Cena Política | Análise

Dosimetria vira moeda e mostra como o Legislativo se curva à chantagem

Com Tarcísio no centro da crise e Flávio ameaçando, União Brasil e PP se movem por medo e comandam negociação de "preço" por chantagem bolsonarista.

Por Igor Maciel Publicado em 10/12/2025 às 11:29 | Atualizado em 10/12/2025 às 11:30

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O episódio do lançamento da candidatura de Flávio Bolsonaro (PL), misturado com a colocação de um "preço para desistir" dela, além da votação do Projeto de Lei da Dosimetria, formam um caldeirão que escancara os mecanismos de chantagem ainda utilizados sobre a política brasileira. E como eles ignoram a população.

Quando um ator político lança mão de uma candidatura ao cargo mais importante do Executivo para pressionar o sistema e forçar concessões pessoais e familiares do Legislativo, o que está em risco é a integridade das instituições que deveriam funcionar como barreiras contra esse tipo de abuso e não como catalisadores de tudo.

Pois é o que está ocorrendo.

O centrão encurralado

A cronologia revela claramente que o centrão foi colocado em posição de refém e começou a negociar. Flávio anunciou a candidatura sabendo que ela inviabilizaria Tarcísio de Freitas (Republicanos) e jogou esse risco sobre os partidos que hoje orbitam em torno do governador de São Paulo e da possibilidade de ele (Tarcísio) ser candidato à presidência.

"Ou vocês entregam o benefício que queremos ou eu destruo o projeto presidencial que sustenta o bloco político de vocês", anunciou o filho 01 de Jair Bolsonaro em dois atos, quando se lançou e quando disse que havia preço para desistir.

A sabotagem calculada

A movimentação foi planejada para produzir exatamente esse efeito. A candidatura não era um gesto de afirmação, e sim uma peça tática para pressionar o sistema. Ao tornar Tarcísio eleitoralmente inviável para o Planalto, Flávio buscava apenas elevar o preço da negociação e abrir espaço para a anistia ao pai.

O PL da dosimetria estava guardado nas gavetas. Só voltou ao debate porque passou a servir como instrumento para administrar essa chantagem.

Não houve discussão profunda sobre critérios penais. Não existiu debate sobre consequências para outros criminosos em outros processos que podem ser beneficiados. O texto emergiu como ferramenta de barganha e foi tratado como tal.

"Não dá para entregar a anistia, mas aceite este mimo com uma redução de penas", respondeu o centrão.

Tarcísio no centro

E qual o motivo de os partidos do centrão aceitarem a chantagem e tentarem agradar Flávio para que ele desista da candidatura? Tarcísio de Freitas foi o pivô silencioso dessa crise. Sua viabilidade é o que mantém União Brasil e Progressistas em posição confortável para enfrentar o governo Lula.

Quando Flávio ameaça essa viabilidade, o campo político associado ao governador perde seu eixo. A resposta urgente desses partidos revela o tamanho da dependência do projeto presidencial de Tarcísio.

O União Brasil e o Progressistas acabaram de desembarcar do Governo Lula, atirando, reclamando e gritando que estarão unidos com um projeto sólido contra o PT. Esse projeto não é Ronaldo Caiado (União), nem Ratinho Júnior (PSD) ou Romeu Zema (Novo). Porque somente Tarcísio reúne as condições para enfrentar o PT atualmente.

Se Flávio inviabiliza o governador de São Paulo, todos esses partidos (principalmente União e PP), terão motivos para se preocupar. E muito.

A normalização do desvio

O que mais preocupa é a naturalização desse processo. A dança entre chantagem e concessão se consolidou como prática operacional.

Deputados correram para votar um projeto relevante apenas para administrar danos eleitorais de terceiros, por autopreservação.

Cresce a sensação de que as instituições são acessórias e que a legislação pode ser moldada ao sabor das conveniências. E desse jeito não há projeto de nação que se sustente. Se é que já houve algum projeto.

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