covid-19

Ed O'Brien, da Radiohead, em disco de inspiração brasileira

O músico lança disco depois de se recuperar da covid-19

José Teles
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José Teles
Publicado em 21/04/2020 às 16:33 | Atualizado em 21/04/2020 às 16:36
DIVULGAÇÃO
Ed O'Brien, do Radiohead - FOTO: DIVULGAÇÃO

Em 2012, a Folha de São Paulo, em matéria de Thais Bilenky, anunciava que Ed O'Brien, guitarrista do Radioehad, estava morando no interior de São Paulo, lugar que escolheu para aguardar o fim do mundo, previsto para acontecer em 21 de dezembro (a matéria é do dia 12 daquele mês), conforme o calendário Maia. Oito mais tarde, na Inglaterra, O’Brien, escapou da previsão Maia, mas foi infectado pelo vírus que ameaça cumpri-la. Quer dizer, supõe ter sido infectado, porque sentiu sintomas, inclusive perda de paladar, mas não fez um teste para confirmar. Revelou que pegou o coronavírus no começo de março, recolheu-se, no interior do País de Gales, recuperou-se, e lançou um disco, no qual vinha trabalhando há oito anos, e que está bastante bem recebido. O título? Earth (Terra), creditado a EOB, com selo Capitol.
Ed O’Brien e a família voltariam ao seu Inglaterra, depois de morar pouco mais de um ano em São Luiz de Paraitinga, uma cidadezinha de dez mil habitantes, na região de Ubatuba, a 171 quilômetros de São Paulo. Em 2011, conta que para ver e-mail viajava meia hora até Ubatuba. Ele a família acostumaram a viver sem Internet, e sem celular. Os filhos estudaram numa escola local, e tiveram que aprender português. Vale lembrar que São Luiz de Paraitinga é uma estância turística, não é uma aldeia perdida no meio do nada, como a imprensa inglesa entendeu ao entrevistar o guitarrista.
O interesse de O’Brien pelo Brasil vem de antes. Em 2009, quando Radiohead fez show em São Paulo ele citou Jorge Benjor, Gal Costa, Mutantes e o Ira! entre suas preferência na música brasileira de que gostava. O que levou a Folha de SP a entrevistar o guitarrista Edgard Scandurra do Ira! sobre a citação. Provincianismo certamente. Scandurra não sabia muito do Radiohead. Tinha apenas um disco do grupo, o O.K Computer, tampouco foi ao show.
Quarto músico da Radiohead a lançar disco, apenas o baixista Phil Selway não lançou, Ed O’Brien foi bastante influenciado pelo curto tempo em que viveu no Brasil. Não pela música brasileira em si, mas pelo modo de vida dos brasileiros com quem conviveu. Claro, numa cidade pequena do interior de São Paulo, onde a qualidade de vida tem padrões bem acima do que ele encontraria se tivesse ido morar no interior de do Norte ou do Nordeste. A leveza, a falta de pressa, da cidade o levou a repensar seus hábitos londrinos:
“Quando me lembro daquele tempo, foi lindo. Nós não tínhamos TV, nem Internet. Levamos um bocado de DVDs, e a cada sábado, minha mulher eu assistíamos. Um amigo italiano nos deus doze dos seus DVDs favoritos, então vimos Fellini e um monte de filmes extraordinários, foi muito rico porque você começa a se dar atentar mais para a natureza, para o colorido das coisas”, comentou O’Brien em uma recente entrevista à revista GQ.
Merecia um relato mais longo, como uma cidade pequena no interior, conviveu com um integrante de umas das bandas mais importantes do rock do século 21. Ou como uma celebridade com quase dois metros de altura, por sua vez, conviveu com os muitos turistas que visitam São Luiz de Piraitinga.
COLORIDO
Earth afasta-se do dons tons em cinza da música do Radiohead, na verdade a música de Thom Yorke, e faz um disco ensolarado, na medida em que um inglês, nascido em Oxford, de uma banda no estilo da em que toca consegue. O disco é menos introspectivo, mas tem seus momentos Radiohead, feito na faixa Mass. O primeiro single chamou-se Brasil, mas a faixa em que ele mais se aproxima dos ritmos brasileiros é em Banksters, com uma batida quebrada de samba. Um samba progressivo, mais apropriada para single do que a citada Brasil que, curiosamente, na letra, parece ter sido inspirada pela covid-19, ou composta por alguém que a teve: ”Este sonho ruim me pegou/Estou caindo, caindo/ele está em mim/está em você/(...) acabou/não se pode culpar ninguém/e não existe medo agora”. Uma das faixas de Earth que caberia num disco do Radiohead.
Para usar um palavra em moda, o espectro do guitarrista é bem amplo, na faixa Cloak of the Night, uma canção folk, ele soa um misto de Syd Barrett com os Beatles do álbum branco. Deep Days também tem um balanço latino (com trechos muito parecidos com It’s Too Late, de Carole King). Na sequência Long Time Coming lembra o folk agridoce de James Taylor.
Ed O’Brien está bem acompanhado neste álbum por Colin Greenwood, da Radiohead, Adrian Utley, do Portishead, do guitarrista David Okumu, do baixista Glenn Kotche, da Wilco. Com ele uma cozinha de virtuosos, a cozinha de luxo formada por pelo baixista Nathan West e o baterista Omar Hakim. A produção é de Mark Ellis, que assina como Flood, um dos mais requisitados de sua geração (ele nasceu em 1960). Laura Marling (que está com um ótimo disco novo) é a convidada de O’Brien, que também toca bateria e percussão. A bateria é seu primeiro instrumento, embora raramente a use na Radiohead.
Ed O’Brien lança disco numa época em que artistas de renome estão se guardando para quando o coronavírus for embora. O que é uma forma de pensar antigo. Afinal a grande maioria das pessoas hoje consome música pela Internet. Portanto, numa época de confinamento, é muito bem-vindo um disco com belas canções, que se equilibra bem entre o eletrônico e o acústico, de um integrante de um grupo que conciliou o status de cult com, relativa, popularidade.

 

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