Opinião | Notícia

Adriano Oliveira: Frei Gilson e a miopia da esquerda

O que a esquerda propõe hoje? Nada. Insiste no identitarismo. Qualifico esta esquerda como míope. Confira o artigo completo de Adriano Oliveira

Por ADRIANO OLIVEIRA Publicado em 16/03/2025 às 9:02

Na década de 80, durante a transição do período militar para a democracia, a esquerda brasileira tinha duas pautas:

  • 1) Abertura democrática;
  • 2) Fortalecimento do Estado para combater a desigualdade social.

Ambos foram conquistados. Apesar de a esquerda não reconhecer, FHC foi o presidente da República que deu início À agenda da esquerda no Brasil. Injustamente, o líder do PSDB, era definido como neoliberal.

Em 2002, Lula assume a presidência da República. Para a esquerda, lá estava o seu verdadeiro representante. Lula não abandonou as premissas econômicas do governo FHC, como responsabilidade fiscal e controle da inflação. Fazendo jus a fama de ser um político da esquerda, a principal liderança do PT criou meritório Estado de bem-estar social.

Após as eras Lula, a esquerda perdeu rumo. A luta pela democracia e efetivo Estado de bem-estar social já estavam superados, pois foram conquistados. No ano de 2014, a esquerda, em especial o PT, foi atingida pela Lava Jato, e adquiriu fama de corrupta.

Com o impeachment da presidente Dilma em 2016, o lulismo e o PT, sustentáculos da esquerda, entram em declínio. Na eleição de 2018, a esquerda, em razãodo lulismo, mostra força, mas perde a eleição para Jair Bolsonaro, considerado de direita. Uma observação: Bolsonaro é um ator político da direita não democrática.

Com a perda de rumo, a esquerda optou pela pauta identitária, assim como a direita bolsonarizada. Ambos, importante salientar, são identitários, e, por consequência, excludentes.

O identitarismo possibilita a exclusão do outro. Ele não convive com as diferenças e, infelizmente, às vezes, observamos a intolerância. Esclareço que o identitarismo da direita ganha tração em virtude do bolsonarismo e do identitarismo da esquerda.

O que a esquerda propõe hoje? Nada. Insiste no identitarismo. Qualifico esta esquerda como míope. Ou seja: Não consegue enxergar as novas demandas do novo Brasil e por falta de compreensão sociológica da dinâmica social contribui para o enfraquecimento eleitoral do lulismo. Ressalto que o lulismo não é fenômeno identitário. Ele é manifestação econômica e democrática.
No ano de 2018, ocorreu a manifestação EleNão contra Jair Bolsonaro

Acreditei que ela poderia barrar a vitória de Jair Bolsonaro. Mas a direita bolsonarista, sábia, vale salientar. transformou a manifestação da esquerda em instrumento para a vitória de Jair Bolsonaro. Importante destacar que apesar de reconhecer limites de sabedoria em Jair Bolsonaro, ele descobriu que num país majoritariamente cristãoe católico, e sem perder de vista os evangélicos, era necessário jogar a esquerda para o inferno. Bolsonaro foi batizado no Rio Jordão em 15 de maio de 2016.

Os evangélicos e a derrota do lulismo

Nas últimas eleições presidenciais, os evangélicos ganharam destaque em virtude de serem os responsáveis pela derrota do lulismo em 2018 e pelo excelente desempenho eleitoral do bolsonarismo.

Desde 2018, grande parte dos evangélicos deixa claro reprovações à agenda da esquerda. O presidente Lula tem hoje alta reprovação entre os evangélicos. A esquerda míope ainda não descobriu que os evangélicos importam para vencer eleições presidenciais.

Os católicos também importam e contribuíram para a volta de Lula à presidência da República. Mas, a esquerda míope decidiu criticar o maior fenômeno contemporâneo do catolicismo: Frei Gilson. Segundo a esquerda míope, e não quero ser generalista, este católico que tem milhões de seguidores nas redes sociais, é conservador e bolsonarista.

Em vez da esquerda míope se aliar a Frei Gilson, optou por colocá-lo no debate identitário, o qual enfraquece eleitoralmente o lulismo. Por sua vez, Jair Bolsonaro e vários atores da direita bolsonarizada optaram por defender o Frei Gilson e disseminar que a esquerda é anticristã.

No mundo do século XXI, o identitarismo está presente em qualquer lugar, assim como pautas religiosas. Diante desta realidade, como lidar com ela? O enfrentamento às identidades e as crenças contrárias não é a melhor estratégia para a esquerda.

A esquerda perde fôlego ao optar pelo confronto. O melhor para a esquerda brasileira é repetir o lulismo das suas eras passadas: prover bem-estar econômico e resolver os problemas do dia a dia da população brasileira.

*Adriano Oliveira, Cientista Político. Professor da UFPE. Fundador da Cenário Inteligência: Pesquisa qualitativa & Estratégia

Compartilhe