Uma ode à elegância
Poetas e atrizes são monstruosidades, segundo Flaubert. Mas o que ambos - o poeta Joaquim e a atriz Fernanda - fazem, em Pausa & Linha é ad-mirar,

O antropólogo Camara Cascudo e o filósofo Emil Cioran têm algo em comum com o escritor Joaquim Falcão. Os três se exercitam num gênero bonito e difícil: o da admiração. O primeiro, nesse campo, publicou Gente viva; o segundo, Exercícios de admiração, e o terceiro, um livro que acaba de ser lançado: Pausa & Linha - o poder em Fernanda Montenegro.
Há um "claro enigma" no ensaio de Falcão. Um I Ching particular, com suas linhas sólidas e suas pausas. Como se ele, em diálogos de silêncios eloquentes, fosse o Eckermann ou o Boswell da atriz. À sua maneira, o autor é poeta. O livro constrói-se em poiesis e representação. É também um palco.
Poetas e atrizes são monstruosidades, na opinião de Flaubert. Mas o que ambos - o poeta Joaquim e a atriz Fernanda - fazem, em Pausa & Linha é ad-mirar, é vindicar ou reivindicar a beleza. Ou seja, mais do que entreolhar-se: maravilhar-se. Não como a prática de um narcisismo ilustrado mútuo e ilusionado, mas fascinados pela sensibilidade, sutileza e elegância, pausadamente - como dizem os espanhóis. Ou de modo mais exato: talvez no sentido de Sófocles, que, em Antígona, tem uma passagem famosa: nada há mais maravilhoso (outros preferem assombroso ou perturbador) do que o ser humano.
Pausa & Linha não é apenas elegante no conteúdo, é-o também na forma. O belo objeto que as Edições Pinakotheke compõem de 156 páginas e entregam ao leitor convida à apreciação lenta, como os bons vinhos, as boas conversas. Portanto, uma pausa para o sem-pressa, o fluir e o fruir do livro, da fala, dos olhos e os outros sentidos. Além disso, ou, dentro disso, a diversão. Coisa lúdica. Um passeio pelas imagens, um estímulo também à "navegação" em linha, ou seja, Oh-line, pelos meios digitais.
O ser humano não deve admirar, nem preferir, nem desejar, senão o honesto e o belo. Quem afirmou isso foi o filósofo romano Cicero. Mas poderia ser Joaquim Falcão.
Mario Helio, escritor e jornalista. editor das revistas Continente e Pernambuco. Membro da Academia Pernambucana de Letras.