PREVENÇÃO | Notícia

Menos de 1% dos municípios brasileiros atingiu a meta de rastreamento do câncer do colo do útero estabelecida pela OMS

Segundo dados do Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica, só 0,48% das cidades tiveram cobertura igual ou superior a 80%

Por Cinthya Leite Publicado em 14/05/2025 às 15:14

Apesar de avanços no diagnóstico e no início do tratamento do câncer do colo do útero, o cenário no Brasil ainda é crítico em relação ao rastreamento da doença e índices de mortalidade.

Dados inéditos consolidados pela ImpulsoGov (organização sem fins lucrativos que, em parceria com governos, tem como meta fortalecer o Sistema Único de Saúde com soluções inovadoras) revelam a gravidade da situação.

Os dados de rastreamento do câncer do colo do útero na Atenção Primária em Saúde (APS), realizados por meio do exame citopatológico (conhecido como apanicolau), mostram que a cobertura segue muito abaixo da meta definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que deve ser igual ou maior que 80%

Segundo informações do Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (Sisab):

  • Apenas 0,48% dos municípios brasileiros alcançou cobertura igual ou superior a 80% no 3º quadrimestre de 2024.
  • A maioria (52,35%) permanece entre 20% e 40% de cobertura, enquanto em 10,20% dos municípios menos de 20% das mulheres realizaram o exame.
  • Apenas 37,44% atingiram a meta mínima de 40%, estipulada pelo Ministério da Saúde no último programa de financiamento da APS, vigente até abril de 2024.

Mais de duas décadas sem realizar exame preventivo do câncer do colo do útero

Os números revelam o cenário de um Brasil real. São histórias como a da Maria de Souza, moradora de Pacoti, no Ceará, que passou mais de duas décadas sem realizar um exame preventivo.

"Estava há 21 anos (sem realizar o exame preventivo), mas sempre fui uma mulher que gostei muito de me cuidar. Eu fui trocar uma receita, e a equipe (de saúde) insistiu que eu fizesse. Fiquei satisfeita. Se eles não tivessem feito isso, eu não teria ido”, diz.

Em relação ao tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento, os números do Sisab indicam melhora na rede pública, mas ainda com grandes desafios.

Em 2017, 84,24% dos tratamentos foram iniciados após 60 dias do diagnóstico. Em 2024, esse percentual caiu para 39,48%. O percentual de tratamentos iniciados até 30 dias após o diagnóstico tem se mantido constante ou aumentado, e atingiu 40,01% em 2024.

"Diagnosticar o câncer do colo do útero em sua fase inicial é essencial para salvar vidas e diminuir o sofrimento das pessoas diagnosticadas. A detecção precoce aumenta significativamente as chances de cura e reduz as sequelas decorrentes do tratamento", afirma a gerente de saúde pública da ImpulsoGov, Juliana Ramalho

"Outro ponto crucial é a diminuição do tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento: devemos lembrar que todo tempo é valioso quando o assunto é tratar uma doença tão grave. Por isso, investir na detecção o quanto antes é tão importante quanto iniciar o tratamento sem demora", acrescenta. 

ImpulsoGov ajuda a identificar as pessoas com exames preventivos em atraso

Fundada em 2019, a organização sem fins lucrativos ImpulsoGov já atendeu diretamente mais de 240 municípios por meio de diferentes projetos, nos quais vivem mais de 20 milhões de pessoas.

O Impulso Previne, uma das iniciativas da organização, é uma solução digital e gratuita que centraliza em uma plataforma dados, análises e recomendações sobre os principais indicadores de prevenção em saúde, para apresentá-los de forma rápida e descomplicada aos profissionais do SUS.

Com essa iniciativa, a ImpulsoGov ajuda a identificar, por exemplo, quem são as pessoas com exames preventivos em atraso e quem é a equipe de saúde responsável por realizar esse atendimento.

O estudo sobre câncer cervical também aponta uma mudança positiva no estadiamento dos diagnósticos. O percentual de casos identificados no estádio IV, o mais avançado da doença, caiu de 59,6% em 2013 para 24,4% em 2024.

A soma dos diagnósticos em estádios III e IV passou de 77,1% em 2013 para 65,3% em 2024, se considerarmos dados do Painel Oncológico do SUS, que se referem exclusivamente à rede pública.

Apesar dos avanços, a mortalidade por câncer do colo do útero segue elevada

O câncer do colo do útero é um dos tipos mais comuns de câncer ginecológico e está fortemente associado à infecção persistente pelo papilomavírus humano (HPV).

Esse tipo de câncer se desenvolve na região inferior do útero, conhecida como colo do útero, que conecta o corpo do útero à vagina.

A prevenção do câncer do colo do útero inclui a vacinação contra o HPV e a realização periódica do exame de papanicolau, que permite a detecção precoce de lesões precursoras.

Apesar dos avanços, a mortalidade segue elevada. Em 2023, o Brasil registrou 7.209 mortes por câncer de colo do útero. Até 31 de julho de 2024, já foram contabilizados 4.353 óbitos, o que reforça a urgência de ações efetivas de prevenção e diagnóstico precoce.

A análise dos dados do Sisab por região mostra que o Norte do País apresenta, consistentemente, as maiores taxas de mortalidade. Em 2023, a taxa foi de 10,24 óbitos por 100 mil mulheres na região Norte, enquanto a região Sudeste registrou 5,22.

Os Estados com as maiores taxas são Amazonas, Roraima e Pará; em contraste, Minas Gerais, Rondônia e São Paulo apresentam os menores índices de mortalidade por câncer do colo do útero. 

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