O discurso fácil da escala 6x1 e a dureza da realidade
Falar em acabar com a escala 6x1 sem tocar na carga tributária ou na produtividade do trabalhador é discurso vazio embalado por marketing eleitoral.
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A discussão sobre a escala 6 por 1 voltou a ocupar o debate público. O tema reaparece com a mesma força de sempre, dividido entre o discurso sobre direitos e a dura realidade econômica do país.
Não há dúvida de que a escala 6 por 1 é opressiva. Ela limita o lazer, o descanso e o convívio familiar. Mas reconhecer isso não significa que a solução seja simples ou que essa seja, hoje, a prioridade.
A vida adulta é feita de escolhas por prioridades que muitas vezes são ignoradas por quem faz discurso político baseado em idealismo barato. O discurso do fim da escala 6x1 é raso e rasteiro se for apartado da produtividade e da carga tributária.
Antes de enfrentar o problema do trabalho em seis dias da semana, o Brasil deveria enfrentar algo mais profundo, que não rende tanto voto assim.
A frase inteira
Discutir a escala 6 por 1 é como começar uma frase pelo ponto final. Não se fala nem no "sujeito" nem no "predicado". A escala é o último elemento de uma sentença longa, que tem como sujeito a produtividade e como predicado o custo de cada trabalhador.
Antes de eliminar o ponto final, é preciso reescrever a frase toda. O problema não está apenas na jornada imposta à maior parte dos trabalhadores brasileiros. Está na estrutura que sustenta a relação entre o governo, o empresariado e o trabalhador.
Produtividade baixa
O Brasil figura entre os últimos colocados em produtividade no mundo. Segundo o Instituto de Desenvolvimento de Gestão da Suíça, o país ocupa o 62º lugar entre 67 economias analisadas. Apenas Venezuela, Argentina, Gana, Nigéria e Peru estão atrás. O brasileiro trabalha muito, mas produz pouco. E não por culpa dele.
O problema é estrutural. Faltam tecnologia, capacitação e condições adequadas para transformar esforço em resultado. Todos esses elementos que poderiam melhorar a produtividade do brasileiro custam dinheiro, mas o empregador não tem como bancar, porque parte desse recurso é gasto com impostos.
Custo alto
O custo de manter um trabalhador no Brasil é o outro lado dessa equação. Para cada R$ 100 pagos de salário, o empregador precisa entregar até R$ 110 em tributos. Isso significa que o empregador paga R$ 210, o trabalhador recebe R$ 100 e o governo fica com R$ 110.
Essa conta travou a modernização. Empresas gastam tanto com impostos que não sobra para investir em treinamento, tecnologia e inovação. O resultado é previsível. A produtividade não cresce e a carga de trabalho segue pesada para compensar a despesa.
É por isso que discutir a redução da escala é necessário, mas impossível sem atacar aquilo que causa isso. Caso contrário, trata-se de demagogia, pura e simples.
O círculo
Forma-se um ciclo vicioso. O custo alto impede investir em produtividade. A baixa produtividade impede reduzir a jornada. A jornada longa mantém a necessidade da escala 6 por 1. Nenhum governo se arrisca a cortar a tributação sobre o emprego, porque isso mexe com a arrecadação que sustenta as contas públicas.
Assim, o debate sobre a jornada vira uma conversa que não sai do lugar, feita para render voto de quem compra conversa rasa, baseada em idealismo. E, infelizmente, isso ainda é eleitoralmente muito efetivo.
O cálculo político
O governo federal insiste em colocar o tema na pauta. O PT quer discutir o fim da escala, e o motivo é mais eleitoral do que econômico. A eleição de 2026 se aproxima e o discurso de defesa do trabalhador é sempre um ativo valioso.
E se o projeto não for aprovado, pode ser até melhor para a eleição, porque o governo sai da discussão como o lado que tentou ajudar o povo e foi barrado pelo Congresso. Se isso rende votos, para que se preocupar com a realidade?
Entre o real e o retórico
A pauta parece social, mas é política. Enquanto não se enfrenta a questão da produtividade e da carga tributária, discutir o fim da escala 6 por 1 é apenas um gesto simbólico vazio. Serve à retórica, não à realidade. E é a narrativa necessária para sustentar argumentos de campanha que podem enfiar o Brasil numa crise séria em pouco tempo.
O país já viveu algo parecido. No governo Dilma Rousseff (PT), as medidas e discursos populistas renderam vitórias eleitorais em 2014, mas deixaram um rastro de crise e descontrole fiscal. O perigo é repetir o roteiro.
Discutir a jornada sem discutir a estrutura é fechar os olhos para o sujeito e o predicado da frase. E nenhuma frase faz sentido quando só se enxerga o ponto final.