
Ebony lembra quando podia passar um dia inteiro em silêncio só acompanhada de seus fones. Se nos primeiros anos da adolescência, era uma fã exclusiva do rock, outros sons foram chegando para o preenchimento musical de seus dias. Kendrick Lamar, Tame Impala, funks, a música foi tomando um espaço cada vez maior e decidiu brincar com ela.
Com um aplicativo que traz beats prontos para cantar por cima, ela gravou uma faixa e publicou despretensiosamente. Mas os números, na casa dos milhares, foram altos para a brincadeira da carioca, que estava dando os primeiros passos para se tornar uma das promissoras revelações do rap. Agora, aos 19 anos, Ebony lançou seu primeiro EP para carimbar seu nome no mercado.
"Eu postei como uma brincadeira, achei engraçadinho e foi batendo 10 mil, 20 mil. As pessoas começaram a me chamar para fazer parcerias e eu não estava entendendo o que estava acontecendo. Vi que rolava dinheiro ali, através de distribuidoras e tal. Quando vi isso, pensei 'é assim que eu vou fazer dinheiro'", relembra Ebony. De lá para cá, veio com singles envolventes, como XOXO e Glossy, acompanhados também de videoclipes que abraçam uma suavidade com contornos de malícia que a cantora vem apresentando. Colaborou com nomes como o rapper mineiro FBC, além de participar de projetos da PineApple Storm como o Poetisas no Topo 2, ao lado de nomes como Kmila CDD e Cynthia Luz.
“Quando fui gravar a música Disco com o Yunk Vino, eu senti algo no estúdio que me fez sentir preparada para fazer algo grande, um EP ou álbum. O que te coloca no mercado são trabalhos grandes e compostos, qualquer pessoa pode escrever um single. Eu precisava ter esse momento de estreia, de ir além de uma brincadeira”, explica Ebony, sobre a iniciativa do novo projeto. Condessa é a continuidade do encontro entre sua caneta perspicaz e sua voz aveludada.
Suas faixas de nomes simples parecem refletir esse mundo que Ebony vem adentrando, entre objetos de desejo e de fruição da vida, como o lançamento de um disco ou um copo de bourbon. Beats graves e sua voz carregada em uma textura branda falam sobre esses lugares que estão sendo habitados e as pessoas dele, entre relações de poder e sexo em seis faixas. Para ela, trap é um rótulo que não dá conta da experiência do Condessa.
A suavidade atmosférica do EP dialogam com as intenções temáticas de Ebony. Eu estou aqui para provar que garotas negras também podem ser delicadas, a gente tem coração e amor. As pessoas não olham para a gente assim por algum motivo. Não tem muitas mulheres negras, do meu tom de pele, no meu ramo musical. Eu sinto que, embora seja uma narrativa simples, só uma garota de 19 anos vivendo pelo mundo, traz essa diferença porque não ouvimos muitas garotas negras de 19 anos vivendo pelo mundo, eu sou muito abençoada por não fazer parte das estatísticas", relata.
A produção da maioria das faixas é de AJ Wav e ainda há a presença de nomes como Sidoka, Yunk Vino, Celo1st e Nagalli. Ebony diz que a seu produtor sabia exatamente quais eram os beats necessários para sua empreitada delicada. As instruções foram simples, "faz beats que te façam lembrar de mim", que foram seguidas com empenho. Ebony vê essas redes de apoio construídas dentro da cena como algo fundamental para a própria sobrevivência do ritmo, mesmo que ego muitas vezes pese.
"A gente precisa se levantar porque o rap ainda não é a música brasileira que vai ser vendida lá fora, ele já vem de fora. Quando a gente fala em se manter no Brasil enquanto rap, eu não vejo outra opção além da gente se ajudar. Isso pra mim, que sou uma mulher e tenho uma visão de mundo. Sei que os homens não vêem assim e colocam o ego na frente. Entendo, mas não vejo outra opção além de ajudar os meus", relata. Suas expectativas é de que seu som chegue em garotas pretas adolescentes, como as músicas que a ajudaram um dia a se entender e se ver no mundo. Pelos números que vem alcançando, com o EP lançado na última terça-feira já com mais de 140 mil plays nas plataformas, o caminho tá sendo bem trilhado.


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