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Marina retorna com letras políticas e feministas em 'Ancient Dreams in a Modern Land'

Cantora galesa, que influenciou nomes como Lorde e Billie Eilish, lança um de seus trabalhos mais maduros

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Márcio Bastos

Publicado em 11/06/2021 às 19:25 | Atualizado em 15/06/2021 às 15:55
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Marina Diamandis (ex-And The Diamonds) é um tipo único de artista na cada vez mais competitiva seara do pop. Com sua voz grave e multifacetada e suas composições marcadas por uma sensibilidade que une o profundo ao irônico com maestria, ela experimentou poucas vezes o sucesso em termos de venda, mas conquistou algo mais precioso: sua influência pode ser sentida em vários artistas, como Lorde e Billie Eilish, dois fenômenos das paradas musicais. Sem a mesma pressão de atingir pressões comerciais, ela se lança cada vez mais em um caminho autoral, que explicita sua individualidade, como é o caso do recém-lançado Ancient Dreams in a Modern Land.

O quinto álbum de estúdio da artista reúne elementos que identificam vários de seus trabalhos anteriores, das influências do synth-pop e rock do The Family Jewels (2010), à fanfarra pop do Electra Heart (2012), seu maior sucesso comercial; passando ainda pelas composições mais intimistas e sombrias do Froot (2015) e as reflexões sociais e discursos sobre a saúde mental presentes em Love + Fear (2019).

Mais do que uma tentativa de agrupar os acertos de cada uma dessas obras, Ancient Dreams in a Modern Land se apresenta como o resultado da maturidade de uma artista no controle de sua obra, ciente das veredas em que quer se arriscar. Porque, para além de evocar sua trajetória, Marina não se priva de olhar para a frente e buscar novas possibilidades sonoras e estéticas.

Neste trabalho, suas inquietações estão ainda mais direcionadas a questões de cunho político e social, como ficou explícito já na primeira música de trabalho, Man's World. Sobre a canção, Marina disse ter se inspirado na luta contra a opressão de mulheres e pessoas LGBTQIA+ ao longo da história, em um processo de estudo que a levou até eventos como os julgamentos das "bruxas de Salém", ocorridos no século 17, nos EUA, quando mulheres foram julgadas e mortas.

"Me queimou na fogueira/ Você pensou que eu era uma bruxa, séculos atrás/ Agora você acabou de me chamar de vadia (...) Eu não quero mais viver em um mundo de homens", canta na faixa, que ganhou também um remix com a participação da brasileira Pabllo Vittar.

Essa verve questionadora das estruturas do patriarcado também está presente em todas as canções da primeira metade do álbum, como Venus Fly Trap, uma reflexão sobre seu próprio papel dentro da indústria musical. "Eu nunca me encaixei bem nesse lance de Hollywood/ Eu nunca entrei nesse jogo pelo dinheiro ou pela fama/ Eu fiz do meu jeito, meu bem/ Nada nesse mundo/ Conseguiria me mudar", entoa.

Purge The Poison é outro hino feminista que toca tmbém no estado do mundo pandêmico, lançando questionamentos sobre a percepção social sobre as mulheres e o descaso com a natureza, assumida por ela como um símbolo feminino tão machucado e menosprezado quanto ela, suas contemporâneas e ancestrais. Mais do que apenas diagnosticar o estado do mundo, Marina chama as mulheres à luta por mudanças, começando por assumir o controle de suas próprias vidas.

Atualmente vivendo nos Estados Unidos, a britânica reflete sobre o país em New America, com uma pegada mais roqueira. A canção coloca o dedo na ferida da história imperialista e racista do país, questionando a própria ideia dos EUA sobre si enquanto terra das oportunidades e da liberda. "America, você não pode esconder a verdade/ É hora de encarar a verdade (...) Eles têm sangue nas mãos porque roubaram toda a terra/ E todas as mentiras estão aqui para fomentar/ Fizeram eles se sentir como homens", dispara.

A segunda metade do trabalho assume um caráter mais intimista e introspectivo, como na faixa Pandora's Box, em que a cantora, que costuma falar abertamente sobre saúde mental, revela suas inseguranças, medos e sombras. Sua interpretação assume um tom vulnerável, assim como nas faixas Flowers, que foca na voz da cantora sobre a base de piano, evidenciando suas emoções, e Goodbye.

Trabalhando com a dualidade da experiência humana, entre o amor e a dor, a esperança e a desilusão, Marina cria sua obra mais complexa. As nuances apresentadas por ela tanto na voz quando nas composições evidenciam sua preocupação em continuar refletindo sobre o mundo e sua existência, a despeito das expectativas dos outros. Como já fez com seus primeiros trabalhos, ela volta a ser um exemplo das possibilidades para outras artistas do pop dispostas a não se conformar com modelos e expectativas irreais.

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