Vitor Araújo lança selo musical e EPs marcados por experimentações
Com novos olhares sobre sua obra, projeto aponta também direções do novo álbum do pernambucano

O pernambucano Vitor Araújo desenvolve há alguns anos um trabalho que extrapola os limites da música clássica, terreno no qual se deu grande parte de sua formação. Em diálogo constante com outras linguagens artísticas e com músicos de diferentes vertentes, o pianista tem feito um movimento de reinterpretação de seu repertório e também de esboços para futuras canções, em um instigante processo de jogo musical. Alguns dos resultados desse projeto podem ser conferidos em M-I, primeiro de uma série de EPs denominada Mercúrio, já disponível nas plataformas digitais.
A nova empreitada toma emprestado o título de uma iniciativa capitaneada por Vitor em 2018, no Teatro Centro da Terra, em São Paulo. Nela, o artista recebeu alguns convidados para colaborar com ele no palco e, na semana seguinte, as gravações desses shows eram remixadas com novos convidados, criando conexões que iam se expandindo a cada apresentação.
"A ideia do Mercúrio surgiu justamente a partir dessa vontade de traçar uma série de conexões com outros artistas, de fazer coisas em parceria. O que aconteceu foi que, em 2016, o processo do meu disco Levaguiã Terê, apesar de ter tido colaborações pontuais, quase todos os instrumentos que estão sendo tocados, tiveram as notas escritas por mim. Como foi um disco de orquestração, concentrei muito esforço de criação e execução de ideias em mim. Me veio em 2018 a vontade de fazer algo muito colaborativo, de entrar em confronto com as estéticas e linguagens musicais de outros artistas com quem eu pudesse aprender e ter uma troca de ideias, de procedimento. A ideia foi, além de traçar essas conexões, observar o comportamento do material musical, como jogo, procedimento, de brincar com obra aberta", explica o músico.
Durante a pandemia, ele decidiu transformar Mercúrio em um material fonográfico, lançando uma série de EPs a partir desse processo, ampliando as parcerias. Nessa primeira etapa, participaram DJ o produtor brasiliense JZL, as bandas paulistanas Hurtmold e Rakta, os músicos da cena experimental carioca Thiago Nassif e Bella, o artista sonoro baseado em Berlim ALADA e o DJ Diaki, do Mali. O projeto sai sob o selo M/FM, criado por Vitor.
"Acho muito bom ter um selo em que eu possa lançar mais ideias. Sinto que eu tenho uma coisa como artista: eu lanço muito pouco disco, os arcos entre um e outro são muito longos. E durante esses arcos muitas coisas acontecem — e elas não são mostradas, compartilhadas. São coisas que gosto, que são interessantes, mas não fazem parte da linhagem principal da carreira", pontua. "Lançar esse selo, para mim, tem a importância de poder fazer mais lançamentos, escoar mais ideias que me empolgam, me movem, e de também fazer experiências de formato, de procedimento musical e de estética mesmo."
No que ele considera de pós-estudos de sua obra, o artista busca retomar o jogo que fez nascer Mercúrio: a partir de um mesmo material musical imaginar as possibilidades que podem surgir das músicas presentes em Levaguiã Terê. A ideia foi fomentada após uma visita ao Museu Reina Sofia, em Madri, onde viu Guernica, de Picasso. Na sala ao lado da famosa pintura, há uma série de pré-estudos do artista visual e também de investigações que ele fez após a finalização da obra, descobrindo a potência da tela.
Assim, além dos EPs com os pós-estudos, Vitor também pretende divulgar as primeiras experimentações musicais de seu próximo álbum, que tem previsão de lançamento para 2022. Sua ideia é também investir em colaborações com outras áreas, como a moda. Para este primeiro lançamento, ele firmou uma parceria com a Molett, produzindo roupas baseadas em sua música.
As músicas serão divulgadas na plataforma de streaming ao longo dos próximos meses, mas também haverá materiais exclusivos disponibilizados na plataforma própria mercurio.live.