
Em Pernambuco, a prisão de um devedor de pensão alimentícia está temporariamente suspensa enquanto durar a pandemia do novo coronavírus. A decisão, proferida em segunda instância na última quinta-feira (2) e divulgada na terça (7), foi mantida pelo desembargador Jones Figueirêdo, da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE).
A pensão alimentícia, quantia fixada pelo juiz a ser atendida para manutenção dos filhos em caso de divórcio entre os pais, dever ser paga mensalmente. No entanto, quando isso não ocorre, o indivíduo recebe ordem de prisão civil e deve permanecer recluso por um período determinado pela justiça. Mas, segundo o tribunal, este mandado de prisão só poderá ser expedido após o período de isolamento social.
De acordo com o TJPE, a decisão tomada leva em consideração as diversas recomendações feitas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que orientou os Tribunais e magistrados a adotarem medidas eficazes de prevenção à proliferação da covid-19 no sistema prisional. Com isso, o cumprimento da prisão por falta do pagamento de pensão não poderá ocorrer até que a pandemia causada pelo vírus acabe.
Para Jones Figuerêdo, a decisão é legal e bem fundamentada. O magistrado acredita que a suspensão temporária neste tipo de prisão é a medida mais adequada levando em consideração o período em que o mundo inteiro enfrenta uma de suas maiores crises sanitárias. Além disso, ele acredita que tal suspensão pode ainda 'dar tempo' para o indivíduo quitar seu débito, sem precisar, necessariamente, ser preso.
"Considerando que a expedição do mandado de prisão ficará suspenso, terá o agravante algum tempo para tentar saldar o débito antes do cumprimento do mandado”, pontuou Jones Figueirêdo em sua decisão.
Na prática
Se um indivíduo está devendo pensão, mesmo com a chegada da pandemia do novo coronavírus ele permanece sendo obrigado a quitar o débito. Caso este pagamento não seja feito, o credor pode cobrar na Justiça, na chamada Execução de Alimentos, a prisão deste devedor. Já no início da pandemia, o CNJ recomendou que prisões no regime domiciliar fossem decretadas nestes casos, de forma a não colocar em risco a saúde do devedor.
No entanto, de acordo com o advogado Glauber Salomão, doutor em Direito Civil, em casos de dívida por pensão alimentícia, a prisão em regime domiciliar pode não alcançar o impacto desejado.
"O sentido dessa prisão não é penal, é uma prisão ligada ao direito civil. A intenção dela não é de punir, como por exemplo a prisão de alguém que cometeu um homicídio. A prisão de um devedor de alimentos acontece mais para constranger a pessoa a pagar o que deve, ou seja, a pessoa quando sabe que pode ser presa acaba dando um jeito de pagar o que deve. E é essa a ideia da prisão civil. Mas se a pessoa está devendo e sabe que não vai ser presa em regime fechado, a probabilidade dela correr atrás desse dinheiro é muito pequena", explicou Glauber, que também é especialista em Direito da Família.
Em junho, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) mudou o cenário e decidiu que a prisão em regime fechado seria mantida, só que agora, seu cumprimento seria suspenso. Logo após essa decisão, uma nova lei federal passou a vigorar.
Aprovada pelo congresso e sancionada pelo presidente em 12 de junho, a chamada 'Lei da Pandemia' foi editada em regime transitório e emergencial para eleger algumas questões nesse período de crise sanitária. Este documento definiu que prisões por dívidas de alimentos devem ser cumpridas em regime domiciliar até 30 de outubro deste ano. O objetivo é não colocar a saúde do devedor em risco, encarcerando-o.
"A ideia é preservar a saúde do devedor, e é também uma questão de interesse coletivo porque teoricamente essa pessoa que cumprisse uma prisão dessas em regime fechado, sairia. Então o risco dela trazer o vírus pra fora seria considerável", disse Glauber.
Para o advogado, a recente decisão do TJPE em apenas suspender as prisões em regime fechado, sem recorrer ao regime domiciliar, é a mais coerente com o atual momento. Glauber também acredita que, deste modo, a Lei da Pandemia esteja sendo assegurada, já que o devedor não está sendo posto em cárcere durante o período pandêmico.
"Acredito que a melhor solução realmente seja a de suspender os mandados de prisão. Esse entendimento de suspender o cumprimento é mais acertado e razoável, porque na prática não contradiz a lei. Porque o que a lei determina é de não encarcerar esse devedor agora por conta do risco da covid-19. Quando o TJPE determina que vai manter o regime fechado mas vai suspender a execução e o cumprimento, na prática significa que o sentido da lei está sendo cumprido, porque, de fato, esse devedor não vai ser colocado na prisão agora, mas depois".
Regime domiciliar x Suspensão da prisão em regime fechado
Quando o indivíduo, devedor da pensão alimentícia, tem a prisão em regime fechado decretada, mas o mandado fica suspenso, o que acontece é que, enquanto durar a pandemia, ele fica livre. No entanto, assim que a crise for superada, esse mandado será cumprido. Já na prisão em regime domiciliar, o mandado é cumprido imediatamente, e a prisão acontece de uma forma mais cômoda, já que o indivíduo permanece em casa e sem a possibilidade de entrar, em algum momento, no regime fechado.
O advogado acredita que o principal objetivo da suspensão é equilibrar os direitos entre devedor e credor. "A questão central da suspensão da prisão em regime fechado é de equilibrar melhor essa proteção do devedor da pensão, protegendo também o credor. O fato é que, ao mesmo tempo em que precisa existir essa preocupação com o devedor e com sua saúde, o pagamento da dívida precisa ser feito e a Justiça deve agir de forma a estimular isso. Alimentos dizem respeito a uma verba fundamental pra quem recebe, então não dá pra afrouxar demais e deixar quem recebe a pensão em uma situação delicada", completou o especialista.
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