
O tempo, a cada geração, vai tecendo novos paradigmas à sociedade, notadamente quando a tecnologia passa a ser uma indutora do desenvolvimento, dos usos e costumes.
As avós de hoje já não são aquelas da cadeira de balanço, do croché e de óculos na ponta do nariz. Nem o avô fica distanciado das brincadeiras dos pimpolhos. Paparicar os netos já não se insere no cotidiano entre avós e netos, mas a carga de afeto é grande. Somente sendo avô/avó é que se sabe quão sublime é esse amor, uma cumplicidade de ternura e de carinhos.
A minha geração nasceu e cresceu num contexto de uma educação rígida, de muita obediência e respeito aos pais. Depois, veio a nova geração, formada por filhos desses meus contemporâneos. Em contraponto à rigidez, fomos pais e mães de maior diálogo e de muita abertura à rotina dos nossos filhos, estes sempre afetivamente instados, pelos colegas, às festinhas, aos bares que surgiram em demasia, às boates, enfim, à vida profana.
Dos nossos filhos, vieram os netos. Estes nos devolvendo os longes da infância, fazendo-nos crianças no amor incomensurável e, antes, inimaginável, a ponto de a escritora Lois Wyse ter exclamado: “Se eu soubesse o quão maravilhoso seria ter netos, eu os teria tido primeiro.” “O neto é, realmente, sangue do seu sangue, filho do filho, mais filho que o filho mesmo...”, exalta Rachel de Queiroz no seu poema “A Arte de ser avó”.
Ainda persiste, um pouco, a avó nos moldes de D. Benta do Sítio do Pica-Pau Amarelo, de Monteiro Lobato. Essa avó do sorriso fácil, da alegria contagiante, da candura ilimitada.
Há controvérsias entre educadores e psicólogos quanto à conduta dos avôs/avós. Uns defendem o avô-pai e avó-mãe, um e outro estabelecendo limites aos seus netos e às suas netas. Outros se contrapondo a essa postura sob a alegação de que aos pais incumbem a colocação dos limites, restando aos avôs/avós o lado dócil da vida.
Os avós, por seus carinhos e ternuras, pelas histórias que gostam de contar, passam a ser, na vida adulta dos netos e netas, doces recordações de suas infâncias.
O importante, pelo que penso, é que haja um diálogo permanente entre pais e avós, para o traçado de uma mediana nessa convivência entre as três gerações. Aos pais, sem dúvida, a tarefa de colocar limites, uma tese da maioria dos educadores, ênfase para Tania Zagury, que escreveu um notável livro sobre o assunto.
Aos avôs e às avós não pode faltar o carinho, que é o leite da ternura humana. As crianças, quando recebem um bulbo de pressão dos pais, uma cultura do não, do ato de proibir, precisam experimentar alegria em visitar os avôs/avós, pois lá elas se acham num espaço de convivência mais leve, mais ameno, sem as amarras naturais à casa dos pais.
Volto a Rachel de Queiroz: “Sim, tenho certeza de que a vida nos dá netos / para nos compensar de todas as perdas trazidas pela velhice. / São amores novos, profundos e felizes, que / vêm ocupar aquele lugar vazio, nostálgico, / deixado pelos arroubos juvenis. / É quando vai embalar o menino e ele, tonto de sono, abre o olho e diz: / Vó, seu coração estala de felicidade, como pão no forno.”
Os nossos corações, o meu e o de Elaine, leitor/a, estalam sempre diante de cinco netinhos: Mariana (Mari), Marcela (Mama), Rafaela (Rafa), Maria Luíza (Malu) e Filipe (Lipe), aquecidos no forno do amor e da felicidade.
Roberto Pereira, ex-secretário de Educação e Cultura de Pernambuco.
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