 4:9 registra. Símbolo de uma cultura de incompreensão que todos os filhos de Caim herdariam para todas as gerações.
Caim, o primogênito, replica Deus, o Criador, grafando na resposta uma pretendida fixação de domínio de sua arrogância, em enunciado que contraria a própria razão e espírito do essencial. Consabido pela Torá, o termo "guarda" ("schamar") referir ao dever de vigília na proteção mútua, vínculo maior da família humana.
Em verdade, ele pretendia ocultar o que fizera, no delito contra Abel - inocente de toda culpa - em violação da guarda vigilante. Mais que isso, ao dever de velar a vida do próximo. Tem-se na intolerância da resposta do assassino, a busca de ocultação de todas as violências do mundo. Do crime-gênese insuportável de todos os crimes, a intolerância tem o seu ápice de ilicitude, quando Caim, ainda questiona: "É tão grande o meu delito de que não se possa suportar?".
Haverá a nossa condição humana, em dimensão de um mundo melhor, de indagar: "Na vida, você sempre tem uma resposta (ou pergunta) pronta, que seja a do espírito livre?".
Importa perguntar o que tem sido de nossa interrrelação com o próximo, em evidência de nossas responsabilidades sociais. Necessário que existam respostas prontas. Dirá, afinal, Claude-Levy Strauss: "O sábio não é o homem que fornece as verdadeiras respostas; é quem faz as verdadeiras perguntas."
Jones Figueirêdo Alves, desembargador Emérito do TJPE e advogado e parecerista