MORTE | Notícia

Morre Antonio Cicero, poeta imortal da ABL e irmão de Marina Lima, aos 79 anos

Diagnosticado com Alzheimer, artista optou pela eutanásia na Suíça, onde a prática é permitida, acompanhado do marido Marcelo Pies

Por Emannuel Bento Publicado em 23/10/2024 às 12:01

O poeta Antonio Cicero morreu nesta quarta-feira (23), aos 79 anos. Diagnosticado com Alzheimer, ele optou pela morte assistida, pois estava na Suíça, onde a prática é permitida, acompanhado do marido, o figurinista Marcelo Pies. A informação foi confirmada pela Academia Brasileira de Letras (ABL), da qual o escritor era membro desde 2017.

O artista, que era irmão da cantora Marina Lima, deixou uma carta de despedida, onde justifica a decisão. "O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi", escreveu.

Diálogo com a música

Cicero foi parceiro na composição de diversos sucessos de Marina Lima, como "Fullgás" e "Pra Começar", tendo uma trajetória literária que se cruzou com a música. Colaborou com nomes como João Bosco, Adriana Calcanhotto e Lulu Santos ("O Último Romântico").

Em 1996, lançou o disco "Antonio Cicero por Antonio Cicero", em que recita seus poemas. Em 2002, participou de uma coletânea de quatro álbuns feita com nomes como Gabriel o Pensador, Chico Buarque, Ronaldo Bastos e Fernando Brant em homenagem a Carlos Drummond de Andrade.

Formação

Antonio Cicero começou a cursar filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e, na sequência, estudou no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele terminou seus estudos em Londres, na Universidade de Londres, nos anos 1960.

Obras

Antonio Cicero é autor de diversas publicações de poesia e reflexões sobre a modernidade. Em 1994, em parceria com o poeta Waly Salomão, organizou o livro "O Relativismo Enquanto Visão do Mundo" (Editora F. Alves), que reuniu conferências realizadas no projeto Banco Nacional de Ideias, promovido pelos dois poetas com intelectuais de importância mundial.

Dentre os livros de poemas, destacam-se "Guardar" (Editora Record), de 1996, e "A Cidade e os Livros" (Editora Record), de 2002. Cicero ainda teve o poema Guardar incluído na antologia "Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século" (Editora Objetiva) em 2001 e foi finalista do Prêmio Jabuti pelos ensaios filosóficos reunidos em "Finalidades sem Fim" (Companhia das Letras) em 2005.

ABL

Cicero foi eleito imortal na ABL no dia 10 de agosto de 2017, ocupando a cadeira número 27 e sucedendo Eduardo Portella. "O que é um poema imortal? Um poema imortal é um poema cujo valor não depende de fatores externos a ele: um poema, portanto, que vale por si", declarou ele em seu discurso de posse.

Leia a carta de despedida de Antonio Cícero:

"Queridos amigos,

Encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia. Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo. Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha terrível situação. A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas - senão a coisa - mais importante da minha vida. Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los. Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade.

Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!"

* Com informações do Estadão Conteúdo

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