TEATRO | Notícia

Classe artística critica aumento de locação e falta de critérios claros em nova gestão do Teatro Luiz Mendonça

Agentes também apontam falta de diálogo com a Prefeitura do Recife, que ainda é responsável por fiscalizar os serviços realizados no Dona Lindu

Por Laís Nascimento Publicado em 28/04/2025 às 13:43 | Atualizado em 28/04/2025 às 13:45

A possibilidade de aumento no valor pago para utilizar o Teatro Luiz Mendonça, no Parque Dona Lindu, Zona Sul do Recife, tem preocupado produtores culturais da cidade.

Após reunião realizada entre agentes culturais e a Viva Parques do Brasil, concessionária que venceu a licitação da Prefeitura do Recife e vai gerir quatro parques urbanos da cidade - dentre eles, o Dona Lindu -, os artistas levantaram questionamentos sobre o preço de locação do espaço e a falta de transparência a respeito da nova curadoria.

Para Cleison Ramos, mestre em Artes Cênicas e iluminador cênico, o medo também é resultado da falta de investimento em outros teatros da cidade.

“A gente tem uma carência bem perceptível que é a falta de espaços para o escoamento de produtos da cena pernambucana e com a mudança administrativa, que vai impactar nos usuários do Luiz Mendonça, a gente fica sem um espaço, que vai mudar sua forma de receber o trabalho das pessoas”, conta.

O iluminador cênico pontua, ainda, que a pauta - valor pago para a utilização do espaço - pode quadruplicar. De acordo com ele, antes da concessão, as companhias pagavam entre R$ 1,5 mil e R$ 2 mil e foi anunciado o novo valor de R$ 6 mil. Ramos comenta que a mudança pode levar à “inacessibilidade do teatro”.

Além disso, o agente cultural afirma que há falta de transparência da nova gestora dos parques sobre a curadoria. “O grande entendimento é que as coisas agora precisam ter um projeto e passar a atender à visão da nova gestão e do que ela quer para aquele espaço. Existe uma questão de pautas na cidade do Recife obscura, que ninguém sabe quem é favorecido ou não e quais são os critérios”, denuncia.

Divulgação
Viva Parques do Brasil está gerindo quatro parques urbanos do Recife, inclusive o Dona Lindu - Divulgação

A incerteza quanto aos critérios de curadoria também tem preocupado a diretora do estúdio de dança Sala Mourisca Fernanda Paulino.

Ela conta que a categoria se preocupa com a disseminação da arte para pessoas de todas as idades, a formação de crianças e jovens e, ainda, a geração de renda para os profissionais da categoria.

“Desde o ano passado, a classe de artistas e produtores culturais vem questionando o critério para distribuição de pautas nos teatros municipais. Falando do meu segmento, o espetáculo anual é um evento importante para geração de renda de uma cadeia produtiva da cultura: contratamos técnicos de iluminação, de som, costureiras, fotógrafos, maquiadores, cabeleireiros, artesãos e marceneiros”, explica.

Segundo a diretora, a Viva Parques do Brasil ainda não definiu o processo de distribuição de pautas, nem disponibilizou publicamente a plataforma, data ou modelo para que os projetos sejam enviados.

“O curador resumiu que os interessados devem enviar um projeto do espetáculo para análise e que ele poderia, eventualmente, dar sugestões sobre o mesmo para que se enquadre neste critério de qualidade, ou simplesmente recusar o projeto”, relatou.

Trabalho conjunto

ARTUR BORBA / JC IMAGEM
Gestor cultural da Viva Brasil explicou que proposta para o Teatro Luiz Mendonça é consolidar uma pauta ampla e diversa - ARTUR BORBA / JC IMAGEM

Em entrevista ao JC, o curador e gestor cultural da Viva Brasil Celso Curi explicou que a proposta da concessionária é consolidar uma pauta ampla, com diversidade artística e de públicos.

“A curadoria é provocada pelo artista e muitas vezes provoca o artista a mostrar essa provocação, é um trabalho conjunto. A ideia é ajudar um pensamento cultural da cidade e eu quero colaborar”, iniciou.

Segundo ele, o objetivo é ter, se possível, 90% de produção local no equipamento. “Recife é extremamente rica culturalmente e queremos transformar o Luiz Mendonça em um vetor, um espaço de agitação do pensamento e da cultura”, afirmou.

A respeito da curadoria, Curi explicou que as produções profissionais devem ser mais viabilizadas e, para que isso aconteça, serão promovidas formações, cursos e residências, para que o Teatro Luiz Mendonça deixe “de ser hospedagem artística para ser um vetor”.

“A gente tem recebido poucas propostas. Eu faço parte da classe e me assustei um pouco porque tinham poucos fazedores de cultura e mais pessoas interessadas na pauta do que no fazer arte. Eu esperava uma reunião para falar mais de conteúdo artístico”, pontuou.

Curi esclareceu, ainda, que a pauta não vai passar, necessariamente, para R$ 6 mil. De acordo com ele, o valor será negociável “desde que o projeto seja importante para a cidade ou para a produção cultural local”, sem mínimo ou limite. Inclusive, projetos podem ser subsidiados e a locação do espaço pode ser gratuita.

O curador também reforçou que o público “não pagará a conta” e o teatro vai receber eventos gratuitos. Além disso, a Prefeitura do Recife tem 15 dias reservados por ano para sua programação.

De acordo com a Viva Parques, a gestão tem realizado investimentos e intervenções emergenciais no espaço para garantir a segurança, conforto e técnica durante a realização de eventos e espetáculos. As intervenções devem ser feitas até o mês de julho.

Celso Curi adiantou que uma das propostas é um novo espaço no teatro, com capacidade entre 60 e 80 lugares, voltado para a experimentação ou pequenos formatos. Ele destacou que o objetivo é formar plateia no estado.

Ausência da Prefeitura do Recife

Outro problema apontado pelos agentes culturais é a falta de diálogo com a Prefeitura do Recife, que ainda é responsável por fiscalizar os serviços que estão sendo realizados nos parques concedidos.

“A Prefeitura do Recife não mediou nada, não consultou a classe artística e foi um pouco irresponsável conosco. O maior problema foi/é a prefeitura leiloar um teatro e prejudicar a classe artística como está acontecendo há meses”, afirmou Cleison Ramos.

O diretor, produtor cultural e membro do Conselho de Política Cultural do Recife, representando teatro e ópera, Oséas Borba reforçou: “Eu acho que a gestão do Recife pecou em não dialogar com a classe. O assunto da privatização, por exemplo, não passou pelo Conselho Municipal de Cultura, só quando foi concluída”.

A Prefeitura do Recife não enviou nota a respeito do caso. A gestão municipal segue sendo responsável por fiscalizar os serviços da Viva Parques pois, diferente da privatização, em um contrato de concessão a titularidade do equipamento não é transferida para o ente privado.

Compartilhe