Nova resolução do CFM vai parar no STF
Medida do Conselho Federal de Medicina restringe cuidados em saúde das pessoas trans e travestis no Brasil, líder mundial em transfeminicídios

Sob a falácia do “aperfeiçoamento do atendimento médico”, a nova resolução (nº 2.427/2025) do Conselho Federal de Medicina (CFM) é um ataque aos direitos já garantidos de jovens trans e travestis, população historicamente criminalizada e patologizada no Brasil, país líder em transfeminicídios no mundo.
A comunidade trans e travesti brasileira veio a público repudiar a recente publicação, que revogou uma resolução anterior do órgão e restringiu o acesso a hormonioterapia, acompanhamento psiquiátrico, protocolos cirúrgicos e bloqueadores hormonais de puberdade.
Entre as principais medidas do CFM, está o aumento da idade mínima de 18 para 21 anos para realização de cirurgias (o que vai de encontro ao Código Civil) e a proibição do uso de bloqueadores hormonais para crianças e adolescentes.
A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e o Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (Ibrat) moveram uma ação contra o CFM no Supremo Tribunal Federal (STF).
As entidades pedem que se retome a redação original da Resolução 2.265/2019 para que seja garantido o direito fundamental ao livre desenvolvimento da personalidade de crianças trans e travestis com bloqueio hormonal da puberdade, hormonização a partir dos 16 anos e cirurgia de afirmação de gênero a partir dos 18 anos.
Na terça-feira (22), entidades como as sociedades brasileiras de Endocrinologia e Metabologia e de Urologia, além das associações brasileiras de Obstetrícia e Ginecologia da Infância e Adolescência e de Estudos em Medicina e Saúde Sexual, também assinaram uma nota conjunta com críticas às novas regras.
Há o receio de que, com a norma, o CFM exponha crianças e adolescentes ao uso de hormônios e à realização de procedimentos cirúrgicos de forma clandestina e insegura, sem o devido acompanhamento médico, hoje garantido pelo sistema público de saúde, aumentando os riscos à saúde desses jovens.
A nova resolução é considerada um ato autoritário. Além de violar direitos, foi emitida sem diálogo com a população afetada ou com a categoria que presta cuidados de saúde. É um grave retrocesso às garantias de direitos fundamentais, aos princípios da dignidade da pessoa humana, da proteção integral da criança e do direito fundamental à identidade de gênero autopercebida.
Também evidencia o avanço do conservadorismo e do fundamentalismo contra os direitos duramente conquistados pela população LGBTQIAPN+ e coloca em xeque práticas clínicas seguras, já estabelecidas com base em rigorosos critérios científicos e consensos internacionais e utilizadas há anos no SUS.
A saúde das pessoas trans e travestis não é uma pauta ideológica. É uma garantia assegurada pela Constituição. Essa população tem direito a acolhimento, serviços dignos e cuidados integrais em todos os seus ciclos de vida.
Dezenas de organizações reivindicam a imediata revogação da resolução, entre elas a Gestos - Soropositividade, Comunicação e Gênero, que luta pelos direitos humanos há 31 anos.
Juliana Cesar, coordenadora de articulação política, relações internacionais e comunicação da ONG Gestos - Soropositividade, Comunicação e Gênero_