OPINIÃO | Notícia

Viva Marcos Vilaça!!!

Marcos Vilaça nasceu em Limoeiro e em Nazaré da Mata, ao mesmo tempo, isso não se discute. Prova de que já pode ser considerado uma espécie de Deus

Por José Paulo Cavalcanti Filho Publicado em 29/03/2025 às 16:59

VIVA MARCOS VILAÇA!!!

Como reverenciar um homem como Marcos Vilaça?, eis a questão. Talvez não com arrogância, por exemplo indicando ter sido professor em muitos centros, com destaque para a Faculdade de Direito do Recife.

• Nem ter feito conferências em numerosas universidades, no mundo inteiro, de Moçambique a Helsinki.

• Nem ter sido Ministro do Tribunal de Contas da União, em que foi presidente.

• Nem referindo suas 182 condecorações e medalhas, incluindo todas as mais expressivas no Brasil, além de uma dezena de honrarias estrangeiros.

• Nem, por fim, indicado seus 76 livros publicados. Entre os quais cito Em Torno da Sociologia do Caminhão – quando, pela primeira vez, se estabeleceram as implicações sociológicas das migrações no Brasil. Coronel, Coronéis, quando traçou perfil dos interiores de nosso país; num tempo em que a política, tão diferente de hoje, ainda se fazia com engenho e arte. E Itinerário da Corte, pela honra de ter escrito seu prefácio. Sem esquecer os 15 livros publicados no estrangeiro – em português (de Portugal), alemão, espanhol, francês, inglês e italiano.

• Com tantos inacreditáveis títulos, e em palavras de Manuel de Barros (O Livro sobre Nada), “Há histórias tão verdadeiras que às vezes parecem que são inventadas”.

Dizendo isso, e quando nos deixa, prefiro começar pelo começo.

• Marcos Vilaça nasceu em Limoeiro e em Nazaré da Mata, ao mesmo tempo, isso não se discute. Prova de que já pode ser considerado uma espécie de Deus, por ter o dom da ubiquidade. O de estar em dois lugares, ou mais, ao mesmo tempo. Faltando só descobrir a palavra para dizer o que ele é. Talvez Nazareiro. Ou Limomata. Ou coisa parecida.

• Consta que Vilaça falou das duas cidades, e de sua companheira de antes e depois da eternidade, a Ledo Ivo. Dizendo assim: “Amar cidades, várias./ Amar mulheres, só uma”. Maria do Carmo, claro. Mas Ledo se atrapalhou e escreveu (em Recife): “Amar mulheres, várias./ Amar cidades, só uma, Recife”. Acontece.

• Marcos era filho de dona Evalda. Uma dama letrada e ilustre que gostava de usar, quando podia (e era quase sempre), a palavra pletórico. Sem restrições. E muito corretamente. Que de dona Evalda se pode dizer, sem medo de errar, ser mesmo pletórica em tudo.

• E filho do professor Antônio Vilaça. Conta-se que ele, então seminarista, acabou vizinho de dona Evalda em Limoeiro. “O pecado mora ao lado”, como na peça de George Axelrod. Ela jovem, bela, e muito interessada no conversar dele. Dando-se que o professor desistiu ligeiro das vocações religiosas. Trocando a contemplação celeste por uma vida terrena plena. De virtudes e pecados. Muitas e poucos. Entre estes, o de falsificar whisky. Trocando os líquidos (vi com os próprios olhos, como fazia). O que lhe permitia saborear malte escocês transladado para garrafas de Drurys; enquanto seus convidados, coitados, aceitavam as ofertas de Johnnie Walker, em garrafas antes vazias, e agora cheias do líquido nacional. As aparências enganam.

• Já no batismo, seus pais fizeram questão de afirmar o caráter do filho. Marcos Vinicius Rodrigues, como se vê no próprio nome, é um homem plural. E Vilaça, também se vê no nome, é singular. Plural e singular, pois. Múltiplo.

• Vilaça teve, nessa vida, uma trajetória improvável. Que começou nos interiores de nosso Brasil, popular e profundo, para findar em louros acadêmicos. Na Academia Pernambucana de Letras. Na Academia Brasileira de Letras, também. A do fardão majestático. Conta-se até que um taxista, conduzindo Aurélio Buarque de Holanda todo paramentado, não se conteve e perguntou: “Sois Rei?”. Sem esquecer a Academia Portuguesa de Letras. Somos confrades em todas elas; o que, para mim, é um (grande) prêmio.

• Lembro de bilhete que lhe mandei num aniversário do passado:

Vilaça amigo
Ouve o que digo
Tô com saudade
Da mocidade
Da vida rude
Da juventude
Da vida boa
De andar à toa
E da maçada
De fazer nada
Com a indolência
A impertinência
A competência
E a experiência
Dos desenganos
Dos verdes anos.

• Agora findaram seus anos, todos; aqueles do passado, verdes; e os mais recentes, maduros, também. O coração dói, na memória do amigo querido. Saudades dele. Viva Vilaça!!!. E boa maneira de fazer isso é lembrar versos de Mia Couto (em Incertidão de Óbito),

“A vida
É um prematuro sonho.

Só morre
Quem nunca viveu”.

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