Geração Z descobre a inflação "na pele"; lição simples explica o drama econômico
No Brasil, dois temas ocuparam (e vêm ocupando) a atenção da nossa sociedade: a adolescência (geração Z) e a inflação que vem perdurando

Excetuada a colossal inundação da insensatez de Trump em todos os espaços da mídia global, no Brasil, dois temas ocuparam (e vêm ocupando) a atenção da nossa sociedade: a adolescência (geração Z) e a Inflação.
Um esclarecimento oportuno: importante não tomar a rigidez do recorte temporal que estabelece os ciclos geracionais. Porém, é preciso atentar para a definição de Jonathan Haidt, cujo livro “Geração Ansiosa” foi objeto de artigo de minha autoria publicado na edição 1/9/24 do JC/Pe e do Blog do Noblat, intitulado “Entre a infância do brincar e do celular”.
Formam a “Geração Z”, os nascidos na metade dos anos noventa que segundo autor “passou pela puberdade com o portal no bolso”. Não seria exagero denominá-los de “nativos digitais” e que desafiam as instituições formadoras da personalidade humana, a partir da família, a lidarem com a complexidade de novos padrões de comportamento.
Criada por Jack Thorne e Stephen Graham para a Netflix, a série “Adolescência” escancara o conflito silencioso ou explosivo entres gerações no seio das famílias e nas relações sociais. Tem sido objeto de grande audiência e debates. A avaliação, a meu ver, ultrapassa critérios estéticos ou a opinião crítica dos cinéfilos: é um choque de realidade e um convite a reflexão para estabelecer o diálogo e a compreensão entre mundos tão diferentes.
Geração Z e a Inflação: Uma Conexão Inesperada
Aí o leitor, com razão, indagaria: o que tem a ver adolescência com inflação, além da presença frequente no noticiário. Vou explicar.
No final de fevereiro, recebi a visita do meu neto e um colega do colégio (ambos com catorze anos). Com a suavidade de sempre, perguntou: - Vô, no final do semestre o meu grupo vai apresentar um trabalho sobre inflação, você ajuda a gente? De imediato – respondi – com a forte carga de afeto: “claro!”.
Por dentro, a consciência foi incisiva: - Lascou! Você não sabe nada de economia, muito menos de inflação. Vai dizer bobagem e atrapalhar esses garotos. De fato, o que sei sobre inflação é que fui vítima dela sempre, derrotado, inclusive, na tarefa de ajudar a combatê-la.
O que fazer diante de duas realidades complexas: a adolescência e a inflação. Compensar minha ignorância com esforço didático, usando a antiga experiência quando ensinava português e história aos pirralhos.
O Dinheiro Encolhe: Uma Explicação Simples da Inflação
Entreguei a eles duas cédulas de cem reais. No primeiro sábado de março, orientei, vocês vão à feira e ao mercado de Casa Amarela; usam uma cédula para comprar as seguintes mercadorias: um quilo de feijão, arroz, frango, tomate, café moído, uma dúzia de ovos, e uma caixa de leite longa vida; anotem o valor e, no último sábado, vocês façam as mesmas compras com a outra cédula, anotando tudo com os respectivos preços e voltaremos a nos encontrar no primeiro fim de semana de abril.
Decorrido o prazo, eles prestaram contas: “Deu para pagar as compras dos dois sábados? – No primeiro, deu e sobraram três reais e, no segundo, faltaram de 11 reais. E aí o que vocês fizeram? A resposta foi rápida: - A gente reduziu a quantidade do café moído, dos tomates e dos ovos para fechar a conta.
Os cem reais passaram, a valer menos, os comerciantes venderam menos, porque os preços subiram e a quantidade dos alimentos diminuiu.
Aí o amigo do neto não pestanejou: “o dinheiro ‘encolheu’ e todo mundo perdeu!”.
A Importância da Economia Sólida para as Novas Gerações
Muito bem! Vocês perceberam, no mundo real da economia, o significado do “mercado”, o lugar/espaço em que produtores que ofertam bens e serviços e os consumidores compram por um preço (valor monetário, no caso o Real).
Ao mesmo tempo, sentiram na pele a perda de valor do dinheiro. De forma bem simplificada, descobriram uma parte da inflação que atinge os alimentos definidos como “gêneros de primeira necessidade”. O dinheiro, de fato, encolheu e ocorreu numa “inflação” localizada.
No entanto, quando o aumento de preços é generalizado, contínuo e persistente há um enorme exército de perdedores (os mais pobres), privilegiada minoria de ganhadores (os mais ricos), sociedade desigual e um futuro coletivo comprometido.
No começo é uma doença fácil de ver e dificílima de curar; desorganiza o funcionamento da economia; destroem as moedas, jogadas no cassino financeiro e no caldo cultural da esperteza dos mercados de capital.
- Sem querer assustá-los, mas devo dizer que na raiz da ascensão do nazismo (e Hitler) na Alemanha foi o fenômeno hiperinflacionário que levou o mundo à tragédia da II Guerra Mundial. Em 1923, um jornal custava 200 bilhões de marcos.
Há outros exemplos históricos dramáticos produzidos pela devastação inflacionária. Vale salientar, porém, que há um exemplo de sucesso no combate à esta perversa patologia social: o Brasil. Por mais de meio século, padecemos de uma furiosa inflação e tratamentos que não deram certo.
No entanto, uma genial engenharia social e política, o Plano Real, faz trinta anos, que, além de criar uma moeda forte, ambiente de estabilidade, previsibilidade e a décima economia do mundo, capacitou o país a enfrentar os desafios ambientais e sociais de uma nação mais igualitária.
Lição Final: Como a Geração Z Pode Evitar o Desequilíbrio Financeiro
Meus dois ouvintes estavam muito atentos. Mas para começo de conversa, era o bastante. Ficaram curiosos com a história do Real.
Prometi que contaria o pouco do que sabia no próximo encontro. Não esqueci de lembrar que uma economia sólida e a liberdade política são um patrimônio e conquistas que estão sendo usufruídas pelas duas últimas gerações: todos nós temos o dever cívico de legá-las ao futuro.
Depois do abraço de despedida, ia cometendo uma falha imperdoável: - um minuto. Ia esquecendo de uma regra básica contra a inflação e o desequilíbrio econômico: não gastem mais do que recebem da mesada.
Gustavo Krause, ex-governador