Ressurreição e Esperança
A Semana Santa foi vivida sob o signo das dores, mas também sob o manto luminoso da esperança proclamada pelo Jubileu Santo convocado pelo papa
PEDRO FERREIRA DE LIMA FILHO
A Semana Santa de 2025 foi vivida sob o signo das dores do mundo, mas também sob o manto luminoso da esperança proclamada pelo Jubileu Santo convocado pelo Papa Francisco. Em meio às guerras que devastam povos, às doenças que silenciam vidas e às desigualdades crescentes, a memória da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo ganha força profética. “Cristo, nossa esperança, ressuscitou!” (1Cor 15,20) ecoou como grito de vida diante da cultura da morte.
Neste ano litúrgico, os evangelhos, sobretudo os relatos de João e Marcos, nos apresentam um Jesus que sofre as injustiças humanas e carrega as cruzes de todos os tempos. O “Servo Sofredor” de Isaías (Is 53) se faz presente nas trincheiras da Ucrânia, nas ruínas de Gaza, nas periferias brasileiras e nos hospitais. A Semana Santa reflete as dores da humanidade e denuncia estruturas que continuam crucificando os inocentes.
Ainda assim, ela é anúncio de renovação. O Papa Francisco, ao convocar o Jubileu da Esperança, semeou desde 2024 um caminho de reconstrução. O Domingo de Ramos deste ano será marcado por clamores pela paz, enquanto a Missa Crismal nas dioceses reafirmará o papel da Igreja como espaço de cura e reconciliação. “Curai os enfermos que nela houver e dizei-lhes: O Reino de Deus está próximo” (Lc 10,9) tornou-se apelo direto ao nosso tempo.
O Jubileu dos Enfermos, parte deste itinerário jubilar, destacou a figura do Ressuscitado que mostra as chagas, ou seja, marcas não ocultadas, mas transformadas em sinais de glória. Nos leitos dos hospitais, entre idosos solitários e jovens abatidos pela depressão, resplandece o Cristo vencedor da morte. As mulheres que foram ao túmulo vazio (cf. Mc 16,1-8) se refletem hoje nas cuidadoras que enfrentam o sofrimento com coragem e ternura.
O Tríduo Pascal trouxe, em 2025, um sentido profundamente encarnado nas lutas dos povos. A Quinta-feira Santa, com o gesto do Lava-Pés, revela o serviço como caminho de justiça. Jesus se abaixa até mesmo diante de Judas (cf. Jo 13), contrastando com os que, como Pilatos, lavam as mãos. Já a Sexta-feira Santa nos confronta com a adoração da cruz, isto é, símbolo da dor humana, da fome, da exclusão, das guerras, do abandono. “Verdadeiramente, este homem era o Filho de Deus” (Mc 15,39), reconhece o centurião, voz de tantas consciências despertas.
O Sábado Santo, com seu silêncio denso, representa a espera dos povos por justiça e libertação. Maria, a Mãe das Dores, permanece firme como as mães que hoje sofrem pela perda de filhos nas violências sociais. O sepulcro escuro não é derrota, mas o espaço em que Deus gera a novidade. “Se com Ele morremos, com Ele também viveremos” (2Tm 2,11) é promessa que sustenta a resistência silenciosa dos que esperam.
As profetisas da Bíblia, como Ana (Lc 2,36-38) e Débora (Jz 4), inspiram a ação firme de tantas mulheres que lideram comunidades, movimentos e ações de cuidado. Elas não apenas consolam, mas denunciam e anunciam. A Ressurreição é transformação: “Ele não está aqui, ressuscitou!” (Mt 28,6), em outras palavras não é apenas notícia, mas convocação à saída de nossos túmulos existenciais.
No Brasil, os gritos da população ecoaram durante toda a Semana Santa. A fome, o desmonte dos serviços públicos, o racismo estrutural e a violência são cruzes diárias. Mas também foram sinais de resistência: as encenações da Paixão, realizadas em muitas periferias, tornaram-se catequese viva. O Cristo que cai sob o peso da cruz se identifica com o povo sofrido, mas também com sua capacidade de se levantar.
No cenário global, a persistência dos conflitos revela a falência de modelos que desprezam a dignidade humana. O Domingo da Ressurreição de 2025 não será apenas uma data litúrgica, mas uma convocação ética e de fé ativa. A pedra foi removida não apenas do túmulo, mas dos corações endurecidos. A luz pascal transforma o olhar sobre a dor e nos convida a ser promotores da vida e da paz.
Viver a Páscoa é assumir um caminho profético. À semelhança dos grandes anunciadores bíblicos, somos chamados a denunciar as injustiças e testemunhar a vida nova. Que o Cristo ressuscitado nos arraste para fora da inércia e nos envie ao mundo com compromisso renovado. “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11,25) e essa vida, em 2025, clama por ação concreta urgentemente por meio do método ver, julgar, agir, celebrar e avaliar um modelo de análise e ação que orienta a pastoral na América Latina e porque não dizer no mundo!
Pedro Ferreira de Lima Filho é articulista, fiósofo, pedagogo e teólogo. E-mail: filho9@icloud.com