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Zé Coió

Nascido e criado na Liberdade, bairro pobre da cidade do Salvador, onde se criou, Zé Coió nunca pretendeu ser um grande astro do cinema e do humor.

Por ARTHUR CARVALHO Publicado em 24/04/2025 às 0:00 | Atualizado em 25/04/2025 às 10:28

O humorista mais debochado, pornofônico, pornográfico e engraçado, animador de festa de mocidade, circo mambembe e teatro de subúrbio que conheci foi o mulato Zé Coió.

Nascido e criado na Liberdade, bairro pobre da cidade do Salvador, onde se criou, Zé Coió nunca pretendeu ser um grande astro do cinema e do humor. Sua área de atuação era o Nordeste brasileiro, principalmente Bahia, Pernambuco, Ceará e Paraíba.

Tipo de rua, vagabundo profissional, jamais aceitou emprego, que não era homem de ter chefe e bater ponto, cumprir horário, submeter-se a disciplina de qualquer espécie. Hora de dormir dormir, de comer comer, de beber cachaça beber, que ninguém é de ferro. Politizado, antifascista de nascimento e infância, anarquista por excelência, na maturidade e velhice. Tinha suas leituras: Gregório de Matos, o Boca do Inferno, Aloysio de Carvalho, o Lulu Parola, Ascenso Ferreira e Jorge Amado.

Mas do que Zé Coió gostava mesmo era subir nos palcos para insultar as "autoridades constituídas" com piadas e termos de baixo calão, sem poupar presidente de república, governador, deputado federal e senador, para delírio das numerosas plateias que lotavam seus shows. Não raro, ilustrava suas apresentações com gestuais grotescos e imorais como banana e balançado das genitálias. Um desbunde. Às vezes, dependendo do delegado de plantão ou da empresa patrocinadora, ou simples anunciante, era preso em flagrante por "atentado ao pudor" ou "dano moral à sociedade e à família." Por isso, prevenido que sempre foi, fazia seus discursos com a escova de dente no bolso da camisa.

Mas Zé Coió era, antes de mais nada, prestativo amigo dos amigos, um cara legal e leal aos foras da lei, aos "vida torta," como dizem na Boa Terra. Sua atividade principal, a que lhe dava maior prazer era a de gigolô, também chamada de proxeneta. Ele preferia "proxeneta," achava mais bonita, mais musical, mais chique: "sou proxeneta com muito orgulho, mas somente arranjo mulher gostosa, bem pago." Bem pago nada, conforme a situação (sustentava várias mulheres, que o adoravam e exploravam), andava liso e fumava desbragadamente cigarrilhas Talvis com piteira. Devo a Zé Coió a cura de minha primeira depressão. Ele me jogou nos braços carinhosos da morena Odete residente no Pelourinho, protegida de meu querido amigo mestre Canjiquinha com academia no nº 19 do famoso bas-fond. Não precisei tomar remédio controlado nem de farmácia.

Arthur Carvalho, sócio correspondente da Academia Petropolitana de Letras

 

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