
“Um original de Evaldo Gouveia e Jair Amorim”, era como os locutores de rádio anunciavam a execução de mais um sucesso da dupla, que legou dezenas de clássicos à música popular brasileira. O capixaba Jair Amorim faleceu em 1993, o cearense Evaldo Gouveia, teve a morte anunciada nessa sexta-feira, em consequência da covid-19. Ele já se encontrava debilitado, internado, num hospital em Fortaleza, por causa de um AVC, sofrido em 2017. Evaldo Gouveia de Oliveira,nascido em Orós, CE) completaria 92 anos em 8 de agosto de 2020.
Recebeu pouco espaço na imprensa, para a quantidade de sucessos que emplacou ao longo de uma carreira iniciada nos anos 40, em Fortaleza, em programas de calouro, e no Trio Nagô, com Mário Alves e Epaminondas Souza. Numa em que os trios proliferavam pelo país, o Trio Nagô foi o mais longevo e bem sucedido. Primeiro na capital do Ceará, depois em São Paulo e finalmente no Rio, no elenco da Rádio Nacional, que abrigava os mais importantes nomes da música de sua época.
Nos necrológios de Evaldo Gouveia a música mais lembrada dele foi Sentimental Demais, parceria com Jair Amorim, que consolidou a carreira de Altemar Dutra, há 55 anos. Um bolero que teve uma série interminável de regravações. No entanto, foi só mais um dos sucessos de Evaldo, com parceiro ou sozinho. Ele continuou em evidência como autor até os anos 70. Curioso é que a sua veia de compositor se manteve pouco ativa até 1959, quando passou a criar música compulsivamente. Mas já em 1958, ele compôs um clássico gravado no mesmo ano por Nelson Gonçalves e Carlos José, o fox Deixa Que Ela Se Vá (com Gilberto Ferraz).
Até o advento da música do autor como seu próprio intérprete, a partir dos festivais da MPB, quando uma composição fazia sucesso, imediatamente as gravadoras sugeriam aos seus contratados que a gravasse. Alguém me Disse, de 1960, lançado por Anísio Silva, teve várias gravações naquele ano. Cauby Peixoto e Maysa dois intérpretes que cantaram a música. Num tempo em que bossa nova trouxe uma harmonia e poética para a música brasileira, boleros e sambas-canção passaram a ser rotulados de démodé, ou seja, fora de moda,e depois cafona. O tropicalismo em 1968 derrubou a barreira entre o bom e mau gosto (embora ainda se pautando pela qualidade). Alguém me Disse seria regravada por Gal Costa 29 anos mais tarde. Seguiram-se os sucessos, O Trovador, Ninguém Chora Por Mim, Ave Maria dos Namorados, Poema do Olhar, E A Vida Continua, Canção Para Ninar Gente Grande (esta com Antonio Maria). Em 1962, ele foi eleito, pelos cronistas especializados do Rio, o Compositor do Ano. Em 1963, Mario Alves saiu do Trio Nagô para seguir carreira solo. O Trio Irakitan, que surgiu na cola do Trio Nagô, teve um entrevero entre seus integrantes, e Evaldo Gouveia e Epaminondas Souza passaram a fazer do Irakitan. Epaminondas mudou o nome para Décio (Amorim), e começou carreira solo, curiosamente, já que era dono de boa voz, só eventualmente como cantor. Dedicou-se a compor, tenha gravado discos solo (poucos), e fizesse shows pelo Brasil (houve um tempo em que costumava se apresentar com frequência no Recife).
Depois da Jovem bossa nova, da Jovem guarda, do tropicalismo, que mudou gostos dos consumidores de discos, Evaldo Gouveia foi o único a continuar a levar cantores às paradas, ao contrário de autores populares, feito ele, Adelino Moreira, Herivelto Martins, para citar dois dos mais bem sucedidos. Em 1973, Marlene, que já nadava meio esquecida, emplacou com a marcha rancho Bloco da Solidão. O parceiro Jair Amorim foi jornalista, presidente de entidades feito a UBC (União Brasileira de Compositores), o que suscitava que as músicas dos dois eram trabalhadas pela influência de Jair, o que nunca se provou.
SAMBA ENREDO
“Jair Amorim, presidente da União Brasileira de Compositores, capixaba como o Zuzuca do Salgueiro, olhos azuis, dignos de um estrangeiro no samba”, forma preconceituosa de criticar a vitória de Jair e Evaldo no carnaval carioca, escolhido como samba enredo do desfile da Portela em 1974, acolhidos na ala de compositores da escola. O samba O Mundo Melhor de Pixinguinha, levou uma nota dez da comissão julgadora do desfile, e se tornou um clássico do gênero. A dupla fez Tango para Tereza, sucesso com Ângela Maria, O Conde, com Jair Rodrigues, foram mais de 300 composições, pelo menos metade delas tocou muito no rádio.
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