Bike PE: estudo valida problemas do Bike PE no Grande Recife, sem integração com o transporte público, com bicicletas velhas e sem expansão

Bicicletas do Bike PE estão velhas e sistema sofre sem expansão para o subúrbio e até mesmo bairros além da área central do Recife. Estudo é da UFRPE

Publicado em 17/03/2025 às 15:21
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Uma tese de mestrado do curso de Administração Pública da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) comprovou os problemas que os usuários do Bike PE, sistema de compartilhamento de bicicletas públicas em operação desde 2011 no Grande Recife, têm enfrentado diariamente há pelo menos dois anos. O Bike PE não faz integração com o transporte público, as bicicletas estão velhas, o sistema sofre sem expansão desde sua criação e até hoje não chegou à periferia da capital pernambucana.

Sem a manutenção devida, a expansão e a integração intermodal prometida, o Bike PE vem perdendo a confiabilidade, requisito número um para qualquer tipo de modal de transporte, mesmo os ativos - não motorizados. “O Bike PE já começou errado, com poucas estações, baixa capilaridade e, principalmente, sem integração com os sistemas de transporte público, tanto ônibus como metrô. Apenas 3% das estações do sistema têm proximidade com o transporte de média e alta capacidade e, mesmo assim, tudo concentrado na área central”, alerta Luiz Azuirson da Silva Neto, autor da dissertação Cadê a bike? Um estudo sobre a implementação das estações de bicicletas compartilhadas na Região Metropolitana do Recife, sob a perspectiva da governança pública.

O estudo aponta que, para ter uma efetiva presença na RMR, o ideal era que o número de estações fosse três vezes maior do que é hoje. Pelo menos. “O ideal era que, atualmente, fossem ao menos 300 estações na Região Metropolitana do Recife. As 90 estações que seguem até hoje, mesmo após 14 anos de implantação do Bike PE, estão muito abaixo do necessário. Além de poucas, a distância de uma estação para outra também é desestimulante: chega até a um quilômetro”, pontua.

POUCAS ESTAÇÕES E BICICLETAS COMPROMETEM A CONFIABILIDADE DO SERVIÇO

YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM
Bike PE tem 90 estações e 900 bicicletas no Recife e, pontualmente, em Olinda e em Jaboatão dos Guararapes. Desde 2017, teve o acréscimo de apenas 10 estações - YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM

De fato, é visível que a rede ofertada - 90 estações e 900 bicicletas no Recife e, pontualmente, nas cidades de Olinda e Jaboatão dos Guararapes - há muito tempo já não dá conta da demanda de usuários. Seja nos horários de pico da semana, quando tem grande utilização como modal de transporte e complemento ao transporte público coletivo, por exemplo, ainda mais aos domingos, quando vira opção de lazer da população estimulada pelas Ciclofaixas de Turismo e Lazer operadas pela Prefeitura do Recife.

O estudo foi qualitativo e constatou o que o cliente do sistema - patrocinado pelo banco Itaú e operado pela empresa Tembici, com a gestão sob responsabilidade do governo de Pernambuco - sente diariamente: que tem sido cada vez mais frequente encontrar bicicletas quebradas, com sistema de marchas, freios e correntes comprometidos, bancos instáveis e pedais soltos ou quebrados, além da pouca oferta dos equipamentos.

“A falta de integração modal é o principal problema do Bike PE. Essa carência reduz o uso do sistema como alternativa de mobilidade sustentável. A falta de expansão para os subúrbios é outra falha que estimula a desigualdade no acesso ao sistema de bicicleta compartilhada. Como o Bike PE opera predominantemente na área central e de maior renda - principalmente do Recife - gera exclusão de áreas periféricas”, observa Luiz Azuirson da Silva Neto.

O uso das bicicletas pelos entregadores de comidas (delivery) é outro fator que tem comprometido ainda mais a disponibilidade e a manutenção das bikes.

Confira os principais problemas identificados:

- Falta de integração planejada entre o sistema de bicicleta compartilhada e os sistemas de transporte público (metrô, ônibus e BRT).

- Carência de planejamento baseado em critérios técnicos de localização que considerem fatores como infraestrutura cicloviária e acessibilidade.

- Participação limitada da sociedade civil na escolha das localizações e na implementação do sistema, refletindo um baixo nível de governança participativa.

As principais consequências dos problemas:

- A falta de integração modal reduz o uso do Bike PE como
alternativa de mobilidade sustentável.

- Desigualdade no acesso ao sistema de bicicleta compartilhada entre os bairros, com predominância em áreas centrais e de maior renda, o que gera exclusão de áreas periféricas.

- Deficiências no cumprimento dos princípios de governança pública, que poderiam contribuir para a eficácia e aceitação do sistema pela população.

As recomendações feitas no estudo:

- Revisão da localização das estações
Reavaliar a localização das estações considerando os critérios de densidade e conectividade, priorizando proximidade com estações de transporte público e áreas de alta demanda.

- Promoção da integração com o transporte público
Estabelecer parcerias com órgãos de transporte para criar conexões entre o sistema de bicicletas compartilhadas e o metrô/ônibus/BRT, integrando as estações de bicicleta a terminais multimodais e pontos de transporte de alta capacidade.

- Fortalecimento da governança e participação social
Implementar mecanismos de participação pública, como audiências e consultas, para decidir sobre novas estações. Adotar práticas de transparência na divulgação das informações sobre o planejamento e a operação do sistema.

- Monitoramento contínuo e avaliação de desempenho
Estabelecer indicadores de desempenho para o sistema, avaliando regularmente o alcance e a satisfação do usuário.

Realizar pesquisas periódicas para entender a percepção e as necessidades dos usuários, ajustando o sistema conforme necessário.

- Criação de repositório dos documentos relativos ao sistema
Reunir os documentos relacionados ao Bike PE, como editais, contratos, termos de cooperação, relatórios de reuniões e outros documentos relevantes, acessível ao público e atualizado periodicamente.

O difícil acesso a informações sobre o sistema foi outro ponto criticado na dissertação. Segundo o estudo, não há transparência na disponibilidade dos dados do sistema, tanto pelos operadores como pelos órgãos públicos que deveriam geri-lo. “A gestão do Bike PE mudou várias vezes de órgãos no Estado, sem que haja disponibilidade dos documentos. Somente via LAI (Lei de Acesso à Informação) é possível obter algo”, reforça.

O entendimento é de que cidades precisam se apropriar dos sistemas de aluguel de bicicletas e levá-los à periferia como transporte. A Coluna Mobilidade não conseguiu retorno da Tembici sobre o estudo.

PROBLEMAS FAZEM PREFEITURA DO RECIFE LANÇAR LICITAÇÃO PARA SISTEMA MUNICIPAL

YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM
A proposta do novo sistema de compartilhamento de bicicletas públicas do Recife teria, pelo menos na intenção, muitas melhorias e avanços em relação ao que é oferecido atualmente no Bike PE - YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM

Os problemas do Bike PE, que vêm se acumulando principalmente nos últimos dois anos, levou a Prefeitura do Recife a lançar, em breve, a versão municipal do sistema de compartilhamento de bicicletas públicas. No fim de 2024, a gestão abriu consulta pública para coletar contribuições da sociedade civil para aprimorar uma futura proposta de concessão do novo serviço.

O valor do contrato está estimado em R$ 346 milhões por um período de 20 anos. O cronograma previsto na proposta começou com a consulta pública entre novembro e dezembro do ano passado, depois haveria ajustes no escopo do projeto em janeiro de 2025, análise do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) entre janeiro e abril,com lançamento do edital de licitação em maio e assinatura do contrato em agosto de 2025.

A proposta do novo sistema de compartilhamento de bicicletas públicas do Recife teria, pelo menos na intenção, muitas melhorias e avanços em relação ao que é oferecido atualmente no Bike PE.

Entre as novidades, um número maior de bicicletas e a oferta de bikes elétricas, como já acontece no Rio de Janeiro e em São Paulo, por exemplo, mas que nunca chegou ao Recife. Seriam 1.600 bicicletas convencionais e 400 bicicletas elétricas, além de 50 bicicletas infantis. O número de estações também seria maior: 205 estações.

“A crescente preocupação com a sustentabilidade e a necessidade de soluções de mobilidade eficientes têm impulsionado a adoção de sistemas de bicicletas compartilhadas em diversas cidades ao redor do mundo. Para a cidade do Recife, a melhoria da mobilidade urbana é um desafio constante, assim como para diversas outras metrópoles brasileiras”, alega a gestão municipal na proposta.

“Desde 2013, o Recife tem expandido sua rede de ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas. Atualmente, a infraestrutura cicloviária conta com 193 km de extensão, interligando as Zonas Sul, Oeste, Norte e o Centro da cidade. Ainda assim, é indispensável que a cidade ofereça um sistema de transporte mais atrativo e acessível à população, funcionando como uma alternativa sustentável que incentive deslocamentos mais rápidos e saudáveis,
especialmente em áreas de tráfego intenso. Além disso, o sistema pode também servir como uma plataforma para uso recreativo e de lazer”, argumenta.

O cronograma previsto na proposta começaria com a consulta pública entre novembro e dezembro deste ano, depois haveria ajustes no escopo do projeto em janeiro de 2025, análise do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) entre janeiro e abril de 2025, com lançamento do edital de licitação em maio e assinatura do contrato em agosto de 2025. O valor do contrato está estimado em R$ 346 milhões nos 20 anos.

Confira a proposta da Prefeitura do Recife:

Projeto Bike Recife 11/24 by Roberta Soares 

Outras exigências feitas são que a futura concessionária assuma a implantação, operacionalização e manutenção de faixa móvel nos sábados, domingos e feriados nas ruas da cidade, que hoje é bancado pela gestão municipal.

Que seja adotada tecnologia de monitoramento do serviço, com contagem volumétrica e painel de mensagens para os ciclistas. Além da oferta de viagens gratuitas, com o objetivo de “ampliar o acesso ao sistema de bicicletas compartilhadas para cidadãos em situação de vulnerabilidade social, promovendo inclusão e equidade no uso de serviços públicos de
mobilidade”. A adesão seria via CADÚNICO para acesso gratuito ao serviço.

Confira em números as exigências feitas:

1.600 bicicletas convencionais
400 bicicletas elétricas
50 bicicletas infantis
205 estações de bicicleta
2.050 unidades de sistema de posicionamento
1 site e 1 aplicativo do sistema

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