Pela dignidade remuneratória dos operadores do Direito
O Brasil precisa, na verdade, cortar gastos desnecessários, como já está sendo realizado e recomendado pela equipe econômica......

O operador do Direito tem o papel de defender o Direito e a Justiça, zelando para que se cumpra a função social das leis e o respeito aos Direitos Humanos. Conhecedores das leis, artigos e códigos, esses profissionais precisam ter a consciência de que são instrumentos do poder e de transformação da sociedade e, portanto, ter clareza da importância do seu papel, consciência ética e moral e imparcialidade.
Considerando que o processo de socialização é fundamental para a construção de uma sociedade e que o Direito contribui para o fortalecimento da compreensão e entendimento dos valores morais da sociedade - já que é por meio dele que esses valores são esclarecidos e detalhados -, o Direito tem influência em educar e moldar opiniões e condutas individuais.
As transformações que ocorrem na sociedade, apesar de levarem um certo tempo para serem absorvidas, acabam sendo submetidas ao ordenamento jurídico. O Direito reconhece, direciona e consolida boa parte dessas mudanças. Então, o poder que é conferido aos operadores do direito é ferramenta de grande valor para uma sociedade mais equilibrada e justa, contribuindo para a manutenção da paz, da ordem, da segurança e do bem-estar comum, tornando possível a convivência e o progresso social.
Para desempenhar papel de tal responsabilidade, eles precisam estar bem preparados e serem bem remunerados. Por isso, é importante observar com bons olhos o que traz a PEC 10/2023, chamada de PEC do Quinquênio, aprovada em abril pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que se encontra em tramitação no Senado. O texto prevê o pagamento de uma parcela compensatória mensal de valorização por tempo de serviço de servidores públicos da carreira jurídica, como juízes e promotores, um benefício equivalente a 5% do subsídio a cada cinco anos de efetivo exercício em atividade jurídica.
O impacto da PEC do Quinquênio sobre as despesas remuneratórias de servidores públicos está dividindo opiniões entre juristas e parlamentares. Um relatório da Instituição Fiscal Independente, órgão vinculado ao Senado Federal, criada com o objetivo de aumentar a transparência das contas públicas do país, chamou atenção para dois cenários. O primeiro considera o pagamento do quinquênio apenas para membros do Poder Judiciário e do Ministério Público (MP), como previa o texto original da PEC 10/2023. Neste caso, o acréscimo sobre despesas remuneratórias seria de R$ 5,2 bilhões por ano, levando em conta pagamentos a servidores ativos e aposentados e a pensionistas.
O segundo cenário apontado pelo órgão considera outras 13 carreiras incluídas na PEC 10/2023, que abrange defensores públicos, auditores fiscais do Trabalho, auditores fiscais e técnicos da Receita Federal, fiscais de tributos, policiais civis, federais, rodoviários federais e legislativos, advogados da União, militares estaduais, oficiais de Justiça e membros de Tribunais de Contas. Nesse segundo cenário, o valor chegaria a R$ 42 bilhões anuais.
O impacto há de ser considerado, mas novas alternativas estão surgindo, como a possibilidade apontada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, de condicionar a aprovação da PEC à aprovação do projeto que acaba com os supersalários no serviço público, o que, segundo ele, acarretará economia de gasto público, e não o contrário.
A questão está posta e precisa ser debatida. O que não podemos perder de vista é que a dignidade remuneratória dos operadores do direito não pode ser colocada em xeque em detrimento dos estouros do orçamento do país. O Brasil precisa, na verdade, cortar gastos desnecessários, como já está sendo realizado e recomendado pela equipe econômica, e não penalizar servidores de quaisquer áreas, inclusive do Judiciário.
Reinaldo Gueiros, advogado e procurador federal