Gustavo Henrique: carta ao jovem advogado
O advogado é, necessariamente, uma consciência escrupulosa ao serviço tão só dos interesses da justiça''. Encontre na Advocacia realização

Foi aberto no Plenário do STF o novo ano judiciário. De carona nesse momento único, proponho a você que reflita sobre o que enfatizou certa vez Huxley: que a experiência não é o que acontece com o homem, mas o que o homem faz com o que lhe acontece.
Dê razão a Huxley, para começo de conversa. A seguir, prosseguindo em modus de reflexão, percorra os dez itens abaixo. São todos singelos, porém, altamente consequenciais.
Dez itens que um jovem advogado não pode esquecer
- Envolva-se pela vocação de advogar. Não se aninhe na profissão apenas pela ambição da riqueza material. Como já advertiu Augusto Cury, não seja daqueles tão pobres que só têm dinheiro, nem dos tão incultos que só têm conhecimento acadêmico. Não apequene a Advocacia a uma vitrine ou a um palco, sobretudo nas redes sociais. Aprenda a se fazer notar.
- Atue sempre para que a força do argumento seja mais importante que o argumento da força. Aprenda a persuadir. Domine a arte do convencimento.
- Torne-se "cidadão" em plenitude. Seja solidário, cultive a empatia, e entenda que por trás das leis e dos prédios imponentes da Justiça existem dramas, esperanças, angústias e sonhos. Entenda, ainda, nessa caminhada, que a descredibilização da Justiça - que não existe para vencer competição de popularidade - será sempre um veneno para o interesse público.
- Aja com Ética. Compreenda que a educação abre caminhos, mas que é ela, a Ética, quem aponta a direção. Não semeie a dificuldade para colher a facilidade. Não venda ilusão, nem prometa êxito. Trate com transparência, lealdade e honestidade cada sujeito da dinâmica jurídica. Não tome atalhos.
- Tenha maturidade. Não eleja vilões para o seu eventual insucesso naquela causa. Diante da divergência quanto à solução dada ao caso, não dê de ombros. Recorra. Não desista, nem terceirize a responsabilidade. Aprimore o argumento. Refine a abordagem. Seja seu próprio coach.
- Cumpra à risca o juramento do artigo 20 do Regulamento Geral da Lei 8.906. Ali não repousam palavras sem alma. Seu conjunto traz significado profundo. Vá além da defesa de quem lhe contratou. Seja exemplo permanente.
- Não desacredite da Justiça. As páginas da Constituição que nos governa desde o ano de 1988 não formam um bloco de papéis para se usar como borrão. Nesse sentido, recuse teses que neguem o receituário democrático (suposto poder moderador das Forças Armadas, devassabilidade da urna eletrônica, anistia para quem se envolve em tentativa de golpe de Estado etc).
- Entenda que, no Direito, os fins não justificam os meios para o que pode vir a custar amanhã a liberdade humana. Inexiste culpabilidade por responsabilidade objetiva ou eliminação de hipóteses. Entre punir o inocente e absolver o culpado, que predomine em você a alternativa da real dignidade.
- Conheça bem a história da profissão que adotou para si, seus principais personagens e suas lutas. Não se deixe impressionar pelos que só sabem se exibir com seus ternos bem cortados ou suas bolsas de grife importadas. Leia os bons livros, a começar pelos clássicos. Sobrando tempo, leia sobre Direito. Vacine-se contra a desinformação e o obscurantismo. Eduque-se com os mestres.
- Entenda que a Advocacia é resistência, sobretudo, nos períodos críticos e de instabilidade social. Conscientize-se de que os Advogados estão sempre entre os primeiros alvos das tiranias. Diante dos percalços da democracia, nunca solte a mão dela. Abra os olhos.
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Daí, mais na frente, ao concluir sua pausa meditativa, encontre conforto na lição atemporal de Sobral Pinto, o maior dos Advogados, católico anticomunista e ao mesmo tempo defensor incansável de presos e perseguidos políticos, quando disse:
"A advocacia não se destina à defesa de quaisquer interesses. Não basta a amizade ou honorários de vulto para que um advogado se sinta justificado diante de sua consciência pelo patrocínio de uma causa. (...) O advogado não é, assim, um técnico às ordens desta ou daquela pessoa que se dispõe a comparecer à Justiça. (...) O advogado é, necessariamente, uma consciência escrupulosa ao serviço tão só dos interesses da justiça''. Encontre na Advocacia realização. Será ela a sua mais valiosa paga.
Gustavo Henrique de Brito Alves Freire, advogado