Cena Política | Análise

Igor Maciel: A oposição na Câmara do Recife e essa coisa "estranha" que é fiscalizar

Essa ação esquisita, rara em mais de uma década, que causa tanta estranheza para a prefeitura. Um grande monstro desconhecido e maldoso: fiscalização.

Por Igor Maciel Publicado em 09/04/2025 às 20:00 | Atualizado em 10/04/2025 às 6:50

O artigo 31 da Constituição Federal determina que os vereadores são responsáveis pela fiscalização dos municípios, tanto por controle externo quanto interno. O regimento interno da Câmara de Vereadores do Recife fala tanto em fiscalização que bateu a curiosidade de quantificar isso. O termo “fiscalização” e seus sinônimos é visto ao menos 15 vezes no documento.

O que a bancada de oposição começou a fazer no Recife em 2025 é algo de que não se tinha notícia, ao menos, nos últimos 12 anos. Essa ação tão esquisita, tão rara em mais de uma década, e que vem causando tanta estranheza para a prefeitura, como se estivessem enfrentando um grande monstro desconhecido e maldoso, não passa de uma prerrogativa, uma função básica dos edis: fiscalização.

Fiscalizar

Estranho, de verdade, convenhamos, é o trabalho de fiscalização dos vereadores estar sob análise e não o resultado de suas incursões em equipamentos públicos municipais. Sim, porque o grupo vem sendo criticado por causa das fiscalizações que realizam.

A Prefeitura do Recife reclama, a Guarda Municipal é chamada para tentar impedir e agora até o MPPE emitiu recomendação relacionada às fiscalizações feitas pelos vereadores da oposição em prédios públicos da administração municipal, indicando que elas podem ser entendidas como “arbitrárias”.

Contraditório

O que constrói a reação do privilégio é o mau costume. Depois de tantos anos, entrando na quarta gestão seguida da capital, com um legislativo que se limitava a pouca ou nenhuma voz divergente, ter assim, de repente, logo vários vereadores tentando visitar obras inacabadas, buscar informações sobre serviços pelos quais nada se sabia de eficiência e cobrando soluções do Executivo, pode assustar.

O contraditório, essa ferramenta impertinente da democracia, pode ser incômodo, realmente. E esse incômodo tem ficado cada dia mais evidente nas ações diretas da gestão e até no comportamento de vereadores aliados na Casa.

Avisem

São oito vereadores dessa bancada de oposição na Câmara do Recife. Felipe Alecrim (Novo), Davi Muniz (PSD), Gilson Filho (PL), Eduardo Moura (Novo), Tiago Medina (PL), Alef Collins (PP), Fred Ferreira (PL) e Paulo Muniz (PL). Eles assinaram uma carta de repúdio contra a recomendação do Ministério Público.

O texto do MPPE diz que os vereadores precisam avisar com antecedência à prefeitura, quando forem fazer alguma fiscalização. É mais ou menos como se a polícia fosse obrigada a avisar aos bêbados sua localização quando fossem fazer uma fiscalização da Lei Seca. Curioso, pra dizer o mínimo.

Ramificados

A verdade é que esses vereadores de oposição chamam atenção também por finalmente conseguirem entrar num mundo em que somente o atual prefeito acreditava ter influência, que são as redes sociais.

Juntos, os oito que assinam a nota, por exemplo, possuem quase meio milhão de seguidores, com um engajamento altíssimo e capilaridade impressionante. Sempre que publicam alguma denúncia, imediatamente outros perfis com centenas de milhares de seguidores espalham o material para seus públicos, numa rede organizada de divulgação. 

Há problemas?

O PSB no Recife não tem oposição ativa dessa forma desde 2013, quando Geraldo Julio (PSB) assumiu seu primeiro mandato. Havia uma atuação forte de Priscila Krause (PSD), hoje vice-governadora, mas foi por pouco tempo e era uma voz quase isolada, contra uma base que passava suas pautas na base do trator.

É normal que, agora, haja incômodo com a atuação. Mas tentar limitar a fiscalização pode não ser a melhor estratégia. No ambiente do debate público, tudo o que você tenta esconder acaba chamando mais atenção do que se estivesse exposto. E, se o assunto é ambiente público, há o que esconder?

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