Assim como Transa, de Caetano Veloso, comentado nesta série de discos do ano de 1972, foi um grande sucesso de critica e público, Expresso 2222, de Gil, foi cercado de expectativas, desde que começou ser anunciado, sobretudo pela imprensa alternativa da época. As sessões de gravação do álbum tjveram direito a repórter da revista Bondinho de plantão (Ricardo Vespucci), e o making of (numa época em que só aos Beatles era dispensado tal privilégio). A Phillips, gravadora dos dois baianos, não poupou verba para ter um produto final que causasse impacto, e vendesse bem, claro. Expresso 2222 foi gravado no Estúdio Eldorado, na época, o único do Brasil que possuía uma mesa de 16 canais, um assombro. Roberto Menescal, produtor do disco, não dourou a pílula ao comentar o que a gravadora pretendia do baiano: “A Phillips pediu um pouco pro lado dela, um pouco da parte comercial e, ao mesmo tempo, deu-se ao Gil dois terços do disco pra ele fazer o que bem entendesse”, comentou Roberto Menescal. A parte comercial do LP são as faixas Back in bahia, e Chiclete com banana (Gordurinha e Almira Castilho), segundo Menescal: “O Rock in Bahia, por exemplo, o primeiro a ficar pronto, é um negócio bem acessível, simples, atual e em que Gil não tira sarro com o publico... O próprio Chiclete com banana, um samba-rock-baião...sei lá... também é um negócio muito popular, que pode acontecer”. Mas a faixa que mais tocou de Expresso 2222 foi a que dá título ao disco. Oriente, uma que se considerava experimental, também foi muito executada nas rádios. Aliás, boa parte do disco tocou bem. Gil, assim, como Caetano, conseguia ser simultaneamente alternativo, udigrudi e também MPB portanto atingia um público amplo. Sessões que começavam no final da tarde, e se estendiam até à madrugada: “Tudo isso compartilhado por uma patota cabeluda e numerosa, a patota de Gil, que o acompanha sempre, incluindo Sandra, mulher de Gil...alguns bebem chá de banchá, o chá macrobiótico...” Com uma banda formada por Bruce Henry (baixo), Lanny (guitarra), Tuti Moreno (baterista), e Perna (teclados), ele fazia um som elétrico e acústico ao mesmo tempo. Expresso 2222 tem uma sonoridade de uma qualidade, até então rara no Brasil. Uma clareza no violão de Gil, que inaugurava uma nova batida de samba, que influenciaria, entre outros João Bosco (Bala com bala tem exatamente esta batida) e Djavan. A explicação não está apenas na produção de Roberto Menescal, com participação do recifense Marcus Vinicius (velho conhecido de Gil, do tropicalismo pernambucano, de 68). Está sobretudo na poderosíssima mesa de 16 canais: “Até quatro canais, eu mexo. Agora, essa de 16 é uma fundição de cuca pra mim”, Roberto Menescal não escondia sua perplexidade diante de tanta tecnologia. “Hoje, para o que se faz no Brasil, 16 canais é um exagero. Porém, uma máquina de oito é indispensável”, ainda Menescal, que na gravação de O canto da ema (João do Vale- Alventino Cavalcanti – Aires Viana), empregaram-se todos os 16 canais pela primeira vez num disco brasileiro: “Graças ao deslumbramento com essa possibilidade de que todos foram tomados, principalmente Menescal, Marcus Vinicius e Chris (técnico de som de Gil),. Tudo pronto, tudo aprovado, com o conjunto todo participando, mais a voz de Gil, Bruce, Perna, resolveram reforçar o coro, gravando a mesma coisa, novamente em outros dois canais, os dois últimos", contou Menescal.. Até ali, tinham sido usados 14 canais” (da matéria da Bondinho). Os canais restantes foram utilizados em reforçar ainda mais o coro, com Gal, Gil, Bruce. As sessões de gravação de Expresso 2222 foram filmadas pela equipe de Leon Hirszman, com Edson Costa, Lauro Escorel, Ricardo Stein, e Ze Antônio Ventura. Seria o próximo longa de Hirszman. Não foi realmente uma simples gravação para um disco. Gilberto Gil havia se tornado um superstar brasileiro. Na matéria, Guilherme Araújo contabiliza os custos do disco. Altíssimos, a começar pelo estúdio. O preço médio da hora em um estúdio comum era de 150 cruzeiros. No Eldorado o valor subia para 400 cruzeiros. A capa, assim como a de Transa, foi um barato que saiu muito caro. “A capa do Expresso 2222 é dupla. Na primeira capa há foto de Pedrinho, filho de Gil (n- falecido, em um acidente de carro, em 1990), uma espécie de homenagem a quem é dedicado o disco, e a seus semelhantes. No centro, além das letras das músicas, uma foto de Gil". A capa é redonda com abas dobráveis de modo a transformar-se em quadrada. Nas abas as fotos de Lanny, Bruce, Tutti e Perna. Assinada por Edinísio Ribeiro, a capa de Expresso 2222 foi considerada a “mais complicada já feita no Brasil”. Só para as fotos foram contratados três profissi0nais renomados na época . Também feito a capa de Transa, a de Expresso 2222 foi uma obra de arte fugaz. As abas não se seguraram muito tempo no lugar. Com o uso, despedaçavam-se. Resultado: ou foram dispensadas, ou coladas com fita adesiva, para se soltarem em pouco tempo. A gravação terminou num sexta-feira. Havia tempo de estúdio para mais duas músicas. Uma delas foi Ele e eu (em que Gil compara e acentua as diferenças que o unem a Caetano). “A última coisa a ser gravada é Sai do sereno (Onildo Almeida). Gal desce ao estúdio, senta-se de frente para Gil, os dois recebem o sinal e gravam. Gil fazendo pose de mão na cintura”. Expresso 2222 está sendo relançado pela Universal Music, em CD e vinil, esste último com a arte da capa original.
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Por JCLançamentos, tendências e histórias de música e músicos