OPINIÃO | Notícia

Desaprovação de governantes é o padrão

Com efeito, numa amostra de 25 países (Morning Consult, apud Poder360, de 23/10/2024) a desaprovação dos governantes é maior que aprovação

Por Maurício Costa Romão Publicado em 06/12/2024 às 5:00

Os índices de aprovação do trabalho dos governantes variam de país para país, dependendo de fatores específicos como condição econômica, política, crises, “entregas”, liderança, entre outros. Índices elevados são raros e ocorrem em situações de excepcionalidade, como os que agraciaram o presidente americano, George W. Bush, com 90,0% de aprovação em momento de solidariedade nacional, após os ataques de 11 de setembro de 2001. Mas o padrão médio de aprovação do trabalho dos incumbentes em ciclos presidenciais em geral está longe de atingir tal patamar.

Com efeito, numa amostra de 25 países (Morning Consult, apud Poder360, de 23/10/2024) a desaprovação dos governantes é maior que aprovação em 78% dos países, com médias respectivas de 51,8% e 38,0%. Já em levantamento de novembro da CB Consultora em 10 países da América do Sul, a desaprovação supera a aprovação em 70% dos casos, com médias de 40,4% e 56,7%, em respectivo.

Neste último levantamento, entre os três presidentes com governos aprovados, a diferença média entre aprovação e desaprovação é de 3,4 pontos de percentagem, e o índice de aprovação consignado ao líder do ranking é de apenas 51,5%. Noutro dizer, mesmo onde os mandatários são aprovados, as populações desses países estão praticamente divididas: metade aprova e metade desaprova os respectivos governantes.

Ainda que à míngua de evidências empíricas mais amplas, é lícito prospectar que o padrão universal do mundo contemporâneo é aproximadamente esse retratado acima: prepondera a desaprovação de governantes e naqueles países onde se der o contrário isso acontecer por poucos pontos percentuais acima dos 50%.
A questão que se impõe é por que nos tempos atuais as sociedades são tão críticas ao desempenho de seus governantes?

Não há resposta simples para essa indagação, face aos contextos sociais, econômicos e políticos de cada país. Entretanto, apenas à guisa de mera delibação, pode-se listar alguns fatores de influência:

(1) a crise na democracia liberal causada pelo crescente hiato de representação tem levado as instituições e o modelo de governança ao descrédito. Envolta nessa névoa de desconfiança, a população se torna mais crítica e menos benevolente com governos e incumbentes.

(2) o acirramento das visões polarizadas geram bolhas ideológicas apartadas e diálogo interditado. A avaliação de governos e aprovação de trabalho dos governantes tendem a ser menos consensual, refletindo muito mais as manifestações predominantes dos próprios bandos, com pouco espaço para conquista de aderentes no lado opositor.

(3) há múltiplas questões permeando o dia a dia da sociedade moderna: economia, meio ambiente, direitos civis, gênero, geopolítica, raça, etc. No âmbito desse caleidoscópio temático, o indivíduo tende a dar relevância àquelas questões que lhe parecem mais essenciais para o seu dia a dia, julgando o desempenho do incumbente pelo atendimento de suas aspirações seletivas.

(4) em tempos de ruptura tecnológica a internet e as redes socies levam o indivíduo a assumir a centralidade das comunicações, dispensando intermediações institucionais. Imperam a informação direta, horizontalizada e a sacralidade da visão de mundo do indivíduo. Nesses ambientes de virtualidade, de exigência de consonância cognitiva entre emissores e receptores de mensagens, a apreciação dos governantes se torna mais rigorosa.

(5) as posições e manifestações das pessoas quanto à religião, desigualdade, temas sociais e comportamentais, etc., tendem a exacerbar tensões na coletividade, separando os indivíduos e reduzindo espaços para a argumentação e o convencimento lógico. Em tal contexto, de certa calcificação do estado mental do indivíduo, a faixa da população passível de conquista por iniciativas, ações ou narrativas governamentais é bastante estreita.

Em síntese, na maioria dos países do mundo moderno predomina a desaprovação popular ao trabalho dos governantes e mesmo onde a aprovação supera a desaprovação, os índices mostram-se apenas uns poucos pontos percentuais acima do seu oposto, retratando sociedades literalmente divididas no apoio aos seus mandatários. O fenômeno sugere que hoje em dia a sociedade vê governos e incumbentes por uma ótica bem rígida de julgamento, quando auscultada sobre o atendimento de suas expectativas.

Maurício Costa Romão é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. mauricio-romao@uol.com.br

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