Sobre a ilusão bolsonarista com a salvação chamada Donald Trump
Bolsonaro acredita que Trump é seu amigo fiel. Mas Trump enxerga Bolsonaro apenas como um fã, um groupie que o segue como a uma banda de rock.

Alguém notou que os bolsonaristas nunca mais falaram no presidente dos EUA, Donald Trump? Quando Trump venceu a eleição e tomou posse, no início deste ano, os apoiadores de Bolsonaro começaram a tratá-lo como a solução para todos os seus problemas.
O argumento tinha um poder tão frágil que chegava a ser ridículo. Este colunista nos bastidores, chegou a ouvir coisas assim: “e agora, com Trump presidente, pressionando o Brasil por Bolsonaro, Lula e Alexandre de Moraes vão aguentar?”. Quando você apontava o óbvio como contraponto, ainda completavam: “você vai ver. Trump vai resolver”.
Essas falas eram acompanhadas de um olhar esperançoso com ar messiânico, sorriso de canto de boca, como se estivessem prontos para mergulhar nas “verdades do novo mundo sob Trump” que estavam proclamando.
Sandice
Pessoas sãs podem sustentar sandices temporárias, dependendo do contexto. E esse contexto era especial. Bolsonaro estava no que era, até então, seu pior momento, após a divulgação de detalhes que o incriminavam nas tratativas para um golpe de estado. Atualmente, por causa disso, ele está pior e é réu no Supremo Tribunal Federal.
Quando é dura a vida, busca-se salvação até no fantástico. Essa era a base do sebastianismo português. Era também a base da crença em que os EUA iriam até entrar em guerra com o Brasil “se Moraes e Lula não parassem de perseguir o ex-presidente”.
Dom Sebastião nunca voltou para salvar o povo português. Donald Trump até agora também não compareceu.
O Brasil no mundo
A ideia bolsonarista não fazia sentido, principalmente, por causa da posição de importância do Brasil para o mundo (e para os EUA). Nós vivemos sobre um tipo de limbo que muitas vezes acaba sendo benéfico para evitar problemas e ainda nos traz lucro.
Temos uma economia muito grande para uma influência geopolítica muito pequena. Ninguém quer brigar com o Brasil para não perdê-lo como mercado. E ninguém se importa muito com o Brasil, porque a influência do país numa disputa internacional é próxima de zero.
Brigar com o Brasil é uma grande perda de tempo e um risco imenso de perder dinheiro. Somos como um cachorro da raça Golden Retriever: somos muito grandes e comemos muito, mas não metemos medo em ninguém. Quem vai brigar com um Golden Retriever, ainda mais se você lucra vendendo ração para ele?
E os EUA lucram.
Com Trump
Na balança comercial com o Brasil, os EUA são superavitários. E a coisa melhorou bastante para os americanos em 2025.
Entre janeiro e março deste ano, depois que Trump assumiu, o Brasil exportou US$ 9,7 bilhões para os EUA e importou US$ 10,3 bilhões, segundo o relatório trimestral da Amcham Brasil. O volume representa um crescimento de 6,6% em relação ao mesmo período de 2024. A corrente de comércio entre Brasil e Estados Unidos bateu recorde e chegou, pela primeira vez, à marca de US$ 20 bilhões no primeiro trimestre de um ano.
O presidente dos EUA pode até gostar de Bolsonaro, como acreditam os bolsonaristas, mas ele gosta mais dos americanos que votaram nele.
Amigos, amigos…
Trump não precisa gostar de Lula para fazer negócios desse tamanho com o Brasil. Desde que assumiu, em janeiro de 2025, o presidente americano não falou com o colega brasileiro nem uma vez. Não houve ligações telefônicas. Nem mesmo uma menção ao nome Lula foi feita.
Mas quando o tarifaço foi anunciado, Trump colocou o Brasil no patamar mais baixo de suas taxas, junto com a Argentina do presidente Javier Milei. O hermano costuma se comportar como se a grande honra de sua vida fosse lamber os sapatos do americano. E mesmo assim, recebeu a mesma tarifa que o Brasil. Amigos, amigos. Negócios à parte.
Groupie
Mas sabem quem Trump também nunca mencionou, desde que assumiu como presidente dos EUA em janeiro? Jair Messias Bolsonaro.
Apesar dos esforços para que parecesse que os dois tinham um vínculo de “irmãos em armas”, companheiros na “jornada de mudança do mundo”, Trump nunca mencionou o ex-presidente brasileiro, nem mesmo quando ele virou réu no STF. Os bolsonaristas brasileiros foram levados a acreditar que o líder daqui seria salvo pela amizade com o homem que comanda a nação mais poderosa da Terra.
O problema é que a relação não é vista de lá com a mesma ótica daqui. Bolsonaro acredita que Trump é seu amigo fiel. Mas Donald Trump enxerga Bolsonaro apenas como seu fã, um groupie que o segue como se seguisse uma banda de rock. É meio deprimente, mas é a realidade.
Trump com barba
Para completar, Trump andou elogiando o sistema biométrico das urnas eletrônicas brasileiras e, além de ter destinado as menores taxas de comércio para o Brasil comandado por Lula, ainda tem tomado caminhos muito parecidos com os do presidente brasileiro.
O que será que pensa Bolsonaro, depois de tanto ter criticado o PT pela campanha difamatória que os petistas realizaram contra o ex-presidente do Banco Central Roberto Campos Neto, ao ver agora Trump fazendo discursos quase idênticos aos de Lula para atacar o presidente do FED, o banco central americano, Jerome Powell?
Há quem diga que Trump anda meio barbudo e Lula está meio alaranjado nos últimos dias. E seja lá o que Eduardo Bolsonaro (PL) estiver fazendo nos EUA, depois de ter se licenciado da Câmara e se autodeclarado exilado político, não está funcionando.