Anti-inflamatório, tadalafila e relaxante muscular em academias: o coquetel perigoso do treino sem orientação
Médicos alertam que remédios que prometem alívio ou performance viram armadilhas silenciosas para quem busca resultados rápidos nos treinos

A busca por mais rendimento e menos dor tem levado muitos praticantes de exercício físico a recorrer a medicamentos por conta própria — uma prática que pode trazer graves consequências para a saúde. Especialistas do Hospital Santa Catarina – Paulista alertam para os riscos do uso indiscriminado de anti-inflamatórios, relaxantes musculares e até da tadalafila (substância indicada para disfunção erétil, mas cada vez mais usada como pré-treino), principalmente por jovens.
O cardiologista Nilton José Carneiro enfatiza que o uso frequente de anti-inflamatórios, especialmente sem orientação médica, pode afetar o sistema cardiovascular de forma significativa.
"Esses medicamentos interferem diretamente nos vasos sanguíneos e na função renal. Eles podem descontrolar a pressão arterial e aumentar o risco de complicações como infarto, acidente vascular cerebral (AVC) e insuficiência cardíaca", afirma Nilton. Esse risco é ainda maior em pessoas com doenças pré-existentes, como hipertensão, diabetes e tabagismo.
A combinação entre o uso de anti-inflamatórios e exercícios intensos, de acordo com o cardiologista, pode ser perigosa.
"Durante a prática esportiva, o sistema cardiovascular já está exigido: há aumento da frequência cardíaca e da pressão. Somar isso ao uso desses fármacos pode potencializar efeitos adversos", alerta Nilton.
Ele lembra que dores crônicas devem ser tratadas de forma adequada, com acompanhamento de especialistas como fisiatras, ortopedistas e anestesiologistas. "Existem várias abordagens seguras para aliviar a dor sem recorrer ao uso indiscriminado de remédios."
Tadalafila em academias: a ilusão e o perigo do rendimento instantâneo
Outro medicamento que virou "moda" nos bastidores das academias é a tadalafila, conhecida por ser indicada no tratamento da disfunção erétil.
De acordo com o urologista Alexandre Sallum, o uso da tadalafila como pré-treino se baseia em uma crença sem fundamento.
"A ideia de que a tadalafila melhora o desempenho físico por causar vasodilatação é apenas especulativa. Não existe nenhuma evidência científica de que esse uso traga benefícios, e ele pode ser perigoso", esclarece.
Entre os efeitos colaterais do uso indiscriminado da tadalafila, estão taquicardia, falta de ar, dor de cabeça intensa e alterações na pressão arterial.
"Em casos mais graves, pode haver infarto ou AVC. O uso sem prescrição é um risco real, principalmente para quem já faz uso de outros medicamentos, como os anti-hipertensivos", afirma Sallum.
O médico também alerta para um problema crescente: a dependência psicológica entre jovens. "Muitos acreditam que só conseguem ter bom desempenho sexual com o uso do remédio, o que causa um ciclo de insegurança e uso contínuo sem necessidade clínica."
A fórmula errada do rendimento em academias
Já o ortopedista Fábio Datti chama a atenção para outro hábito comum entre praticantes de musculação: o uso de relaxantes musculares após o treino.
"Esses medicamentos podem mascarar dores que fazem parte do processo natural de adaptação e crescimento muscular, como as microlesões induzidas por treinos de resistência. O uso indiscriminado interfere até na recuperação, o que prejudica a síntese de proteínas e o reparo dos tecidos musculares", explica.
E Fábio Datti lembra que os relaxantes musculares atuam no sistema nervoso central e podem causar efeitos como sonolência, tontura e dificuldade de concentração.
Já os anti-inflamatórios, além de afetarem a função digestiva e renal, são hoje desaconselhados em tratamentos de lesões musculares agudas.
"Eles atrapalham o processo inflamatório natural necessário para a regeneração dos músculos. O ideal é recorrer a estratégias como gelo, repouso, alongamentos, hidroterapia ou exercícios leves de baixo impacto."
Automedicação pode custar caro à saúde
O uso consciente de medicamentos deve ser sempre guiado por orientação médica. A automedicação pode comprometer não só o rendimento, mas a saúde a longo prazo.
"O exercício físico é um grande aliado da saúde, mas precisa ser feito com responsabilidade. Medicamentos não são pré-treino e, quando usados sem necessidade, viram um risco desnecessário", sublinha o cardiologista Nilton José Carneiro.