Após dois anos de governo Raquel Lyra, repactuação do contrato do Tecon Suape segue sem previsão de acordo entre as partes
Operadora filipina promete investimentos, redução das taxas cobradas, mas revela dificuldades para assinatura de revisão do contrato feito em 2001.

No final de 2024 o terminal de contêineres do Porto de Suape comemorou seu melhor resultado. Movimentou cerca de 680 mil TEUs e chegou perto do limite de sua capacidade total, que é de movimentação de 760 mil. Ele pode chegar a 1,2 milhão com os novos investimentos.
Virou o principal ativo econômico e logístico do estado e, na sua operação, estão diversas linhas marítimas que atendem o mundo inteiro. E de forma direta, em linhas de longo curso, para América Central e Norte, Europa e Ásia. E tem uma presença forte nas rotas de cabotagem oferecendo todos os serviços existentes no país.
Pelas contas da empresa, entre 2001 e 2024, o Tecon Suape já investiu mais de R$ 770 milhões na infraestrutura do terminal e através das despesas de arrendamento repassou cerca de R$ 2,3 bilhões.
Mas desde o começo do governo Raquel Lyra a companhia filipina não consegue ajustar uma conversa sobre uma questão central para cumprir seu contrato inicial de 30 anos: repactuar o contrato assinado ainda no governo Jarbas Vasconcelos de forma a que reequilibre suas contas de modo a voltar a ser competitiva regionalmente. Oferecendo tarifas que ajudem entre outras coisas atingir a marca de 760 mil TEUS/ano que lhe permitiria justificar os investimentos necessários para chegar a pode movimentar 1,2 milhão de cofres de carga.
Disposição para um acordo
Oficialmente, as partes se colocam à disposição de um acordo que o governo exige que seja revisado pelos Tribunais de Contas do Estado (TCE) e da União (TCU), de modo a dar mais proteção aos atores governamentais que assinaram o documento enquanto a empresa ofereceu um texto com termos aprovados pela Secretaria Nacional de Portos, pela Agência Nacional de Transporte Aquaviário – ANTAQ.
Só que o processo não anda. Empacou desde a posse dos gestores nomeados pela governadora Raquel Lyra que decidiu reanalisar todo o processo concluído no governo Paulo Câmara com quem tem um embate sobre diversas ações
Elas vão da desorganização da estrutura administrativa do governo que obrigou os governadores a praticamente reconstruir as equipes com novas contratações a suspeitas de má condução de processos de negociação de projetos de investimentos.
O contrato de repactuação do Tecon Suape entrou na lista exatamente por ter sido oferecido como solução pronta depois da delegação de autonomia concedida pelo Ministério dos Transportes dias antes do final do governo Paulo Câmara.
Impacto da exclusão do trecho
Pesou no comportamento, a exclusão do trecho da linha para Suape da ferrovia Transnordestina que a governadora foi surpreendida com a convocação para assinar o aceite do trecho de Pernambuco acertado e definido no dia 22 de dezembro de 2022 sem que sua equipe tivesse conhecimento da articulação entre os governadores Camilo Santana (CE) e Wellington Dias(PI).
Raquel recusou-se a aceitar e iniciou uma mobilização junto ao presidente Lula para incluir o trecho de Pernambuco o que virou uma promessa de construção da obra pela estatal Infra S.A. que só agora está fazendo o novo projeto básico. A Transnordestina até Pecém deve operar em 2027 graças a um aporte de R$3,6 bilhões. A que vai para Suape não tem prazo.
Oficialmente, o governo declara que está aberto a celebrar um novo acordo com o Tecon Suape. O secretário de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, Guilherme Cavalcanti, revela a disposição do estado de resolver a pendenga.
Mas afirma que “qualquer solução sobre um possível reequilíbrio contratual para assinatura do aditivo ao contrato de arrendamento inclui a dobra no valor a ser repassado a Suape em função do objeto contrato cuja não observância da cláusula permitirá a qualquer consórcio que participou do certame contestar a mudança judicialmente.”
Valor a ser repassado ao governo
Cavalcanti inclui na sua frase uma das palavras chaves desse imbróglio: “dobra” no valor a ser repassado a Suape.
Explica-se. Quando do certame da licitação em 2001 no certame que originou o contrato foi incluída uma cláusula que previu a cada 10 anos de vigência um dobra na remuneração paga a Suape que é a concessionária. Na época, isso foi determinante para que a filipina ICTSI vencesse o leilão internacional.
E mesmo em 2011, quando ela foi aplicada pela primeira vez, essa dobra passou sem muita contestação embora para os clientes começassem a reclamar dos preços. De fato, o preço cobrado acabou prejudicando Suape, especialmente depois que portos como Pecém passaram a concorrer pelas cargas regionais especialmente porque no Ceará o Tecon Suape concorre com um Terminal de Uso Privativo (TUP) que não tem os custos de Suape.
O problema chegou ao ápice em 2021 quando o contrato previu a segunda dobra. Foi quando o Tecon Suape judicializou a questão e obteve uma liminar que lhe garante cobrar os preços da primeira obra que se mantém até hoje.
Entretanto já prevendo isso a empresa começou a se movimentar para buscar uma forma de reequilibrar o contrato de modo a se manter competitiva no mercado.
Em 2017, apresentou a Antaq um plano de reequilíbrio com promessa de investimentos e em 2019 conseguiu uma aprovação inicial apresentando mais investimentos até que em 2021 conseguiu uma aprovação final da Gerência dos Portos Organizados da Antaq um acórdão condicionando a alteração das regras do contrato a investimentos de modo a reequilibrar o contrato.
Devolução da autonomia de Suape
Tudo parecia ir bem até que, em outubro de 2022, o governo federal devolveu a autonomia de Suape ao Governo quatro meses antes da posse de Raquel Lyra.
Tempo para estudar o processo
Oficialmente, o governo decidiu no dia tornar sem efeito a declaração da Secretaria Nacional dos Portos sobre a assinatura da repactuação para estudar o processo. E mesmo com a empresa pedindo um posicionamento do Governo nenhuma ação foi tomada até agora.
Este mês, até mesmo um pedido de investimento para aquisição e instalação de defensas no valor de R$4 milhões foi recusado pelo porto de Suape. Os equipamentos que estão no pátio do TECON hoje apenas aguardando a aprovação de Suape.
Até agora a única proposta que é consenso é a troca do índice de correção do IGPM pelo IPCA, que a partir da repactuação já reduz fortemente o impacto na dobra do contrato.
Para a empresa, a indefinição acerca da repactuação contratual com o Tecon também impacta diretamente nas operações. No plano proposto pela empresa, estão uma série de investimentos que podem chegar a R$250 milhões.
Investimentos na infraestrutura do terminal
Nesse valor, segundo a empresa, estão incluídos investimentos na infraestrutura do terminal e a aquisição de novos equipamentos, a exemplo de dois novos portêineres, substituição das defensas marítimas atuais por mais modernas e de maior capacidade, implementação de mais duas subestações de energia.
O presidente do Conselho de Administração do Complexo Portuário de Suape, o empresário Paulo Sales defende um consenso entre o Tecon Suape e o Governo de modo a resolver a questão. E diz que os clientes do porto e do Tecon Suape querem uma solução que no final resulte em redução de preços, investimentos e maior competitividade frente aos terminais regionais.
A pressa do Tecon Suape ganhou uma razão mais forte no final do governo Paulo Câmara quando foi anunciada a chegada em 2027 de um concorrente para a empresa filipina com a instalação de um TUP em parte da área do Estaleiro Atlântico Sul.
O grupo dinamarquês, líder global de transporte marítimo, venceu a licitação e está iniciando a construção de um novo terminal de contêineres com capacidade para operar outras cargas e deve deslocar ao menos 40% da movimentação atual de contêineres para seu terminal, onde pagará apenas as taxas portuárias.
Isso quer dizer que até lá, o Tecon Suape precisa encontrar um equilíbrio no contrato atual enquanto se organiza para se manter no mercado. Sabendo que competir na condição de um concessionário que paga renda ao dono do porto contra um que só paga taxas portuárias é um jogo pesado.
Por enquanto a empresa Tecon Suape tem outra prioridade. Conseguiu a repactuação contratual de suas operações. Sem isso, sequer pode pensar em 2027.
O problema é que mesmo o governo afirmando que permanece aberto para a negociação desde que ela receba a anuência dos órgãos de controle como o TCE em Pernambuco e do TCU de modo a que Suape tenha proteção sobre os seus efeitos, as coisas não andam.
Quem sabe agora, depois que a governadora voltou de uma viagem ao Canadá decida que chegou a hora de afunilar as conversas em que todos os atores se dizem dispostos a negociar, sem que objetivamente se sentem na mesa.