Uber e 99 Moto: segunda tentativa de implantar serviço em São Paulo leva entidades nacionais e internacionais a alertar sobre riscos do mototáxi digital
Risco de quedas e colisões, aumento do custo para a saúde pública, caos no trânsito e impacto econômico no transporte público são alguns dos danos

A disputa judicial que vem sendo acompanhada nacionalmente entre a Prefeitura de São Paulo e as plataformas de transporte para implantação do serviço de Uber e 99 Moto na maior capital do País levou entidades nacionais e internacionais ligadas à mobilidade urbana a emitir um alerta sobre os riscos e danos que o serviço provoca para a sociedade e as cidades.
Num posicionamento conjunto, o Instituto de Engenharia, a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), o Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP) e a União Internacional de Transporte Público (UITP) manifestaram preocupação com a possibilidade de o serviço vir a ser autorizado pela Justiça de São Paulo.
Decisões judiciais - mesmo que liminares (provisórias) - vêm garantido a operação dos aplicativos de transporte de passageiros com motos em muitas cidades e até capitais, como acontece no Recife e cidades da região metropolitana e no Rio de Janeiro.
As entidades fizeram uma alerta para os graves impactos da modalidade de transporte individual em áreas como segurança pública, mobilidade urbana, saúde pública e eficiência do transporte coletivo. O gesto foi provocado pela preocupação com as ações judiciais promovidas pelas plataformas 99 e Uber, que visam autorizar a operação do serviço de mototáxi em São Paulo, como já aconteceu em quase todo o País.
A capital paulista, inclusive, é a única capital brasileira a resistir - pelo menos até então - à implantação do Uber e 99 Moto. Vale lembrar que é a segunda tentativa das plataformas de liberar o serviço na cidade. A Uber havia anunciado o serviço em janeiro de 2023, mas suspendeu logo em seguida, após a prefeitura editar um decreto proibindo o transporte remunerado de passageiros com motos.
TRANSPORTE PÚBLICO MELHOR É A SOLUÇÃO PARA EVITAR FUGA DO PASSAGEIRO PARA O UBER E 99 MOTO
As organizações recomendaram que os governos evitem a autorização do serviço de mototáxi e que, ao mesmo tempo, priorize investimentos na melhoria e expansão do transporte público. O entendimento é que só melhorando os serviços de ônibus, metrôs e trens será possível evitar a fuga do passageiro.
A conclusão do manifesto é que a implementação do serviço de mototáxi em São Paulo representaria um retrocesso, com impactos graves na segurança, mobilidade e gestão de recursos públicos.
Confira os principais pontos deste manifesto:
Aumento de sinistros de trânsito e impactos na saúde pública
A introdução do serviço de mototáxi tende a elevar o número de sinistros de trânsito, resultando em mais vítimas e sobrecarga no sistema de saúde. Também comprometem o atendimento de outras emergências, gerando custos sociais significativos.
Problemas na mobilidade urbana
Os sinistros de trânsito envolvendo mototáxis agravam os congestionamentos, atrasam a rotina da população e aumentam os custos sociais, prejudicando a circulação e comprometendo a eficiência do transporte público.
Riscos à segurança pública
A atuação de motociclistas clandestinos no serviço de mototáxi pode facilitar crimes, como assaltos, dificultando a identificação e o rastreamento de criminosos, o que representa um risco adicional à segurança da população.
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Concorrência com o transporte público
O mototáxi, como modalidade de transporte individual, desvia passageiros das linhas capilares de ônibus e das redes integradas de transporte coletivo, prejudicando o equilíbrio financeiro do sistema público e a sustentabilidade da mobilidade urbana.
Recomendações para políticas de transporte
As entidades defendem a priorização do transporte público, com investimentos em infraestrutura, integração modal e tarifária, e a adoção de tecnologias avançadas, como os Intelligent Transportation Systems (ITS), já utilizados pela SPTrans. A criação de linhas capilares de ônibus e a expansão de corredores exclusivos são alternativas eficientes para atender às demandas de deslocamento, eliminando a necessidade do mototáxi.
Papel da gestão pública
A Agência Reguladora de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) é destacada como fundamental na gestão e racionalização da integração intermodal dos transportes municipais e estaduais. A ampliação da interoperabilidade tarifária e o fortalecimento da infraestrutura existente são medidas essenciais para garantir um sistema de transporte eficiente e seguro.
PESQUISA NACIONAL MOSTRA IMPACTO DO SERVIÇO COM MOTOS NO TRANSPORTE PÚBLICO
Um estudo da Confederação Nacional do Transporte (CNT), divulgado em agosto de 2024, constatou o que todo brasileiro já vê e sente nas ruas: as pessoas abandonaram e seguem abandonando o transporte público coletivo pelos aplicativos de mobilidade no País. E, desde o fim de 2021 - precisamente, a partir de 2022 -, estão trocando os ônibus pelo serviço de transporte com motocicletas, como Uber e 99 Moto.
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Essa perigosa migração - que vem sendo constatada na explosão dos números de quedas, colisões, mortes e mutilações de ocupantes de motos na saúde pública - foi validada na atualização da Pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana.
Pesquisa de Mobilidade Urba... by Roberta Soares
Os números da migração assustam, acendem um alerta e exigem uma reação urgente do poder público em todas as suas esferas. Isso porque os prefeitos têm o poder e a obrigação legal de proibir ou regulamentar o serviço de mototáxi, os governadores têm responsabilidade porque estão pagando a conta da saúde pública, e o governo federal poderia criar regras nacionais para, ao menos, tornar o serviço mais seguro.
CONCORRÊNCIA COM OS APLICATIVOS É QUASE DESONESTA PARA OS ÔNIBUS
A Pesquisa CNT constatou que os serviços de viagens oferecidos por aplicativos - nesse caso, carros e motos - têm grande responsabilidade pela fuga do passageiro do transporte público.
A modalidade teve uma evolução expressiva, passando de 1,0%, em 2017, para 11,1%, em 2024. E o crescimento foi verificado, principalmente, na população de baixa renda. Segundo a pesquisa da CNT, dentre as pessoas que substituíram o ônibus pelos aplicativos de transporte, 56,6% pertencem à classe C e 20,1% às classes D/E.
“Essa evolução é um dos fatores que contribuem para a substituição do transporte coletivo pelo privado com motos, uma vez que, neste ano, 56,9% dos entrevistados confirmaram que deixaram de usar totalmente o ônibus (29,4%) ou diminuíram o uso (27,5%)”, alertou, na época da divulgação, Bruno Batista, diretor executivo da CNT e coordenador da pesquisa.