Com 95 mil imóveis sem uso, Recife justifica incentivo ao retrofit e novas habitações para o futuro das construções na cidade
A gestão municipal tem discutido nas últimas semanas o projeto de lei da LPUOS com a sociedade civil e entidades de classe da capital pernambucana

Em audiência pública realizada nesta terça-feira (8), a Prefeitura do Recife, por meio dos secretários de Desenvolvimento Urbano e Licenciamento, Felipe Matos, e de Habitação, Felipe Cury, justificou o porquê da nova Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LPUOS) incentivar a construção de novas habitações de interesse social na cidade e a prática do retrofit (reforma para modernizar construções já existentes). Na totalidade do seu território, o Recife já alcançou a marca de 95,5 mil imóveis desocupados ou sem uso permanente, mas eles por si sós não resolvem a demanda habitacional da cidade.
A gestão municipal tem discutido nas últimas semanas o projeto de lei do LPUOS com a sociedade civil e entidades de classe. O texto, que ainda será encaminhado para a Câmara de Vereadores da cidade, traz um novo ordenamento em relação a como e onde construir na capital pernambucana. Apesar de celebrado como um avanço, parte do projeto foi alvo de críticas por, supostamente, estimular o adensamento de áreas sem levar em conta a necessidade de infraestrutura, inclusive nas áreas que compreendem o Centro Expandido do município.
"Os dados mostram que precisamos utilizar tanto a base de moradias inadequadas na cidade quanto o território que temos no Centro Expandido, com imóveis vazios, mas ainda não conseguimos atender ao déficit que a gente tem", afirmou Felipe Cury.
"Estou convencido que a política habitacional da cidade tem que ser FAR e FDS (faixas mais baixas do Minha Casa, Minha Vida) mais MCMV para todas as faixas de renda. Precisamos quebrar o paradigma de olhar MCMV apenas para o FAR, e olhar para o todo do programa, ainda mais agora, com ampliação da faixa de renda que vai chegar a R$ 12 mil", continuou o secretário.
CIDADE SEM ALTERNATIVA DE MORADIA PARA QUEM NÃO É TÃO POBRE E NEM TÃO RICO
Segundo ele, o Recife tem como maior problema 46 mil famílias em ônus excessivo com aluguel, comprometendo mais de 30% da renda para pagamento da locação, e não têm alternativa de moradias a menor custo na cidade. "A partir desses dados, vemos que o Recife é bom para se viver, mas não é bom para se morar", alertou.
A realidade é que, para a prefeitura, o Recife tem um número alto de imóveis ociosos e precisa de habitações que atendam diretamente também a faixa de famílias a partir de dois salários mínimos, dentro do programa MCMV, com financiamento para parcela considerável do déficit, no limbo entre a faixa 1 do MCMV e imóveis alto padrão.
"As pessoas têm saído (do Recife) e buscado cidades da RMR. Segundo dados do último Censo, somente quem perdeu população foi Recife, Olinda e Moreno em toda a Região Metropolitana. Das 101 mil unidades do MCMV (do ano passado), apenas 9 mil ficaram no Recife, é a terceira menor proporção entre as capitais", alertou Felipe Matos. Para ele, "Recife acaba se tornando cidade dos extremos, para o baixa renda ou aqueles de alta, sem condições para a pessoa que ascende socialmente morar aqui".
Em toda a capital pernambucana, são 95,5 mil imóveis desocupados ou sem uso permanente. Mas apenas nas Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) da cidade, onde reside a maior parcela da população de baixa renda, mais de 100 mil habitantes já deixaram de morar.
Somente na zona que compreende o Centro Expandido, onde estão bairros como Santo Antônio e São José, a cidade acumula 5,8 mil domicílios ociosos. Apenas nos dois bairros citados, são 265 imóveis desocupados, o que representa 104 mil metros quadrados disponíveis para retrofitagem ou novos empreendimentos habitacionais.
Na conta da PCR, subtraindo 20% necessários a áreas comuns, chega-se ao total de 83,7 mil metros quadrados, o equivalente a 2.100 apartamentos de 40 metros quadrados, metragem média do programa Minha Casa, Minha Vida, que poderiam voltar ao mercado.
A área que compreende os bairros da Zona Sul da cidade tem o maior número de imóveis ociosos, com 26,9 mil no total. Na RPA 2, onde estão bairros do extremo da Zona Norte, são 11,4 mil moradias nesta condição. Seguida pela RPA 3 (Zona Norte desde as Graças a Casa Amarela), com 16,8 mil, RPA 4 (Zona Oeste mais próxima à Torre e Caxangá), com 17.745 habitações ociosas, e RPA 5 (Zona Oeste nas áreas mais próximas a Afogados e Areias), com 16,7 mil.
O QUE É PROPOSTO
Para a Habitação de Interesse Social, a PLUOS prevê instrumentos que atraiam novas construções dentro do Minha Casa, Minha Vida sobretudo para a região central da cidade, além de incentivar o retrofit com a mesma finalidade habitacional.
A prefeitura está integrando à nova legislação a promessa feita ainda durante a campanha para reeleição do prefeito João Campos (PSB), que dava conta da criação de um bônus ou crédito construtivo a partir da priorização de projetos de retrofit (reforma para novo uso) de edificações no Centro da cidade.
Pelo texto, a cada metro quadrado reformado nos bairros da Boa Vista, Santo Antônio, São José e Bairro do Recife com destinação a uso habitacional, o construtor recebe um metro quadrado para obras em Boa Viagem, quando da Outorga Onerosa do Direito de Construir. No caso de habitação social nos bairros citados do Centro do Recife, o crédito passa de 1 metro quadrado para 2 metros quadrados.
Outra medida é que a prefeitura vai permitir a ampliação da área construída privativa quando se trata de habitação de interesse social, o que desdobra em número maior de unidades habitacionais por empreendimento e conseguinte margem de lucro para o construtor, viabilizando economicamente a atração deste tipo de moradia para a cidade, que atualmente tem um número restrito de habitações. Estima-se que as áreas de potencial construtivos dos lotes aumentem em quase 50%.
PLANO DE USO E OCUPAÇÃO
Outros trechos da legislação dão conta de reorganizar o território em duas macrozonas — Ambiente Construído (MAC) e Ambiente Natural e Cultural (MANC) —, que se desdobram em zonas urbanísticas e setores específicos, permitindo a aplicação de parâmetros urbanísticos mais ajustados às particularidades locais.
O texto também introduz instrumentos de qualificação ambiental, como a Taxa de Solo Natural (TSN), a Taxa de Contribuição Ambiental (TCA), e exigências para reservatórios de reuso e retardo de águas pluviais. Estímulos à melhoria do espaço urbano incluem parâmetros para fachada ativa, térreo visitável e fruição pública.