'Podemos ressignificar o regional', diz Léo da Bodega, que mescla trap e cultura popular em 'Som das Ladeiras'
"Estamos conseguindo furar a bolha, pois temos mudado como projetamos nosso trabalho, mas Pernambuco é carente de estrutura e produtoras", diz artista

O trapper pernambucano Léo da Bodega surge cercado por "galeras", papangus, la ursas, orquestras e vaqueiros nas imagens de "Som das Ladeiras", seu novo single.
A cena é um retrato possível da juventude de Olinda, Recife e outras partes do Estado, onde a cultura popular se entrelaça com batidas contemporâneas. "Quando vou no Maracatu, os caras estão ouvindo MC Cabelinho”, resume Léo, em entrevista ao JC.
Nascido e criado na Rua do Amparo, localizada no Sítio Histórico de Olinda, o jovem de 28 anos tem criado uma sinergia entre ritmos da cultura popular pernambucana e o trap, vertente mais eletrônica e dançante do rap que se configurou como um ritmo quase basilar da música pop no mundo.
Em "Som das Ladeiras", essa fusão pulsa com beats urbanos que se chocam com batuques de brinquedos populares, enquanto o refrão ecoa os gritos das 'galeras'.
'Pesquisa de vida'
O single marca uma nova fase para Léo da Bodega, agora sob a batuta da Head Media e com produção do trio Los Brasileros, ganhador de dois Grammys ao lado de Karol G.
Em 2024, ele lançou o álbum "Botija", onde explorou referências de Olinda, gírias e sonoridades diversas, passando pelo maracatu de baque solto - ele foi caboclo de lança no Maracatu Piaba de Ouro com 6 anos de idade e o Mestre Salustiano é um dos seus grandes ídolos.
"É uma pesquisa de vida. Eu já vinha 'matutanto' isso desde o início da minha carreira. Sempre quis inserir as coisas nas quais me envolvi quando era mais novo: cultura popular, frevo, cavalo-marinho, ciranda", diz Léo.
Ele explica que, ao começar no trap, buscou dialogar com a nova geração: "Procurei imprimir algo que não soasse tão regional, que se comunicasse com esse pessoal mais jovem. Quando cheguei na Head Media, consegui dar corpo a essa pesquisa de vida."
'Estamos conseguindo furar a bolha'
Para Léo, o trap feito em Pernambuco está ganhando espaço - mas ainda há desafios. "Estamos conseguindo furar a bolha, pois temos mudado como projetamos nosso trabalho. Mas o Estado é carente de estrutura e produtoras; outros meios, como a publicidade, são mais rentáveis", observa.
"Eu fiz um processo de sair daqui, conseguir recursos e voltar. A gente precisa de um esforço do artista. Ele pode 'bombar', mas ainda é tudo muito pequeno por conta dessas estruturas."
Sem medo de ser 'regional'
Sobre conquistar o público fora de Pernambuco, Léo rebate o receio de soar "regional demais": "Quando mostrei minhas músicas em São Paulo, senti mais entusiasmo do que em Olinda. Diziam: 'representatividade muito foda'. Essa é a minha cara, minha história. Por que não fazer isso?".
Ele também aponta um movimento de valorização local: "Temos uma cultura de achar o que é de fora mais interessante, pois o que está ao nosso redor é tão natural que a gente deixa passar. Ultimamente tenho visto uma nova onda incentivando não deixar isso passar. A gente pode ressignificar o regional e fazer com que o caboclo de lança se sinta representado também por um rap."
"Somos regionais, chiques, inteligentes e fazemos um 'bagulho' contemporâneo. É como a criação de uma ponte entre a informação, a cultura e as pessoas que consomem um gênero mais novo que é o trap", finaliza.